Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

PSD/CDS pretendiam aprovar alterações de fundo ao Decreto declarado inconstitucional

Intervenção de António Filipe na Assembleia da República, sobre um requerimento do PCP relativo à Reapreciação do Decreto n.º 177/XII que Estabelece o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas, após a declaração de inconstitucionalidade de várias normas do decreto vetado
___________________________________________________

Estabelece o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas visando a melhor afetação dos recursos humanos da Administração Pública, e procede à nona alteração à Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 74/70, de 2 de março, à décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 209/2009, de 3 de setembro, e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, revogando a Lei n.º 53/2006, de 7 de dezembro
(Decreto da Assembleia da República n.º 177/XII)

Sr.ª Presidente,
Pedi a palavra para interpelar a Mesa antes do início do debate da reapreciação do Decreto n.º 177/XII, sobre o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções pública, e esta interpelação à Mesa prende-se com a necessidade de apresentação oral do requerimento que fizemos chegar a V. Ex.ª.
(…)
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados,
Com este requerimento, queríamos chamar a atenção para o seguinte aspeto: estamos perante a reapreciação de um Decreto desta Assembleia que foi vetado pelo Sr. Presidente da República por inconstitucionalidade, na sequência da declaração de inconstitucionalidade de algumas normas nele contidas, em sede de fiscalização preventiva suscitada pelo Sr. Presidente da República, tendo sido agendada a sua reapreciação nos termos constitucionais e regimentais.
Acontece, porém, que, quando confrontados com as propostas que os Srs. Deputados do PSD e do CDS apresentaram com vista ao expurgo das inconstitucionalidades, verificamos que há um conjunto muito substancial, numeroso e substantivo de propostas que, para além da alteração das normas declaradas inconstitucionais, propõe a alteração de muitos outros aspetos do Decreto vetado e, portanto, do texto anteriormente aprovado, o que corresponde, de facto, a uma alteração com efeitos inovadores e substantivos relativamente a esse diploma
É muito discutível, do ponto de vista constitucional, que o expurgo de uma inconstitucionalidade (esse mesmo momento regimental) possa ser aproveitado, na prática, para a aprovação de um outro diploma. Portanto, seria discutível se a melhor solução não seria a apresentação de uma nova iniciativa legislativa. Mas não é isso que queremos dizer.
Queremos chamar a atenção para a necessidade, até por razões do mais elementar bom senso, de todo este conjunto de alterações poder ser apreciado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), que é a comissão competente, antes de uma votação final em Plenário.
Já temos experiências bastantes de processos legislativos em que, por serem feitos sem a devida ponderação e à pressa, a Assembleia da República sai profundamente desprestigiada. Creio que deveríamos evitar incorrer em mais uma situação dessas, independentemente do juízo de valor que cada grupo parlamentar possa fazer sobre a bondade ou a maldade das propostas apresentadas.
Portanto, o requerimento que apresentamos vai sentido de que estas propostas baixem à COFAP, para serem apreciadas com a celeridade que os Srs. Deputados entenderem conveniente, para que as mesmas, depois, possam vir a Plenário para serem submetidas a uma votação final.
Parece-nos extremamente insensato que todo este conjunto de propostas possa ser resolvido em sede do expurgo de uma inconstitucionalidade, porque, efetivamente, o que é proposto vai muito para além do que se pretende expurgar.
Sr.ª Presidente, o nosso requerimento vai no sentido de que a Assembleia decida uma baixa à COFAP antes de haver uma votação final, que pode efetivamente criar para a Assembleia da República uma situação extraordinariamente desagradável — Sr.ª Presidente, seria mais uma e nós não queremos.
Independentemente do que pensamos sobre o diploma, esta não é a forma como um Parlamento democrático deve funcionar.
(…)
Sr.ª Presidente,
Apenas queria fazer uma brevíssima consideração final sobre esta matéria.
Ficou claro, neste curto debate, que estamos, de facto, perante uma nova iniciativa legislativa da maioria. Quando os Srs. Deputados dizem que a oposição não apresentou propostas na especialidade, estão a admitir que estamos perante um processo que justificaria uma discussão na votação na especialidade.
Ora bem, o que propomos é que haja ponderação e que haja debate.
Os Srs. Deputados dizem que o nosso propósito é protelar, evitar, adiar a aprovação desta matéria… Srs. Deputados, nós discordamos das vossas propostas, mas queremos discuti-las e o Parlamento existe precisamente para que as propostas que aqui são apresentadas possam ser discutidas, e é isso que os senhores querem, efetivamente, evitar.
Sr.ª Presidente,
Para terminar, diria que os Srs. Deputados da maioria querem, mais uma vez, obrigar a Assembleia a assumir um processo imponderado, insensato e feito, como se costuma dizer, a «mata cavalos». E, Srs. Deputados, amanhã não nos venham pedir para alterar, por consenso, asneiras que os senhores possam fazer em termos legislativos. Não nos venham pedir isso! Já aconteceu várias vezes os senhores, por quererem legislar depressa e mal, sujeitarem a Assembleia a um enxovalho público e, depois, virem pedir consenso para que, em nome do prestígio desta Casa, toda a gente aceite fazer alterações que não foram feitas quando deviam ter sido.
Srs. Deputados, não nos venham pedir isso mais uma vez, porque, desta vez, nós não aceitaremos!

  • Administração Pública
  • Regime Democrático e Assuntos Constitucionais
  • Trabalhadores
  • Assembleia da República
  • Intervenções