Projecto de Lei

Projecto de Lei n.º 460/X - Licença por maternidade/paternidade

Garante o pagamento de 100% da remuneração de referência em caso de licença por maternidade/paternidade por 150 dias

 

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Exposição de motivos

 

"Ser mãe, ser feliz! A Constituição da República Portuguesa reconhece o valor social da maternidade e confere importantes direitos à mulher e à criança. É uma grande conquista. Mas é necessário dar força de lei às medidas que se impõem em todos os campos, para que este princípio possa tornar-se realidade. Já se perdeu demasiado tempo. É urgente resolver os graves problemas que afectam a mulher e a criança. É urgente defender a maternidade como acto livre, consciente e responsável [...]."

 

(Folheto no âmbito da Campanha do PCP sobre os seus projectos de lei: Protecção e Defesa da Maternidade, Garantia do Direito ao Planeamento Familiar e à Educação Sexual e Despenalização do Aborto, 1982). 

1 - O direito de ser mãe e ser pai é uma opção livre, consciente e responsável, que implica o direito a determinar o momento e o número de filhos que se desejam e a partilha de deveres e responsabilidades entre os progenitores na garantia do afecto, da segurança e desenvolvimento da criança. Um direito que implica também que as entidades patronais assegurem o cumprimento dos direitos de maternidade e paternidade das trabalhadoras e trabalhadores, cabendo ao Estado promover a fiscalização do seu cumprimento, a partir dos locais de trabalho.

Ao Estado cabe cumprir e fazer cumprir importantes preceitos constitucionais quanto à garantia de independência económica e social dos agregados familiares, a uma mais justa repartição do rendimento nacional em favor dos salários dos trabalhadores e suas famílias, à criação de apoio à família e à criança, de qualidade e a preços acessíveis.

A necessidade de aprofundamento da protecção da maternidade e paternidade enquanto funções socais do Estado plasmada na Constituição da República tem sido desde sempre uma preocupação do PCP.

 

Uma breve resenha histórica das iniciativas legislativas apresentadas pelo PCP ilustra bem o sentido das medidas legislativas que podem dar corpo a uma efectiva protecção da função social da maternidade e paternidade - plasmada na Constituição da República - no âmbito do trabalho, da segurança social e da saúde. 

 

Em 1981, o PCP apresenta o Projecto de Lei 115/II, prevendo o acompanhamento familiar de criança hospitalizada, projecto que foi aprovado por unanimidade, tendo dado origem à Lei n.º 21/81, de 19 de Agosto.

 

Em 1982, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou na Assembleia da República o Projecto de Lei 307/II de protecção e defesa da maternidade, que foi, à data, um acto de audácia, uma iniciativa pioneira e de grande alcance social, apenas possível porque identificado com os problemas do povo e que são hoje, infelizmente, ainda actuais.

 

A garantia à mulher grávida do acompanhamento, pelo futuro pai durante o trabalho de parto resultou da apresentação de um projecto de Lei 279/III pelo PCP em 1984, que aprovado por unanimidade, originou a Lei n.º 14/85, de 6 de Julho, garantindo à mulher grávida o acompanhamento, pelo futuro pai durante o trabalho de parto.

 

A necessidade de reforço das medidas de apoio social às mães e pais estudantes originou em 2001 a apresentação de Projecto de Lei que originou a Lei n.º 90/2001, de 20 de Agosto.

 

E ao longo dos anos o PCP tem vindo a apresentar sucessivas iniciativas legislativas de aprovação de medidas tendentes à garantia da efectivação dos direitos das mães sós e de atribuição de um subsídio mensal especial aos filhos a cargo de mães sós, rejeitadas pelo PSD e CDS-PP.

 

Visando reforçar os mecanismos de protecção da maternidade e de paternidade no âmbito do Sistema Público de Segurança Social o PCP tem apresentado diversas iniciativas legislativas em que se destacam: a garantia de licença especial nas situações de gravidez de risco, que, aprovado por unanimidade, originou a Lei n.º 142/99, de 31 de Agosto e a criação de um subsídio social de maternidade e paternidade a quem não exerça actividade laboral e não seja titular de prestações sociais na eventualidade de desemprego ou o rendimento social de inserção social (2006).  

