Projecto de Lei N.º 162/XVI/1.ª

Promoção dos direitos das crianças através da valorização do abono de família a crianças e jovens, com vista à sua universalidade e da valorização do abono pré-natal

Exposição de Motivos

I

Em Portugal, foi a Revolução de Abril de 1974 e a conquista de um sólido corpo de direitos económicos e sociais que abriu o caminho de construção e garantia dos direitos das crianças nas suas múltiplas dimensões.

Conforme consagrado na Constituição da República Portuguesa (Artigo 69.º), cabe ao Estado e à sociedade proteger as crianças “com vista ao seu desenvolvimento integral”, designadamente contra todas “as formas de abandono, de discriminação, e de opressão”. Ao Estado cabe garantir, respeitar e promover o exercício pleno dos seus direitos, em ordem ao seu desenvolvimento integral e à efetivação dos seus direitos económicos, sociais e culturais. Ao sistema público de segurança social cabe um importante papel na promoção dos direitos das crianças.

As opções assumidas por diversos governos ao longo de muitos anos acentuaram a desvalorização do abono de família, quer quanto aos seus montantes, quer quanto aos seus beneficiários. Os cortes em importantes prestações sociais, entre as quais o abono de família, aprofundaram as desigualdades sociais e as situações de pobreza e de exclusão social, com especial incidência nas crianças e nos jovens, que se viram confrontados, na sua vivência diária, com elevadas carências, significando ainda uma desproteção das crianças e dos jovens e um recuo do papel do Estado, no domínio da segurança social, na garantia de das condições básicas para um crescimento e desenvolvimento harmonioso.

Com o contributo do PCP, foram dados passos positivos na melhoria desta prestação social em diversos Orçamentos do Estado na XIII Legislatura, mas importa continuar esse caminho, levando mais longe, a mais crianças e a mais famílias, esta indispensável prestação social.

Para o PCP, o direito ao abono de família constitui um direito da criança e assume-se como um sinal do dever de proteção do Estado às crianças e jovens, na promoção dos seus direitos mais elementares. Motivo pelo qual a atribuição do abono de família não deve depender dos rendimentos do agregado familiar, mas sim constituir um direito inequívoco da criança. Este é um dever do Estado e uma expressão concreta da solidariedade de toda a sociedade para com os direitos das crianças.

A valorização do abono de família a crianças e jovens e do subsídio pré-natal enquadra-se na necessidade de a Assembleia da República ir mais longe na promoção dos direitos das crianças.

II

Para o PCP as crianças de hoje têm de ter os seus direitos salvaguardados e respeitados, porque elas são a maior riqueza de um País.

A segurança social em matéria de direitos tem de incorporar esta conceção. Assim, o Partido Comunista Português defende um sistema de prestações familiares de acesso universal. Apesar de as várias regulamentações destas prestações referirem o princípio da universalidade, este nunca teve correspondência nas regras efetivamente aplicadas.

Da lei à vida vai uma grande distância. O universo de famílias a aceder a estas prestações é reduzido, correspondendo maioritariamente a agregados que vivem em situações de pobreza extrema ou próximas desta. Propomos, portanto, que as crianças, independentemente do agregado familiar em que estão inseridas, tenham garantida uma infância plena de direitos, com direitos de segurança social, na saúde, na educação e habitação, em condições de igualdade, sem que o acesso a tais garantias seja restringido às crianças e jovens com base em critérios economicistas, naturalmente desproporcionados e socialmente injustos, para assim contribuir para o desenvolvimento das crianças e jovens e de todo o país, combatendo desigualdades e garantindo a proteção da infância e da juventude no superior interesse da criança.

Com estas propostas, o PCP defende o abono de família como um direito da criança e entende que devem ser criadas as condições para uma maior abrangência desta prestação, com vista à sua universalização.

O Sistema Público de Segurança Social deve assumir o seu papel específico de assegurar da proteção social da maternidade e paternidade e na defesa dos direitos das crianças e jovens. Um papel particularmente relevante num contexto marcado pelo agravamento das condições de vida, da pobreza e de empobrecimento das famílias que afeta de forma muito particular crianças e jovens do nosso País, comprometendo o seu direito a um desenvolvimento integral, que em si mesmo constitui uma afronta à democracia e aos valores de Abril.

