Projecto de Resolução

Projecto de Resolução nº 373/X - Sistema Científico e Técnico Nacional

 

Medidas para a Dinamização do Sistema Científico e Técnico Nacional

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A Ciência e Tecnologia são vectores estruturais para um desenvolvimento integrado e harmonioso de Portugal. Só uma política que promova o potencial de Investigação, Desenvolvimento e Inovação (I,D&I) pode contribuir para a elevação das capacidades nacionais no plano das necessidades que se colocam nos dias de hoje ao país. A capacidade e o potencial do país, no plano da Ciência e Tecnologia são também pilares essenciais da soberania nacional.

A existência de Sistema Científico e Técnico Nacional (SCTN) coeso e pujante é fulcral para a articulação entre o sector produtivo e o desenvolvimento social, humano e territorial. Além disso, só um SCTN estruturado pode, de facto, funcionar como rede de Investigação e Desenvolvimento (I&D) e como dispositivo efectivamente nacional, ao serviço de políticas e estratégias nacionais. A dinamização do SCTN é, portanto, um elemento estruturante para uma estratégia de desenvolvimento nacional assente numa evolução tecnológica ao serviço do país, tal como é um elemento essencial para a modernização do aparelho produtivo.

A promoção exclusiva de nichos, ou de pequenos grupos de investigação em áreas circunscritas do Conhecimento, não representa de forma alguma o aumento do potencial científico e técnico do país, na medida em que faz afirmar apenas núcleos de I&D que funcionam de forma descoordenada e sem orientação estratégica e nacional. É numa perspectiva de aumento de coesão e de potencial que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista apresenta o presente Projecto de Resolução.

A situação nacional, no que diz respeito às políticas de Ciência e Tecnologia, é no entanto caracterizada por um desinvestimento flagrante e pela destruição da capacidade instalada, acompanhada por um ataque aos direitos dos trabalhadores e por uma crescente precariezação das relações laborais.

O Ensino Superior, as redes Universitária e Politécnica públicas elementos centrais das actividades de I&D são sujeitos a anos consecutivos de desinvestimento e de financiamento significativamente abaixo das suas necessidades básicas de funcionamento, sendo que grande parte das instituições de Ensino Superior Público não dispõe de financiamento suficiente para fazer frente às despesas certas e permanentes, entre as quais os próprios salários dos funcionários docentes e não docentes. Mesmo considerando a cobrança de propinas de valor muito acima do salário mínimo nacional (mais do dobro), as instituições não dispõem de orçamento com suficiente liquidez para assegurar as necessidades de gestão diária e corrente. O investimento, através de PIDDAC, cessou completamente nos últimos anos, o que não permite, com maior ou menor criatividade, às instituições, fazer frente às necessidades de investimento que manifestamente se vão colocando de forma crescente e acelerada.

Todavia, as carências do SCTN são transversais às suas componentes públicas, incluindo os Laboratórios do Estado (LE). Aliás, nos LE's, as insuficiências, conjunturais ou estruturais, fazem sentir-se de forma amplificada, fruto das políticas de desmantelamento do aparelho produtivo nacional e de total desorientação para o sector das actividades de I&D no sistema público.

A política economicista deste Governo faz com que a gestão de recursos humanos assente quase exclusivamente na colocação de bolseiros de investigação científica (para o desempenho das mais variadas tarefas no SCTN) e na contratação precária de trabalhadores.

No essencial, o financiamento, aliado à falta de estratégia e visão política nacional, tem conduzido o SCTN para um conjunto de instituições que funcionam de forma cada vez mais distante da indústria e cada vez mais desconexa. Ao invés de existir um sistema, existe um conjunto de "ilhas". Num regime em que o Governo tenta afundar umas, e elevar outras.

De acordo com os elementos estatísticos oficiais mais recentes que são os constantes do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional -IPCTN, referente a 31 de Dezembro de 2005, a despesa pública com Investigação e Desenvolvimento (I&D) ascendeu nesse ano a cerca de 700 milhões de euros, enquanto o número de investigadores em Equivalente a Tempo Integral (ETI) no sector público, era naquela data de cerca de 17 000.