 

Ainda nesta legislatura, apresentou o projecto de resolução n.º 131/X, que reforça a protecção da maternidade e paternidade e propõe, entre outras medidas, o reforço e alargamento da rede pública de creches e infantários de qualidade e a preços acessíveis e o Projecto de Lei 225/X que institui e regulamenta um novo regime de prestações familiares.

 

2 - O decréscimo da taxa de natalidade tem estado na ordem do dia das agendas políticas europeias e Portugal não é excepção. A redução da taxa de fecundidade do nosso país situa-se em 1,4 crianças por mulher, longe da taxa de 2,1 crianças necessárias à renovação de gerações.

 

Este decréscimo da taxa de fecundidade e natalidade está ligado sobretudo às consequências do modelo económico e social imposto pelos sucessivos governos do PS e do PSD que geram crescentes obstáculos a que as mulheres e os casais determinem em liberdade o momento e o número de filhos que desejam ter.  

 

O contínuo desrespeito pelas leis laborais, nomeadamente dos direitos de maternidade e paternidade das trabalhadoras e trabalhadores, e a desresponsabilização total do Estado no seu papel fiscalizador, contribui para que também este seja um fundamento para a decisão de ter ou não ter filhos.

 

A continuidade da precariedade laboral e contínua redução de direitos, da discriminação salarial das mulheres, da desigual distribuição do trabalho doméstico, a inexistência de uma rede pública de equipamentos sociais de apoio à infância e juventude, de qualidade e a preços acessíveis, bem como a continua degradação do poder de compra dos trabalhadores decorrente de uma injusta distribuição da riqueza, particularmente patente nos salários de miséria praticados em Portugal, exclui milhares de famílias de poderem livremente optar pela maternidade e paternidade, face aos constrangimentos económicos que poderão por em causa a própria subsistência dessas famílias.

 

As trabalhadoras continuam a ser penalizadas em função da gravidez e do apoio à família.

 

Uma realidade que tenderá a agravar-se com as medidas em curso pelo Governo do PS na área laboral. O ataque à contratação colectiva, a imposição dos despedimentos sem justa causa e a eliminação dos limites diários dos horários de trabalho, num quadro de forte precariedade laboral e do uso dos contratos individuais de trabalho que permitem a desresponsabilização das entidades patronais para com a renovação das gerações representando um sério recuo no direito a ser mãe e trabalhadora com direitos.

 

A degradação contínua das condições de vida tem responsáveis - as políticas de direita que vão destruindo o Estado e as suas funções sociais: as famílias têm cada vez menores rendimentos, o acesso à saúde e ao ensino e a equipamentos sociais (creches e jardins de infância) são cada vez mais privilégios atribuídos a uma pequena elite endinheirada, o aumento do custo de vida é insuportável para uma grande maioria da população portuguesa.

 

A ruptura com uma divisão do trabalho que confinava as mulheres ao trabalho doméstico e aos filhos e os homens à actividade profissional não é acompanhada pela ruptura que socialmente atribui às mulheres responsabilidades especiais na maternidade e no apoio aos filhos e à vida familiar. Também sobre os pais se exercem pressões, por parte das entidades patronais no sentido de não usufruírem dos seus direitos, como o gozo da licença por nascimento ou até mesmo em substituição da mãe.

 

Não será por acaso que, de acordo com as estatísticas da Segurança Social, no ano de 2006, para 73 386 mães que gozaram a licença por maternidade, apenas 42 894 pais gozaram da licença por nascimento (5 dias) e apenas 438 beneficiaram da atribuição do subsídio de paternidade.

 

Todos estes elementos estão na origem dos crescentes condicionamentos da livre decisão dos trabalhadores quanto ao momento e ao número de filhos. Uma análise responsável sobre a realidade social e o impacto quase predatório das medidas legislativas do Governo PS em matéria de Segurança Social, trabalho, saúde e educação, dá-nos a fundamentação clara dos motivos do decréscimo da natalidade e fecundidade, consequências incontornáveis da actual situação sócio económica dos portugueses.

 

3 - Vem agora o Governo PS propagandear o apoio à natalidade, com medidas de reduzido alcance e eficácia social, porque aplicáveis a um número reduzido de famílias, sem contudo dar os passos de compromisso que significariam uma verdadeira aposta na natalidade, dando condições e garantindo o direito a uma vida digna a todas as famílias portuguesas e uma verdadeira aposta no respeito pela função social da maternidade e paternidade no âmbito da segurança social pública.

