Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

Proteção do ambiente através do direito penal

Procede à 37.ª alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, transpondo integralmente as Diretivas 2008/99/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa à proteção do ambiente através do direito penal, e 2009/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que altera a Diretiva 2005/35/CE relativa à poluição por navios e à introdução de sanções em caso de infrações
(proposta de lei n.º 325/XII/4.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, e sem ter uma discordância de fundo quanto ao diploma, apesar de também não ter uma muito entusiástica adesão, relembramos que o facto de ser uma transposição de uma diretiva não tem necessariamente de ser assinalado positivamente, em particular numa área em que as diretivas não podem incidir, que é precisamente o Direito Penal.
Sobre o conteúdo desta proposta de lei apresentada pelo Governo, trata-se de aperfeiçoar um regime penal já existente, tipificar um novo crime e agravar as penas num outro.
Sobre esta matéria, e apesar de não termos nenhum elemento que nos possa, para já, neste debate na generalidade, fazer questionar a moldura penal proposta — e reservamos também esse espaço para a especialidade —, há algumas notas que o PCP entende poderem ser, desde já, úteis para fazermos um debate sobre a penalização e o crime no âmbito ambiental e contra valores ambientais.
Por maiores e mais penalizadoras que sejam as molduras penais, enquanto continuarmos a ver o problema do ambiente e o bem jurídico ambiente e valores ambientais apenas neste prisma, não vamos conseguir dar resposta aos verdadeiros problemas com que estamos confrontados. De facto, enquanto não atentarmos ao reforço dos meios do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), da GNR e da Polícia Marítima (no caso, principalmente no que toca às descargas poluentes por navios), enquanto não resolvermos a exiguidade de meios e o enquadramento jurídico dessas instituições, enquanto não lhes dermos os instrumentos para que possam atuar na prevenção mas também na deteção do crime e, depois, na prossecução do processo resultante dessa identificação do crime, não vamos resolver o problema. Não é apenas atirando molduras penais mais agravadas para as leis que vamos resolver o problema.
Portanto, independentemente disso — e é claro que uma coisa tem de caminhar a par com a outra —, o PCP chama a atenção para estas questões, sem que, claro, se furte a poder contribuir, na especialidade, para o debate, a melhoria e até o aprofundamento das molduras penais propostas e da tipificação do crime agora aqui proposta, que é, aliás, no que toca aos habitats não protegidos, um avanço, até mesmo em relação à diretiva. Mas, também neste caso, sem os meios, com a escassez que temos de vigilantes da natureza e com a incapacidade da GNR para estar no terreno, vamos continuar a ver os crimes ambientais já só depois de terem sido cometidos.

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