O combate à precariedade, à desregulação dos horários de trabalho e aos baixos salários são medidas indispensáveis de incentivo à natalidade. Medidas que são indissociáveis da consolidação do papel do sistema público de segurança social – universal e solidário – no reforço da proteção social das crianças e jovens e de apoio à família.

Os sucessivos Governos PDS/CDS e do PS têm vindo a expressar dissimuladas preocupações com a redução da natalidade, visando ocultar a responsabilidade direta e indireta que têm no desrespeito pela função social da maternidade e da paternidade e no

incumprimento dos direitos que lhe estão inerentes.

As sucessivas promessas dos governos de promoção da natalidade têm falhado, como o mostram os indicadores nas últimas décadas , porque elas assentam na responsabilização individual das mulheres e das famílias pela renovação das gerações, no prosseguimento da desregulação dos horários de trabalho, da precariedade laboral, da falta de reposição do poder de compra dos salários e das dificuldades no pagamento da renda ou do empréstimo para habitação, evidenciando uma opção politica assente na desresponsabilização do Estado, das entidades patronais e da sociedade para com a renovação das gerações e para com a função social da maternidade e paternidade e a promoção dos direitos das crianças.

A responsabilidade pela redução da natalidade não é das famílias, é de sucessivos governos e das políticas que executam. Para enfrentar e resolver este problema, é urgente romper com estas opções e construir uma política alternativa, que integre medidas multissetoriais.

É neste sentido que o PCP apresenta esta proposta, no domínio da Segurança Social, alargando o universo de mulheres elegíveis ao Abono Pré-Natal, assim com representa um contributo decisivo para o aumento do seu valor.

Este Projeto de Lei do PCP representa um contributo decisivo que vai ao encontro da garantia e do cumprimento dos direitos das crianças e de um rumo de progresso social.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Decreto-lei n.º 176/2003, de 2 de agosto na sua redação atual, prevendo o seguinte:

  1. Alargamento do universo de titulares do abono pré-natal;
  2. Reposição os escalões do abono de família para crianças e jovens, com vista à sua universalidade.

Artigo 3.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto

Os artigos 12.º-A, 14.º, 15.º-A e 20.º do Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«[…]

Artigo 12.º-A

(…)

  1. O direito ao abono de família pré-natal depende do preenchimento cumulativo das seguintes condições:
    1. Serem os rendimentos de referência do agregado familiar inferiores ao valor de 33 000,00€;
    2. (…).
  2. (…).

(…)

Artigo 14.º

(…)

  1. (…)
  2. Para efeitos da determinação do montante do abono de família para crianças e jovens são estabelecidos os seguintes escalões de rendimentos indexados ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS), em vigor à data a que se reportam os rendimentos apurados:
  • 1.º escalão — rendimentos iguais ou inferiores a 0,5;
  • 2.º escalão — rendimentos superiores a 0,5 e iguais ou inferiores a 1;
  • 3.º escalão — rendimentos superiores a 1 e iguais ou inferiores a 1,5;
  • 4.º escalão — rendimentos superiores a 1,5 e iguais ou inferiores a 2,5;
  • rendimentos superiores a 2,5 e iguais ou inferiores a 5;
  • rendimentos superiores a 5.
  1. (…)
  2. (…)
  3. (…)
  4. (…)
  5. (…)
  6. (…)

(…)

Artigo 15.º-A

(…)

  1. O montante do abono de família pré-natal é de 250,00€, acrescido de majoração idêntica à do abono de família para crianças e jovens que seja devida nos primeiros 12 meses de vida, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
  2. (…).
  3. Ao montante do abono pré-natal é aplicável majoração idêntica à prevista no n.º 4 do artigo 14.º, desde que a respetiva titular viva isoladamente ou o seu agregado familiar seja composto por titulares do direito a abono de família para crianças e jovens.

(…)

Artigo 20.º

(…)

  1. O abono de família para crianças e jovens é concedido, mensalmente:
    1. Até à idade de 18 anos;
    2. (…);
    3. (…);
    4. (…).
  2. (…).
  3. (…).

[…]»

Artigo 3.º

Reposição integral do 4.º, 5.º e 6.º escalões do abono de família

  1. É reposto o pagamento do 4.º escalão do abono de família para crianças e jovens além dos 72 meses de idade, nos termos a fixar pelo Governo em portaria.
  2. Com vista à consagração da universalidade do abono de família para crianças e jovens, são ainda repostos o 5.º e o 6.º escalões, cujo pagamento se efetua nos termos a fixar pelo Governo em portaria.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.

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