Faz parte das práticas da governação que um novo executivo de filiação partidária diferente do que o precedeu (por vezes, nem isso) atribua ao anterior erros e tropelias cujas consequências se prolongam no tempo e justificam tudo dificuldades em concretizar irrealistas promessas, indispensabilidade de medidas gravosas para o cidadão ao "corrigir" danos causados, etc. Durão Barroso levou a táctica ao limite, não porque as nada pequenas derrapagens guterristas fossem desmesuradamente imensas, mas porque articulou uma poderosa operação política: levando o problema do défice aos limites, ganhou espaço para o mais vasto e articulado ataque ao Portugal configurado pelo 25 de Abril. O défice e "a tanga" cobriram privatizações na saúde, ataques aos direitos dos trabalhadores, inadmissíveis interferências na justiça e nas forças de segurança, uma política internacional de inteiro servilismo face a Washington e muito, muito mais. Ora, o próximo Governo irá encontrar, sem sequer precisar de forçar a verdade, o País a braços com o acumular de despautérios e problemas de que não há memória nem nas agitações da I República, nem nas vicissitudes oitocentistas do "rotativismo". Pense-se apenas no fundo de pensões da CGD se a medida for declarada inconstitucional - tudo o indica -, o novo Governo herda um Orçamento com o défice abaixo de 3% que se transforma num acima de 3%! Os governos PS nunca precisaram de pretexto para fazerem tropelias. Imagine-se agora no meio desta trapalhada toda...