Estamos numa fase de significativas e profundas transformações políticas na integração europeia. Falamos do alargamento a mais dez países, da "Convenção" que antecede a Conferência Intergovernamental, da próxima "Cimeira da Primavera", das alterações em políticas comunitárias, como na Política Agrícola Comum, ou ainda da militarização da União Europeia - processos com importantes consequências para Portugal, que importa conhecer melhor.
Consideramos fundamental clarificar os perigos e as consequências de decisões já tomadas e debater de forma séria as propostas existentes, intervindo com firmeza para salvaguardar justos interesses económicos e sociais, exigir maior transparência e participação pública para garantir os aspectos essenciais da evolução do nosso futuro como Estado soberano e independente, de direito democrático, baseado na soberania popular e no aprofundamento da democracia participativa.
Chegou-se à encruzilhada em que estamos, numa fuga permanente para a frente na União Europeia, sem uma ponderação equilibrada sobre os problemas existentes e sem um estudo aprofundado das suas consequências, numa via que, embora com contradições, é cada vez mais centralizadora e federalista, menos democrática e participativa, a que se junta uma falta de sensibilidade social e um maior domínio dos interesses financeiros e das multinacionais e das grandes potências da União Europeia.
Daí a importância que damos a três próximos acontecimentos fulcrais para o futuro, pelas consequências que daí advirão para Portugal:
A Cimeira da Primavera, onde será analisada a chamada "Estratégia de Lisboa", três anos após a sua adopção durante a Presidência portuguesa. Sabe-se como, desde então, se aceleraram processos de liberalização e privatização em sectores fundamentais (de que são exemplo: correios, telecomunicações, energia, transportes, serviços financeiros), se caminhou para maiores desregulamentações, flexibilização laboral e moderação salarial, se colocaram em causa serviços públicos essenciais, se deram passos para a entrega a lógicas de rentabilização privada dos sistemas nacionais de pensões, se secundarizaram todas as promessas na área social, apesar de se ter lançado a "estratégia de luta contra a pobreza e exclusão social", de se falar de "pleno emprego", da "responsabilidade social das empresas" e de "desenvolvimento sustentável". Até o princípio fundamental, inscrito nos Tratados, da "coesão económica e social" é cada vez mais esquecido como é notório nas conclusões das recentes Cimeiras de Bruxelas e de Copenhaga.
Dada a importância e o impacto de tais orientações, aliás em perfeita sintonia com a política de direita do Governo PSD / CDS-PP, anunciamos desde já, a realização, na Primavera, de uma iniciativa pública, com a participação de deputados do nosso Grupo da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica, sobre a avaliação que fazemos de três anos após a Cimeira de Lisboa, incluindo o balanço das acções que desenvolvemos na luta pela suspensão e revisão do Pacto de Estabilidade, questão essencial para conseguir maior coesão económica e social, assim como das acções contra as deslocalizações de multinacionais, que tão graves problemas estão a criar em Portugal.
A recomendação da Comissão, que carece ainda de aprovação pelo Conselho, para a abertura de um procedimento de défice excessivo à Alemanha - país que impôs a criação do Pacto de Estabilidade como condição para o Euro – demonstra como os grandes países com melhores condições económico-sociais não se preocupam com esses procedimentos, ao contrário de Portugal, onde são conhecidas as enormes carências e necessidades específicas de desenvolvimento e convergência real.
Não sendo a União Europeia um espaço económico homogéneo, as necessidades especificas de desenvolvimento e convergência real de um país como Portugal, serão sempre preteridas a favor das necessidades económicas de uma UE, ou seja, das grandes potências, pelo seu peso económico e populacional.
Quanto ao Alargamento, é de salientar que este se concretiza num quadro que coloca em causa a concretização do princípio da "coesão económica e social" inscrito nos Tratados, sendo Portugal apontado como o país que será mais prejudicado (e a Alemanha aquele que mais ganhará), num contexto em que serão acentuadas a concorrência, as deslocalizações de empresas, os perigos de perda de investimento e de parte dos fundos comunitários a partir de 2006.
Aliás, não se compreende como o Governo PSD / CDS-PP possa ter aceite o quadro financeiro definido na Cimeira de Copenhaga, com a referência à "disciplina orçamental" decidida na Cimeira de Berlim, em 1999, o que coloca, desde já, limitações quanto às negociações das perspectivas financeiras após 2006, e isto sem que tenha sido elaborado previamente qualquer estudo que aponte de uma forma global as consequências do alargamento para Portugal, sem que tenham sido previstos, por exemplo, programas que minimizem tais impactos.
Há, pois, uma necessidade acrescida de lutar pela revisão das perspectivas financeiras, por forma a assegurar a existência de um orçamento comunitário que não promova desigualdades, e a existência de uma política nacional de real desenvolvimento das capacidades produtivas do País, o que pressupõe o rompimento com as políticas neoliberais, e os seus instrumentos, como é o caso do Pacto de Estabilidade.
Relativamente à Convenção sobre o futuro da União Europeia, visando preparar a alteração dos Tratados e a Conferência Intergovernamental, provavelmente a realizar ainda no segundo semestre deste ano, importa desde já sublinhar que se prepara um significativo salto qualitativo na integração federalista, no caminho aberto em Maastricht, prosseguido no recente Tratado de Nice, sob o domínio das grandes potências, como ainda, e mais uma vez, ficou evidente, com a concertação entre a Alemanha e a França esta semana.
