Projecto de Resolução

Projecto de Resolução n.º 390/X - Margem (spread) máxima no crédito à habitação

Fixa uma margem (spread) máxima no crédito à habitação própria permanente concedido pela Caixa Geral de Depósitos, como forma de contenção e redução das taxas de juro efectivas no Crédito à Habitação

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A crise económica e financeira mundial, desencadeada nos Estados Unidos da América, tem vindo a provocar enormes dificuldades na economia real, com destaque para a subida generalizada das taxas de juro dos mercados interbancários e o consequente agravamento das taxas a que as empresas não financeiras e as famílias estão sujeitas.

Perante o agravamento da situação económica e social, o Banco Central Europeu manteve-se inflexível no cumprimento do seu mandato político que os governos europeus definiram e confirmaram em sucessivos conselhos europeus. A prioridade à estabilidade dos preços e dos salários, definida no seu mandato, leva a que, perante o agravamento da inflação externa à União Europeia (em razão do aumento do preço das matérias-primas, dos combustíveis e dos alimentos), o Conselho de Governadores do BCE tenha subido a taxa de juro de referência tendo chegado a 4,25%.

Esta opção política mantém-se, e não é desmentida pelo anúncio hoje feito da descida para 3,75% da taxa de juro de referência a que o BCE foi obrigado apesar das recentes declarações de ameaça de futuras subidas por parte dos seus principais responsáveis pressionando os governos para não cederem às propostas de elevação dos salários dos trabalhadores europeus. A alteração agora anunciada é tardia e insuficiente. Continua a ser indispensável a actuação dos Governos, e em particular do português, no sentido de exigir do BCE uma actuação que tenha em conta as dificuldades das economias mais débeis como a portuguesa, o crescimento económico e a promoção do emprego.

O sistemático e comprometido silêncio dos governos dos diferentes países europeus (entre os quais se encontra o actual Governo do Partido Socialista) e as orientações políticas que lhe estão subjacentes são responsáveis pelo agravamento da situação social das famílias. O abrandamento da actividade económica, a manutenção de elevados números de trabalhadores no desemprego, a par das políticas de contracção da despesa pública, está a reflectir-se na cada vez mais difícil manutenção das condições de vida das famílias.

O aumento do incumprimento nos créditos bancários é reflexo da incapacidade das famílias fazerem face ao agravamento das prestações mensais, nomeadamente com os créditos para aquisição de habitação própria permanente.

De acordo com últimos dados disponíveis, existem em Portugal 1 736 593 contratos de crédito à habitação, 428 588 dos quais têm bonificação, pelo que restam 1 308 005 que na sua esmagadora maioria correspondem a contratos de compra de habitação própria e permanente. Refira-se ainda que 841 713 destes empréstimos à habitação, 48,5% do total, foram contraídos desde Janeiro de 2003 após o fim da concessão de crédito bonificado à aquisição de habitação. 

No último ano as famílias com crédito à habitação foram confrontadas com uma subida vertiginosa do valor das prestações mensais, devido à subida da taxa Euribor, taxa de financiamento no mercado interbancário também usada como referência na concessão de crédito, nomeadamente no relativo à aquisição de habitação, bem como à subida das margens de lucro dos bancos nestas operações bancárias (spreads).

A taxa Euribor a seis meses passou de 4,736% em 23 de Setembro de 2007, para 5,256% em 23 de Setembro de 2008, ao mesmo tempo que o spread médio nos novos empréstimos à habitação própria e permanente, subiu de 0,61% há um ano para 0,95% nos nossos dias.

Como resultado destas subidas vertiginosas das taxas de juro suportadas pelas famílias nos empréstimos à habitação, a prestação mensal num empréstimo de 100 mil euros, valor médio dos empréstimos em vigor, subiu no último ano cerca de 70 euros. Neste mesmo período o aumento líquido do salário médio de um trabalhador português foi de apenas 7 euros.

Hoje os bancos negoceiam com as famílias empréstimos à aquisição de habitação própria permanente, com margens (spreads) que vão desde os 0,35% até 2,5%. No entanto, para que as famílias consigam margens de 0,35% precisam de reunir um conjunto de condições, relação financiamento/garantia e aquisição de outros produtos financeiros, fora do alcance da esmagadora maioria delas.

Com a subida das taxas de juro, bem como, do aumento da margem financeira dos bancos, resultado da crescente vulnerabilidade e endividamento das famílias e da incerteza e instabilidade dos mercados financeiros, o Partido Comunista Português tem vindo a propor ao Governo que, fazendo uso da sua condição de único accionista da Caixa Geral de Depósitos e no âmbito das suas competências, intervenha no mercado do crédito à aquisição de habitação própria permanente.

Dado o peso da Caixa Geral de Depósitos no mercado de crédito à habitação, cerca de 1/3, e o contínuo e preocupante agravamento da situação social das famílias, esta instituição financeira pública poderá e deverá ser chamada a assumir um papel activo de regulador dos preços do mercado de crédito à habitação.

Assim sendo o PCP propõe que a margem máxima (spread) a ser adicionada à taxa Euribor, em vigor no momento da contratualização dos empréstimos à aquisição de habitação própria permanente, na CGD, não ultrapasse os 0,5%.

Nesta nova solução os contratos em vigor com margens superiores a 0,5% terão de ser renegociados por forma a não ultrapassarem esta margem (spread) e verão o valor da prestação mensal baixar e os novos contratos não poderão ser contratualizados com uma margem (spread) superior aos mesmos 0,5%.

Para melhor se compreender o impacto desta medida junto das famílias, tomemos as diferenças que se verificam num empréstimo de 100.000 euros, com a taxa Euribor a 6 meses, em vigor no corrente mês de Setembro, entre a margem (spread) máxima proposta pelo PCP (0,5%) e as margens de 1%, 1,5% e 2%:

  • Margem de 1%: + 32 euros
  • Margem de 1,5%: + 64,8 euros
  • Margem de 2%: + 98,3 euros

Tendo em atenção o exposto, a Assembleia da República, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, resolve recomendar ao Governo que:

•1.    Exija a continuação da redução do valor da taxa de referência do BCE para níveis susceptíveis de contribuírem para a dinamização da economia real e para a redução do nível de endividamento das famílias e das empresas.

•2.    Os contratos de concessão de empréstimo destinados à aquisição, construção e realização de obras de conservação ordinária, extraordinária e de beneficiação de habitação própria permanente, estabelecidos entre a Caixa Geral de Depósitos e terceiros particulares fixem obrigatoriamente uma margem (spread) não superior a 0,5%;

•3.    O valor máximo da margem (spread) fixado no número anterior seja aplicado a todos os contratos do tipo referidos no mesmo, em vigor ou a estabelecer futuramente;

  1. As alterações contratuais, determinadas pela aplicação do disposto no número 3 em contratos em vigor, sejam feitas sem quaisquer encargos administrativos, ou outros, para os beneficiários dos mesmos.

Assembleia da República, em 8 de Outubro de 2008

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