Assim a despesa per capita de investigador cifrou-se em média em menos de 44 milhares de euros PPS (se se incluir o sector das empresas este valor sobe para cerca de 60 mil euros PPS).

O valor correspondente - despesa per capita de investigador ETI- na média da União Europeia a 25 atingia em 2003 perto de 180 mil euros. Para financiar correctamente os 17 mil investigadores ETI, o Estado deveria orçamentar para o efeito cerca de 3 mil e 400 milhões de euros PPS. A penúria das instituições de I&D nacionais fica assim patente. As necessidades de investimento ascendem a 750 Milhões de euros num quadro de manutenção do número de investigadores.

A relação entre o número de investigadores e técnicos de investigação é um indicador importante para o diagnóstico e para a compreensão das capacidades do SCTN. Em 2003 havia no conjunto dos vários sectores do Sistema Científico e Técnico Nacional (SCTN) - Ensino superior, laboratórios do Estado, instituições privadas sem fins lucrativos e empresas que declararam actividades de I&D - 2,7 investigadores para 1 técnico (ETI). Na média da União a 25 esse rácio era, em 2003, de 6,7 para 1. Mantendo os efectivos de pessoal investigador ETI contabilizado em 2003, o défice de pessoal técnico relativamente à média da União a 25, era no sector público nesse mesmo ano de cerca de 6 mil e 500 unidades ETI.

A melhoria das condições de trabalho e a dignificação das carreiras na área do trabalho científico são assumidas pelo PCP como metas indispensáveis para a dinamização do SCTN. Nunca será demais invocar as seguintes palavras: "as remunerações no sector público e as estruturas de carreira não são susceptíveis de atrair o pessoal qualificado que é exigido, quer em qualidade quer em quantidade" (citação do relatório do High Level Group on Human Resources for Science and Technology nomeado pela Comissão Europeia e presidido por José Mariano Gago, Bruxelas, 2 de Abril de 2004). É cada vez mais urgente a aplicação de novas regras no âmbito das carreiras de investigador e de técnico de investigação (estendendo esta última até ao grau de Doutor), transpondo para o ordenamento nacional os princípios da Carta Europeia do Investigador.

Simultaneamente, só com uma perspectiva e acção políticas mais amplas e mais estratégicas, poderão ser dignificadas e devidamente enquadradas no justo patamar da sua importância, as Outras Actividades de Ciência e Tecnologia (OAC&T) de acordo com a nomenclatura contida no manual de Frascati, onde se encontram as actividades que não produzem necessariamente Conhecimento, mas que são indispensáveis para o funcionamento do SCTN.

Só com uma política para a Ciência e Tecnologia que parta das capacidades e do potencial científico e técnico existentes, mas que aspire a promovê-los e a articular as diversas dimensões das actividades de I,D&D com a indústria e as reais necessidades do país, será possível abrir caminho para um verdadeiro desenvolvimento integrado assente no Conhecimento e no tendo como objectivo central a melhoria das condições de trabalho e de vida do povo português. 

Assim, nos termos regimentais aplicáveis, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

•i.                 Até 2010, multiplique por 2,5 a despesa per capita de investigador ETI, o que implicaria, para igual número de investigadores. O esforço financeiro adicional deverá ser anualmente actualizado à medida que aumentem os efectivos de pessoal investigador.

•ii.               Até 2010 crie condições objectivas para preencher pelo menos 3000 lugares de técnico nas instituições e grupos de investigação activos no sector público, reduzindo assim aquele défice em cerca de 50%, a manter-se o número de investigadores activos. Anualmente deverão ser criados os postos de trabalho que permitam colmatar o défice tendo em conta, também, o esperado aumento do número de investigadores.

•iii.              Definição de um plano detalhado de prioridades de investigação nos vários sectores que interessam à economia e aos serviços, com ampla participação, designadamente de representantes da comunidade científica.

•iv.              Revitalização do Conselho Superior de Ciência e Tecnologia e alargamento das suas competências estatutárias.