 

E exemplo paradigmático é, precisamente, a licença de maternidade-paternidade.

 

A Lei n.º 35/2004 de 29 de Julho que veio regulamentar o Código do Trabalho, consagra a possibilidade de os trabalhadores poderem optar por uma licença de maternidade, paternidade ou de adopção alargada de 150 dias. Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 77/2005, de 13 de Abril, que veio regulamentar o exercício da licença alargada, muitos dos trabalhadores e trabalhadoras portuguesas nunca puderam optar por gozar os cinco meses de licença, não por não quererem ou por não considerem importante estarem com os seus filhos, mas sim pelo facto de não poderem suportar as consequências económicas desta "opção".

 

Este diploma consegue afirmar e valorizar a importância da protecção na maternidade e paternidade como valor social, e ao mesmo tempo passados alguns parágrafos, retirar um mês de rendimento no cômputo dos cinco meses de licença. Pela mão do PSD e CDS, à data no Governo, dividiu-se o rendimento de quatro meses por cinco e assim, à custa dos trabalhadores, anunciar esta medida de protecção e valorização da maternidade e paternidade - mais tempo, a expensas únicas dos trabalhadores.

 

Medida que o PS, que se diz tão preocupado com a natalidade, confirmou tendo recusado, no pedido de Apreciação Parlamentar que o PCP fez a este diploma, a proposta do pagamento a 100% do subsídio de maternidade em caso de licença por 150 dias. Este direito ficou assim dependente da capacidade financeira das famílias introduzindo um factor de discriminação em função da classe social no âmbito da segurança social pública.

 

Tal como afirmámos, em sessão plenária da Assembleia da República, a 27 de Maio de 2005, aquando do pedido de apreciação parlamentar relativo ao subsídio de maternidade, "o que o anterior Governo fez, foi dividir o rendimento de quatro meses por cinco, e assim, à custa dos trabalhadores, anunciar esta medida de protecção e valorização da maternidade e paternidade rodeada da mais profunda hipocrisia uma vez que não garante o efectivo exercício desse direito. Com este Decreto - Lei, o que o anterior Governo queria era dissuadir o exercício deste direito, uma vez que o magro orçamento familiar da grande maioria dos trabalhadores os vai impedir de "optar" por uma licença de maternidade, paternidade ou adopção de 150 dias.

 

Com vista à adopção das medidas de protecção da função social da maternidade e paternidade no âmbito da segurança social o PCP apresenta uma iniciativa legislativa que visa atribuir o subsídio de maternidade e paternidade a 100% em caso de licença de 150 dias eliminando uma grave injustiça entre trabalhadores do sector privado e igualmente da Administração Pública. 

 

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte Projecto de Lei:                        

Artigo 1º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 77/2005, de 13 de Abril

 

Os artigos 1º do Decreto-Lei n.º 77/2005, de 13 de Abril passam a ter a seguinte redacção:

 

"Artigo 1º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 154/88, de 29 de Abril

Os artigos 9.º e 14.º do Decreto-Lei n.º 154/88, de 29 de Abril, na redacção que lhe foi dada pelos Decretos-Leis nos 333/95, de 23 de Dezembro, 347/98, de 9 de Novembro, e 77/2000, de 9 de Maio, passam a ter a seguinte redacção:

 

«Artigo 9.º

Montante dos subsídios de maternidade, de paternidade e por adopção

1 - ...

2 - Nas situações em que o beneficiário optar pela modalidade de licença prevista no n.º 1 do artigo 68.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, o montante diário dos subsídios de maternidade e de paternidade é igual a 100% da remuneração de referência.

 

Artigo 14.º

Período de concessão dos subsídios de maternidade, de paternidade e por adopção

1 - ...

2 - Nas situações de licença por maternidade e paternidade ao abrigo dos nos 1 e 3 do artigo 68.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, o período de concessão dos subsídios corresponde ao tempo de duração das respectivas licenças não remuneradas.»

 

Artigo 2.º
Efeitos da licença por maternidade na Administração Pública

1 - ...

2 - Os trabalhadores que efectuem a opção prevista no n.º 1 do artigo 68.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, têm direito a 100% da remuneração por inteiro referida na primeira parte do número anterior."

 

Artigo 2º
Entrada em vigor

 

A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.

 

 

 

Assembleia da República, em 12 de Fevereiro de 2008

 

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