Projecto de Resolução

Projecto de Resolução nº 416 /X - Protocolo do Esgotamento

 

Sobre o Protocolo do Esgotamento

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As reservas mundiais de petróleo - provadas, prováveis e possíveis - são hoje conhecidas com elevada segurança, não sendo crível, à luz dos actuais conhecimentos sobre a história geológica da crusta terrestre, designadamente sobre a génese de hidrocarbonetos, e da extensão da prospecção efectuada, que possam vir a aparecer reservas adicionais com significado económico relevante.

É reconhecido o carácter cada vez mais fundamental da energia no funcionamento das sociedades modernas, factor de produção sem o qual, qualquer que seja a forma de energia final considerada, o mundo quase que pararia e as sociedades entrariam numa profundíssima depressão e agitação social.

É sabido que no quadro das energias primárias utilizadas pelo Homem ao longo do último meio século, o petróleo assume um papel dominante, o que é particularmente evidente no que concerne o funcionamento das economias mais industrializadas.

É também sabido que o petróleo, para além de ser utilizado, após complexos processos de refinação, sobretudo como combustível, constitui também matéria-prima importantíssima para as indústrias química, paraquímica, petroquímica e farmacêutica, sendo actualmente a matéria-prima de base de uma variada gama de produtos com enorme presença e importância na vida moderna, produtos que vão desde a larga panóplia de plásticos até aos fertilizantes e pesticidas e mesmo medicamentos.

O petróleo é uma matéria-prima não renovável, pelo menos à escala de evolução da Humanidade. O conhecimento científico e técnico actual permite afirmar com segurança que, a nível global, as reservas de petróleo já foram utilizadas sensivelmente em metade do seu potencial tecnicamente acessível e economicamente útil, tendo esse ponto já sido atingido e ultrapassado na larga maioria dos países produtores - designadamente nos EUA, Indonésia, Mar do Norte, etc. - ao mesmo tempo que as taxas de consumo mundial anunciadas continuam ainda subindo.

Embora este facto seja de enorme importância para o futuro dos povos, a verdade é que a generalidade dos governos, as agências internacionais especializadas designadamente a Agência Internacional de Energia, bem como as grandes empresas petroleiras o escondem da opinião pública mundial, embora venham de ano para ano revendo em baixa as projecções da procura e da capacidade de produção de petróleo convencional. Veja-se, como entre nós, em sede de OE, os preços do petróleo são sistematicamente subavaliados.

Mas aí está a recente escalada dos preços do "crude", que só para gente muito desinformada teve a ver com meros fenómenos conjunturais. A subsequente quebra da cotação, reflecte um refluxo da especulação no mercado de commodities, mas significa sobretudo um profundo retrocesso da actividade económica que a escassez no aprovisionamento de petróleo desencadeou primeiro, recessão que de seguida mantém deprimido o nível da sua procura. 

O mundo atingiu um transitório patamar de capacidade de produção e de saturação da capacidade de procura de petróleo, e a entrar insidiosamente na vertente descendente do ciclo de vida de extracção mundial de "crude", assim descrevendo de forma inexorável a chamada curva de Hubbert, à semelhança do que Marion King Hubbert antecipou aconteceria nos EUA em 1971 e de facto aí então aconteceu.

A situação actual é a de esgotamento progressivo das reservas restantes nas províncias petrolíferas ainda activas, a taxas que variam de 4 a 8% ao ano, por forma que a presente taxa de extracção só poderá ser forçada por mais alguns anos e, se o for, à custa de um enorme esforço de investimento no desenvolvimento de reservas de menor produtividade, e para mais acelerado declínio posterior.

Enquanto isto, em Portugal, o consumo de energia tem crescido a taxas claramente superiores ao PIB, sem que isso signifique crescimento económico e desenvolvimento, bem pelo contrário, significando antes completa falta de planeamento e particularmente uma irracional política de transportes. Recordemos aqui o facto de Portugal já ter em 2003 ultrapassado o nível de emissões de dióxido de carbono que lhe estavam consignadas para 2012, nos termos do Protocolo de Quioto.

Evidentemente que a Humanidade encontrará a prazo - o qual todavia poderá ser longo e deverá ser trabalhoso - outras alternativas para o aprovisionamento energético.

Contudo, duas verdades devem ser desde já tidas em atenção:

•·        o mundo como hoje o conhecemos deverá sofrer mudanças muito profundas nos próximos decénios, particularmente ao nível dos modos de transporte;

•·        as reservas de petróleo restantes, deveriam, como imperativo do futuro sustentado da própria humanidade, ser geridas com imensa sabedoria o que significa, primeiro que tudo, com muita parcimónia.

