Sr. Presidente,
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares,
Srs. Deputados
Pelos vistos, há hoje uma enorme vontade de se antecipar o debate do Orçamento rectificativo que está previsto para a semana que vem.
Há pouco, ouvimos aqui o Partido Socialista, através do Sr. Deputado João Cravinho, anunciar que, finalmente, agora que voltou à oposição, cá está no combate à luta contra a fraude e à evasão fiscais, cá está com as suas preocupações em relação à evasão fiscal por via do offshore da Madeira. E nós dizemos ao Partido Socialista: «bem vindo a esta luta, mesmo que não tenha guardado o tradicional período de nojo».
Agora temos o Governo também a trazer-nos aqui, por antecipação, este debate. Eu diria, Srs. Deputados, que quem está em melhores condições de, neste momento, discutir o Orçamento rectificativo será, porventura, o Governo, as bancadas que o apoiam e a bancada da imprensa, porque nós acabámos de o receber há poucos minutos e ainda não tivemos oportunidade de aprofundar o seu estudo.
Em todo o caso, Sr. Ministro, há uma questão que, seguramente, nos choca a nós e choca os portugueses, e essa questão não tem só a ver com o Orçamento rectificativo, tem a ver com o Orçamento rectificativo cruzado com a proposta de lei que amanhã aqui vamos discutir, em que o Governo pede autorização à Assembleia da República para revogar a tributação das mais-valias. É certo que o Partido Socialista já a tinha suspenso, mas o Governo, agora, quer revogar essa tributação.
O Governo afirma que há um descontrolo nas contas públicas e que é preciso aumentar a receita fiscal e diminuir a despesa e, no Orçamento rectificativo, aponta-nos propostas no sentido de penalizar os trabalhadores e as camadas mais desfavorecidas, de penalizar o consumo, de aumentar o IVA em dois pontos percentuais e de acabar com o crédito bonificado à habitação, designadamente para os casais jovens, aponta-nos tudo isto e, simultaneamente, amanhã propõe-se, pura e simplesmente, pedir à Assembleia que o autorize a revogar a tributação das mais-valias sobre as operações que se desencadeiam na bolsa e sobre as operações financeiras, mesmo as de carácter especulativo. Sr. Ministro, há-de convir connosco que isto choca o País e os portugueses!
Para equilibrar as contas públicas, o Governo ataca os sectores mais desfavorecidos, aumenta o imposto sobre o consumo e cria problemas que se vão traduzir, muito provavelmente, em crises na economia, mas, simultaneamente, vem aqui dizer-nos que nos sectores económicos mais poderosos, nos que investem na bolsa e nos que apostam no mercado especulativo não toca, pelo contrário, vai revogar a tributação das mais-valias a que estão sujeitos.
Este é, Sr. Ministro, sem dúvida, o aspecto mais chocante desta proposta global, que não é só a do Orçamento rectificativo.
E não foi por acaso que o Governo separou estes dois momentos. Este é o aspecto mais chocante da proposta do Governo e, aliás, não foi nada disto que os senhores disseram durante a campanha eleitoral.
É isto, Sr. Ministro, que degrada a actividade política e que leva, muitas vezes, os cidadãos a absterem-se de participar nela, por verificarem que quem chega ao Governo faz exactamente o contrário daquilo que prometeu na oposição. Os senhores prometeram diminuir os impostos e agora aumentam o IVA e revogam a tributação em relação aos sectores economicamente especulativos e mais poderosos.