A recente proposta franco-alemã sobre a futura arquitectura institucional da União Europeia salienta, o que temos vindo a sublinhar, a procura da limitação do debate, por parte das grandes potências, dentro de um quadro que assegure os seus interesses e domínio, e com um conteúdo que é a todos os níveis inaceitável.
Os trabalhos até ao momento realizados pela "Convenção", dominada pelas forças políticas que até agora dirigiram a integração europeia - veja-se o exemplo da representação portuguesa, reduzida ao PSD e PS - e apesar das contradições existentes, apontam para a criação de uma "constituição" para a União Europeia, para uma maior transferência de competências dos estados membros para a União, para a ampliação da decisão por maioria qualificada e para o reforço das instituições supranacionais da UE, em detrimento da soberania dos Estados e das suas instituições democráticas.
Trata-se de processos preocupantes, que avançam no sentido da confirmação das principais linhas estruturantes da União Europeia: o neoliberalismo, o federalismo e o militarismo. Coloca-se, pois, a necessidade de defender firmemente maior transparência e democracia, a paz, o desenvolvimento e os interesses portugueses, incluindo a existência do direito de veto em questões fundamentais para o País, a manutenção do comissário, a manutenção da rotatividade das presidências do Conselho, a não perda de peso no processo de decisão, a manutenção do português como língua oficial e de trabalho, a não transferência de maiores competências para a União Europeia e o reforço do papel dos parlamentos nacionais no processo de decisão.
Pela nossa parte iremos continuar a desenvolver todos os esforços para defender estas posições, os interesses do país e o nosso Estado democrático constitucionalmente consagrado. Iremos igualmente continuar a promover iniciativas que permitam debater e aprofundar o conhecimento do que se prepara nas instituições europeias e propor alternativas que consideramos possíveis na defesa de outro rumo para a União Europeia.
Ilda Figueiredo
Joaquim Miranda
Desemprego
6.7% da população activa portuguesa encontrava-se desempregada em Fevereiro de 2003, face aos cerca de 5% em 2002. Portugal foi o país que registou o maior crescimento do desemprego na UE.
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Desigualdades de rendimento
6,4 é o numero de vezes mais que os 20% mais ricos da população ganhavam face aos 20% mais pobres em 1999. Portugal é o país com maior desigualdades de rendimento da UE, ou seja, onde o fosso entre os ricos e os pobres é maior. |
Convergência com a UE Desde a década de 70 que a convergência da economia portuguesa com a UE-15 tem vindo a desacelerar de década para década (ver gráfico). As previsões de Outono da Comissão Europeia apontam que a economia portuguesa entrou em divergência em 2002 e assim deverá continuar pelo menos até 2004, ou seja, nos próximos anos, Portugal vai crescer menos que a UE.
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Crescimento económico em desaceleração
0.9% é o crescimento económico estimado para a UE em 2002, após um crescimento económico de 1.5% em 2001. As estimativas continuam a ser revistas em baixa e confirmam-se dois anos consecutivos de desaceleração económica, longe dos 3% de crescimento anuais apontados na "Estratégia de Lisboa". Mais longe está a retoma económica afirmada nas Conclusões do Conselho de Barcelona, em Março de 2002. |
Precarização do trabalho 20.6% é o número de trabalhadores com contratos a prazo em Portugal. Os contratos a prazo têm vindo a aumentar em Portugal (ver gráfico), assim como outras formas atípicas de trabalho, particularmente o trabalho a tempo parcial que passou dos 8.1% do emprego total em 1995 para 10.8% em 2002. O crescimento da taxa de emprego nos últimos anos vai a par do aumento da precarização do trabalho. A "Estratégia Europeia de Emprego", que incorpora os objectivos do Conselho Europeu de Lisboa, promove o crescimento das formas atípicas de trabalho como forma de promover o emprego. Esta estratégia não só coloca em causa a segurança no emprego e os direitos dos trabalhadores, é conducente ao aumento das desigualdades de rendimento, pobreza e exclusão social, como afecta negativamente a produtividade do trabalho. Na UE a tendência é também para o crescimento da precarização do trabalho. O trabalho a tempo parcial passou de 15,5% do emprego total em 1994 para 17,9%, em 2001, e os contratos a prazo passaram de 11,5% do emprego total em 1994 para 13,4%, em 2001.
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Protecção social
Portugal é o país com menor despesa em protecção social por habitante na UE. Em 2000, a despesa em protecção social era de €3675 por ano (cerca de 74.000$00) quase metade da média na UE (€6155, cerca de 123.000$00), o que explica o baixo contributo das transferências sociais do Estado para a redução da taxa de pessoas em risco de pobreza. Desde 1993 que as despesas em protecção social têm vindo a diminuir de peso no Orçamento de Estado.
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Educação
45,5% era a taxa de abandono escolar em Portugal em 2002, ou seja, 1 em cada 2 jovens, entre os 18 e os 24 anos, não tinha completado a escolaridade obrigatória. Esta taxa é a mais elevada de abandono escolar da Europa, que ronda os 18,9%. Portugal é dos países da UE com piores resultados ao nível dos indicadores da Educação. Para além da mais alta taxa de abandono escolar, Portugal tem das mais baixas taxas de trabalhadores que estão em algum tipo de formação / educação e das mais baixas taxas da população com ensino superior da UE. Em 2000, 9,8% da população tinha cursos superiores em comparação com os 21,3% na UE e só 3,3% dos trabalhadores portugueses se encontravam em algum tipo de acção de formação / educação face aos 8,4% na UE. |