•v.               Elabore de forma participada de um Programa Mobilizador dos Laboratórios do Estado, tendo em conta a contribuição que os laboratórios devem poder dar para a satisfação das necessidades do país e - não apenas, mas também - os recursos humanos, de equipamentos e instalações, actualmente existentes nesse sector do SCT nacional. O Programa deverá ter como linhas orientadoras a instituição de contratos-programa com financiamento plurianual assegurado; a efectiva autonomia de gestão dos envelopes orçamentais estabelecidos; a atribuição às instituições da capacidade de concessão de bolsas à margem da FCT, de acordo com as suas necessidades operacionais e disponibilidades financeiras.

•vi.              Promova o reequilíbrio da distribuição da força de trabalho científica empregada no sector público, designadamente do pessoal investigador, tendo em conta o seu número actual e a sua evolução futura, bem como as necessidades e prioridades dos diferentes domínios de actividade de I,D&I, mantendo as instituições de Ensino Superior ou a elas associadas como principal suporte da investigação livre, básica ou fundamental, e os laboratórios do Estado e outras instituições públicas com actividades de C&T como principal suporte da investigação aplicada, desenvolvimento experimental e inovação tecnológica, orientados para as necessidades dos serviços públicos e das empresas.

•vii.            Adopte um modelo de escolha e designação dos dirigentes dos laboratórios e instituições públicas de I&D, conforme com as linhas orientadoras definidas na RCM124/2006, de 3 de Outubro, e ainda não aplicado.

•viii.          Faça dotar a FCT de pessoal qualificado permanente, abolindo o recurso ao trabalho precário de bolseiros-funcionários e garantir a transparência de gestão que permita o conhecimento público, designadamente: das condições e prazos de lançamento dos concursos para o financiamento de projectos e bolsas; condições de atribuição dos financiamentos plurianuais atribuídos a laboratórios e centros de I&D; prazos de decisão reais relativos às candidaturas apresentadas; montantes globais disponíveis; e taxas de sucesso das candidaturas.

•ix.              Garanta o pagamento atempado a pessoas e instituições, dos subsídios aprovados e apresentação semestral de balanços à Comissão Parlamentar competente para as questões de Ciência e Tecnologia, dando conta da evolução da situação financeira da Fundação.

•x.                Revalorize as competências dos Conselhos Científicos das instituições e unidades de I&D do sistema público, designadamente, no sentido da sua co-responsabilização na afectação dos recursos aos objectivos e programas da instituição bem como na aprovação de projectos ou de candidaturas a projectos, e na execução orçamental, traduzida na obrigatoriedade de parecer.

•xi.              Valorize a Carreira de Investigador Científico (Estatuto Jurídico do Pessoal de Investigação Científica) e de Técnico de Investigação Científica, alargando esta última até ao grau de doutor, quando adequado, bem como a criação de um Estatuto Jurídico do Investigador em Formação que adopte o contrato de trabalho como base da relação laboral que se estabelece entre investigadores em formação e as instituições que desenvolvem actividades de C&T.

•xii.            Crie um Fundo para a Inovação Tecnológica empresarial financiado pelas empresas na proporção de 1% do respectivo VAB acima de 5 milhões de euros de volume de negócios anual, com co-gestão e co-financiamento públicos.

•xiii.           Crie um Programa Nacional de parcerias para actividades de investigação aplicada e de inovação de produtos e processos a executar por Micro, Pequenas e Médias Empresas, mediante a negociação de contratos de projecto entre as empresas e instituições públicas de I&D, com metas e prazos definidos e financiamento público a fundo perdido.

•xiv.           Proceda ao levantamento e caracterização sistemáticos das actividades científicas e técnicas realizadas no País exteriores ao universo da I&D - as OAC&T, na nomenclatura do manual de Frascati - entidades que as executam, recursos humanos que lhes estão afectos e montante da correspondente despesa e tome medidas para a inclusão destes dados em futuras operações de levantamento do Potencial Científico e Tecnológico Nacional.

Assembleia da República, em 22 de Julho de 2008

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