Projecto de Lei

Projecto de Lei nº 626/X - Código do IVA

 

Altera e clarifica o Artigo 29º do Código do IVA - Imposto sobre o Valor Acrescentado, relativo às obrigações genéricas dos contribuintes e o Artigo 32º do Regime Geral das Infracções Tributárias

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O que ocorreu nos últimos dias do mês de Dezembro de 2008, em que milhares de contribuintes - sobretudo trabalhadores independentes em regime de recibo verde - foram notificados para pagarem coimas respeitantes a presumíveis incumprimentos relativos aos anos de 2006 e de 2007, mostra, por um lado, um excesso de zelo da administração tributária que roça má fé e, por outro lado, a existência de ambiguidades normativas nos códigos de imposto, mormente do IVA, que sustentam aqueles actos administrativos.

Não é aceitável que se possa, contudo, explicar a emissão de dezenas e dezenas de milhares de notificações com meras decisões individuais desta ou daquela Repartição de Finanças ou com a especial vocação de alguns funcionários da administração tributária mais empenhados na obtenção de receitas fiscais por via de processos contra-ordenacionais imputáveis a actos pretensamente atribuídos a atitudes dolosas de um número tão elevado de contribuintes, seja em sede de IRS, seja em sede de IRC.

O sucedido mostra, bem pelo contrário, uma determinação da super-estrutura dirigente da Direcção-Geral de Impostos, certamente com a cobertura política dos respectivos membros do Governo, em procurar a todo o custo a obtenção coerciva de receitas fiscais que nada têm a ver com fuga ou evasão fiscais por parte de qualquer destes muitos milhares de contribuintes, antes são consequência de eventuais actos de negligência traduzidos pela não apresentação de declarações funcionalmente desnecessárias para o apuramento da situação fiscal e completamente supérfluos para a determinação do valor do imposto devido, aliás já integral e atempadamente liquidado.

O sucedido mostra, em síntese, a determinação da super-estrutura dirigente da Direcção-Geral de Impostos - certamente com a cobertura política da sua tutela governamental - na busca obsessiva de receitas fiscais, (neste caso com notificações de milhões de euros de coimas), prosseguindo metas e objectivos pré fixados, independentemente da sua justificação funcional, instrumental ou ética. Em vez de vocacionar a máquina fiscal para o real combate à evasão e fraude fiscal, em vez de adoptar políticas fiscais indutoras de uma maior equidade fiscal e promotoras de uma mais adequada distribuição de rendimentos, o Governo opta pelo apoio a este tipo de operações de "caça à multa" que apenas penaliza quem já paga de facto os seus impostos.

Para atingir estes fins, a super-estrutura dirigente da Direcção-Geral de Impostos - com o apoio político implícito e explícito do Governo e dos responsáveis pela área das Finanças - busca muito frequentemente as lacunas, as omissões, os erros normativos ou as disposições existentes nos códigos de imposto que nunca se aplicaram pelo seu evidente anacronismo ou mais que evidente desnecessidade. Foi exactamente esta a situação que atingiu dezenas de milhares de contribuintes - a maior parte trabalhadores independentes em regime de recibos verdes - que têm vindo a ser notificados para o pagamento de coimas de 124 euros por cada um dos anos (2006 e 2007) em que não terão presumivelmente entregado declarações constantes do artigo 29º, nº 1, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA).

Até agora, os sujeitos passivos abrangidos pela alínea a) do nº 1 do Artigo 2º do CIVA - pessoas singulares ou colectivas que, de modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, sempre que essas actividades tenham incidência real em sede de IRS e de IRC - apresentavam (e apresentam) as declarações periódicas de IVA, (mensais ou trimestrais, de acordo com o Artigo 41º do CIVA), remetendo-as para a Administração Tributária e liquidando ou creditando o valor do imposto devido, de acordo com as respectivas circunstâncias fiscais.

Estes sujeitos passivos apresentavam (e apresentam) também as declarações anuais relativas à respectiva situação em sede de IRS e IRC, as quais, em conjunto com aquelas declarações periódicas, sempre permitiram a total e completa regularidade da situação fiscal dos sujeitos passivos, seja em sede de IVA, de IRS ou de IRC.

Estas declarações - constantes dos artigos 41º e 29º (nº 1) do CIVA - foram as únicas exigências administrativas e fiscais que milhares e milhares de contribuintes sempre cumpriram, as quais têm cabalmente permitido a normalidade da respectiva situação fiscal e a liquidação atempada e integral dos impostos devidos.

Foi exactamente isto que sucedeu nos anos de 2006 e 2007.

Só que a Administração Tributária (a sua super-estrutura dirigente) "descobriu" entretanto outras normas complementares no Artigo 29º nº 1 que nunca tinham sido objecto de aviso prévio aos contribuintes, que nunca tinham sido exigidas nos anos em questão e que, manifestamente, são completamente desnecessários para o apuramento da situação fiscal dos contribuintes.

É o caso das normas respeitantes às alíneas d), e), e f), do nº 1 do referido Artigo do CIVA que, respectiva e sucessivamente impõem:

- "Entregar uma declaração de informação contabilística e fiscal e anexos respeitantes à aplicação do Decreto-Lei nº 347/85, de 23 de Agosto, e dos regimes especiais previstos em legislação complementar a este diploma, relativos às operações efectuadas no ano anterior, os quais fazem parte integrante da declaração anual a que se referem os Códigos do IRC e do IRS";

- "Entregar um mapa recapitulativo com identificação dos sujeitos passivos seus clientes, donde conste o montante total das operações internas realizadas com cada um deles no ano anterior, desde que superior a (euro) 25.000, o qual é parte integrante da declaração anual a que se referem os Códigos do IRS e do IRC";

- "Entregar um mapa recapitulativo com a identificação dos sujeitos passivos seus fornecedores, donde conste o montante total das operações internas realizadas com cada um deles no ano anterior, desde que superior a (euro) 25.000, o qual é parte integrante da declaração anual a que se referem os Códigos do IRS e do IRC".