Desde 2001, foi constituído por cientistas e especialistas de diversos países, directos conhecedores da problemática da geologia e das reservas de petróleo, das tecnologias da sua extracção e utilização, e profundamente preocupados com o rumo da sua utilização e perspectiva da sua exaustão, a Association for the Study of Peak Oil ( ASPO ). Esta associação tem desde 2002 realizado anualmente conferências internacionais (das quais a quarta se realizou em Lisboa, em Maio de 2005), conferências estas que têm diagnosticado e confirmado a urgência de intervenção na antecipação das graves consequências decorrentes da exaustão não planeada desses recursos.

Esta associação, tem proposto que os governos devem concertar-se a nível mundial num plano tendo em vista a boa gestão desses recursos finitos e escassos, a mitigação da sua carência e a transição controlada para uma economia baseada noutras fontes primárias de energia e níveis de consumo compatíveis com a sua disponibilidade. Para o efeito foi proposta a adopção do designado Protocolo de Esgotamento ( The Depletion Protocol ), apresentado pela primeira vez em Uppsala em Maio de 2002, e debatido em Lisboa em Maio de 2005.

Neste quadro, pela relevante e actualíssima importância do tema, a Assembleia da República recomenda ao Governo que endosse e promova nos planos nacional e internacional o articulado do designado  Protocolo do Esgotamento

Assembleia da República, em 15 de Janeiro 2009

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PROTOCOLO DO ESGOTAMENTO

Considerando que a passagem da história tem registado um ritmo de mudança acelerada, de modo que a procura de energia tem aumentado rapidamente em paralelo com a população mundial ao longo dos últimos duzentos anos posteriores à Revolução Industrial;

Considerando que a oferta de energia exigida pela população mundial tem vindo principalmente do carvão e do petróleo, formados no passado geológico, e que tais recursos estão inevitavelmente sujeitos a esgotamento;

Considerando que o petróleo proporciona noventa por cento do combustível para os transportes, é essencial ao comércio e desempenha um papel crítico na agricultura, necessária para alimentar a expansão populacional;

Considerando que o petróleo está desigualmente distribuído sobre o Planeta por razões geológicas bem entendidas, com grande parte dele estando concentrado em cinco países junto ao Golfo Pérsico;

Considerando que todas as maiores províncias produtivas do Mundo já foram identificadas graças à tecnologia avançada e ao conhecimento geológico cada vez mais exacto, sendo agora evidente que as descobertas alcançaram um pico na década de 1960, apesar dos progressos tecnológicos e da prospecção diligente;

Considerando que o pico passado da descoberta inevitavelmente conduz a um correspondente pico da produção na primeira década do século XXI, assumindo que não haja um declínio radical da procura;

Considerando que o início do declínio deste recurso crítico afecta todos os aspectos da vida moderna, o que tem graves implicações políticas e geopolíticas;

Considerando que é adequado planear uma transição ordenada para o novo ambiente mundial de reduzida oferta de energia, tomando disposições para evitar o desperdício de energia, estimular a entrada de energias substitutas e dilatar o tempo de vida do petróleo remanescente;

Considerando que é desejável atender aos desafios que assomam no horizonte de uma maneira cooperativa e equitativa, assim como os relacionados com as preocupações da mudança climática, da estabilidade económica e financeira e das ameaças de conflitos para acesso a recursos críticos.

É PROPOSTO AGORA QUE

1- Seja convocada uma convenção de países para considerar a questão tendo em vista concertar um Acordo com os seguintes objectivos:

               a) evitar a especulação (profiteering) com a escassez, de modo a que os preços do petróleo possam permanecer num relacionamento razoável com o custo de produção;

               b) permitir aos países pobres manterem as suas importações;

               c) evitar a desestabilização dos fluxos financeiros decorrentes de preços excessivos de petróleo;

               d) encorajar os consumidores a evitarem o desperdício;

               e) estimular o desenvolvimento de energias alternativas.

2- Tal Acordo terá disposições com os seguintes contornos:

               a) Nenhum país extrairá petróleo acima da sua actual Taxa de Esgotamento, sendo a mesma definida como a produção anual em percentagem das reservas últimas ainda por produzir;

               b) Cada país importador reduzirá as suas importações para atingir a actual Taxa Mundial de Esgotamento, deduzida a sua produção interna.

3- Disposições pormenorizadas cobrirão a definição das várias categorias de petróleo, isenções e qualificações, e os procedimentos científicos para a estimação da Taxa de Esgotamento.

4- Os países signatários cooperarão proporcionando informação sobre as suas reservas, permitindo auditoria técnica plena, a fim de que a Taxa de Esgotamento possa ser determinada com precisão.

5- Os países signatários terão o direito de recorrer quanto à avaliação da sua Taxa de Esgotamento no caso de se verificarem alteração de circunstâncias.

 

 

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