É também o caso da alínea h) do nº 1 do mesmo Artigo do CIVA que impõe:

- "Enviar, por transmissão electrónica de dados, a declaração, anexos e mapas recapitulativos a que se referem as alíneas d), e) e f) até ao final do mês de Junho ou, em caso de adopção de um período de tributação em IRC diferente do ano civil, até ao final do 6º mês posterior à data do termo desse período".

Sucede que a necessidade da apresentação dos "mapas recapitulativos" (constante das alíneas e) e f) do nº 1 do Artigo 24º do CIVA) e a necessidade da entrega anual da declaração de informação contabilística e fiscal (constante da alínea d), do mesmo número e artigo do CIVA), eram desconhecidas da esmagadora maioria destes contribuintes, para além de constituírem informação totalmente supérflua e desnecessária por se limitar a repetir tudo o que já era (e é) conhecido da Administração Tributária e que é entregue nas declarações periódicas de IVA e nas declarações anuais de IRS e de IRC dos contribuintes.

Sucede ainda que as coimas objecto de notificação são referentes à não entrega daquelas declarações nos anos de 2006 e 2007, sendo lícito também questionar a razão pela qual os contribuintes não foram então logo notificados no final de 2006. Tal como é lícito questionar igualmente a razão pela qual nunca, até agora, tinham sido tais declarações exigidas aos contribuintes.

Pressionada pela imediata reacção dos milhares de contribuintes lesados com esta verdadeira operação de "caça à multa", o Governo apressou-se em emitir - através da Direcção-Geral de Impostos - um "Comunicado" onde depois de enunciar a obrigatoriedade de proceder à entrega de declarações para efeitos "estatísticos e similares", reconhece que a declaração anual exigida "não visa o apuramento da situação tributária" do sujeito passivo, reconhece que a falta da "informação" não ocasionou prejuízo à receita tributária, reconhece que a "infracção" resulta de desconhecimento e conclui pela dispensa da coima na presunção de que sejam cumpridas até final de Janeiro de 2009 as obrigações declarativas.

É um passo positivo, é um recuo e o reconhecimento de um erro. Não obstante, mantém, inflexivelmente, as obrigações declarativas exactamente nos mesmos termos, mesmo reconhecendo a sua desnecessidade.

No entendimento do PCP, este comunicado mantém assim o cutelo sobre as cabeças dos contribuintes em matéria que não se mostra necessária para o apuramento da situação fiscal e tributária dos sujeitos passivos, que já apresentam toda a informação necessária e suficiente para esse fim. Na opinião do PCP pode até aceitar-se a necessidade da prestação das declarações em causa (constantes das alíneas d), e) e f) do nº 1 do Artigo 29º do CIVA) mas essa necessidade terá que ser determinada caso a caso pela Administração Tributária e exigível em conformidade. Deve assim dispensar-se o contribuinte da obrigatoriedade genérica de entregar declarações supérfluas e com informação fiscal repetida, admitindo-se que, no caso da declaração anual, seja a própria Administração Fiscal quem faça o respectivo pré-preenchimento, de forma automática e por via electrónica, à semelhança do que já hoje sucede com as declarações anuais de IRS.

A situação vivida com estes contribuintes tornou também mais evidente a deficiente informação da generalidade das pessoas quanto aos direitos que possuem. É o caso mais notório do Artigo 32º do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, que versa a "dispensa e a atenuação especial de coimas" e que, na esmagadora maioria da situação, é desconhecido.

Se, como dispõe esse artigo, quando a "prática de infracção não ocasiona prejuízo efectivo à receita tributária", quando a referida infracção "está regularizada" e quando "a falta revelar um diminuto grau de culpa", a coima pode ser dispensada ou atenuada, então esta norma do RGIT deve ser amplamente divulgada. É o que propõe o Partido Comunista Português com o aditamento de um nº 3 ao referido artigo.

Neste contexto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1º

Alteração ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro

O artigo 29º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro, passa a ter a seguinte redacção:

"Artigo 29º

(...)

  1. (...)
  2. (...)
  3.  (...)
  4.  (....
  5.  (...)
  6.  (...)
  7.  (...)
  8.  (...)
  9.  (...)
  10.  (...)
  11.  A entrega da declaração referida na alínea d) e dos mapas recapitulativos referidos nas alíneas e) e f) do nº 1 só são de entrega obrigatória para os sujeitos passivos nos casos em que a sua apresentação seja expressamente solicitada através de notificação anual.
  12.  (...).
  13.  (...).
  14.  (...).
  15.  (...).
  16.  Para efeitos da aplicação da alínea d) do nº 1 e do nº 11 do presente artigo, a Administração Fiscal faculta antecipadamente aos contribuintes o pré‑preenchimento electrónico da declaração de informação contabilística e fiscal dos contribuintes."

Artigo 2º

Alteração ao Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho

O artigo 32º do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, passa a ter a seguinte redacção:

"Artigo 32º

(...)

  1. (...).
  2.  (...).
  3.  Todos os Serviços de Finanças devem afixar, de forma visível, a informação contida no presente artigo, bem como efectuar a sua transcrição nas notificações relativas a coimas e processos contra‑ordenacionais, efectuadas aos contribuintes."

Artigo 3º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, em 18 de Dezembro de 2008

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