Projecto de Lei

Projecto de Lei n.º 333/X - Estatuto dos Jornalistas

Altera o Estatuto dos Jornalistas reforçando a protecção legal dos direitos de autor e do sigilo das fontes de informação

 

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Como é do conhecimento geral, com a apresentação de uma Proposta de Lei do XVII Governo Constitucional encontra-se aberto um processo legislativo visando alterar o Estatuto dos Jornalistas aprovado pela Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro.

O PCP tem uma posição globalmente negativa acerca dessa Proposta de Lei, já publicamente explicitada, e compartilha preocupações já manifestadas por diversas entidades que se pronunciaram sobre essa iniciativa legislativa, e designadamente pelo Sindicato dos Jornalistas enquanto entidade representativa dos trabalhadores cujo Estatuto se pretende alterar.

Aliás, à apresentação dessa iniciativa seguiu-se o anúncio da intenção governamental, já concretizada na Proposta de Orçamento do Estado para 2007, de extinguir a Caixa dos Jornalistas, privando esta classe profissional de um importante direito à protecção na doença adquirido há décadas.

A Proposta de Lei de alteração ao Estatuto dos Jornalistas aparece assim como mais uma peça - porventura a mais relevante - de uma ofensiva global contra os direitos dos jornalistas visando degradar ainda mais as condições já extremamente fragilizadas em que esses profissionais exercem a sua actividade.

O Grupo Parlamentar do PCP assumirá as suas posições acerca da Proposta de Lei do Governo, quer globalmente, quando tiver lugar a sua apreciação na generalidade, quer ponto por ponto, em sede de especialidade.

Não é por isso propósito do Grupo Parlamentar do PCP, com a apresentação da presente iniciativa, responder globalmente à Proposta do Governo ou substituir integralmente o Estatuto dos Jornalistas em vigor.

O presente Projecto de Lei visa tão somente contribuir com propostas concretas para duas matérias muito relevantes que estão em discussão: A protecção dos direitos de autor dos jornalistas contra a reutilização abusiva dos seus trabalhos e a protecção do direito ao sigilo sobre as fontes de informação.

No primeiro caso, trata-se de responder a uma tendência que tem vindo a impor-se no sector da comunicação social, de, em nome da evolução tecnológica, tornar o trabalho jornalístico numa espécie de "produto branco" que as empresas proprietárias de uma miríade de órgãos de comunicação social utilizam no âmbito do respectivo grupo empresarial quando e onde entendam, sendo o jornalista privado de qualquer protecção quanto à autoria dos seus trabalhos e de qualquer compensação remuneratória pela sua reutilização. Nesta, como em outras matérias, pretende-se que a adaptação às novas condições do "mercado" ditadas pela inovação tecnológica, seja feita exclusivamente à custa dos direitos dos trabalhadores.

Quanto à questão da protecção legal do direito ao sigilo sobre as fontes de informação, importa ter em consideração o carácter fundamental dessa protecção como verdadeira pedra de toque da liberdade de imprensa. Não haverá jornalismo de investigação nem haverá verdadeiramente liberdade de imprensa no dia em que os jornalistas vivam sob o receio de ter de revelar as suas fontes de informação. A relativização deste valor em contraposição com outros, ainda que obviamente estimáveis, a que procede a Proposta de Lei do Governo, não se afigura suficientemente protectora desse direito ao sigilo.

Assim, o Grupo Parlamentar do PCP propõe que seja retomada no Estatuto dos Jornalistas a formulação adoptada na Lei n.º 62/79, de 20 de Setembro, que regulou precisamente essa matéria.

Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

 

Artigo 1.º
Alteração à Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro

Os Artigos 7.º e 11.º da Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 7.º

(...)

1 - (...)

2 - (...)

3 - Os jornalistas têm o direito à protecção dos textos, imagens, sons ou desenhos resultantes do exercício da liberdade de expressão e criação, quer sejam produzidos para uma empresa jornalística no âmbito de um contrato de trabalho quer sejam fornecidos no âmbito de um contrato de prestação de serviços.

4 - Estão abrangidos pelo regime de protecção previsto no número anterior os trabalhos originais e de arquivo, na posse de empresas para as quais foram originalmente realizados ou que estas tenham obtido por efeitos de aquisição de estabelecimentos ou espólio de terceiros.

 

Artigo 11.º

(...)

1 - Os jornalistas têm o direito de recusar a revelação das suas fontes de informação, não podendo o seu silêncio sofrer qualquer sanção directa ou indirecta.

2 - Os directores e as empresas de comunicação social não poderão revelar tais fontes quando delas tiverem conhecimento, salvo consentimento expresso do interessado.

3 - (eliminado)

4 - (eliminado)»

 

Artigo 2.º

Aditamento à Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro

São aditados os seguintes artigos à Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro:

«Artigo 7.º - A

Regime de Protecção

O regime de protecção sobre os trabalhos jornalísticos implica:

a) A autorização prévia de qualquer utilização das criações fora do órgão de comunicação social para que foram produzidas e da respectiva edição electrónica;

b) A integridade da obra, não podendo esta ser alterada sem a autorização expressa do seu autor;

c) A assinatura da obra;

d) A faculdade de o jornalista impedir que um trabalho seu arquivado e entretanto desactualizado seja divulgado dentro ou fora do órgão de informação para o qual foi elaborado, sempre que a sua divulgação diferida ou em contexto diferente possa induzir uma interpretação diversa da intenção inicial do seu autor e com risco para a sua honra e reputação profissional;

e) A possibilidade de o jornalista se opor a que um texto jornalístico possa ser utilizado num suporte que não tenha a natureza de órgão de comunicação social nos termos legais;

f) O direito a uma retribuição pela reutilização das obras fora do órgão a que originalmente foram destinados, e da respectiva edição electrónica.»

Artigo 7.º - B

Extensão da protecção

Consideram-se obras protegidas nos termos previstos no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos e na presente lei, as criações intelectuais dos jornalistas por qualquer modo exteriorizadas, designadamente os artigos, entrevistas ou reportagens que não se limitem à divulgação de notícias do dia ou ao relato de acontecimentos diversos com o carácter de simples informações e que traduzam a sua capacidade individual de composição e expressão.

Artigo 7.º - C

Retribuição adicional

A retribuição adicional, devida pelas reutilizações das obras que tenham sido autorizadas nos termos no Artigo anterior, deve ser estabelecida em sede de contrato de trabalho ou de prestação de serviços

Artigo 7.º - D

Informação prévia

A intenção de reutilização de obras jornalísticas deve ser comunicada previamente ao autor para que este possa exercer o regime de protecção previsto no Artigo 7.º A.

Artigo 7.º - E

Direito à reutilização

1 - O direito de autor sobre as respectivas criações confere aos jornalistas o direito a reutilizá-los fora do órgão de informação para o qual foram produzidas, designadamente sob a forma de livro ou antologia audio, vídeo ou suporte digital, bem como em exposições ou outros eventos.

2 - Para efeitos do número anterior, os autores de imagens impressas ou televisivas, desenhos ou sons têm direito a obter gratuitamente das empresas cópias de qualidade profissional.

Artigo 7.º - F

Cláusulas nulas

1 - São proibidas as cláusulas contratuais que, directa ou indirectamente, disponham sobre o conteúdo dos direitos morais do autor, designadamente as que:

a) Excluam ou limitem o direito de o jornalista assinar ou fazer identificar as obras da sua autoria, qualquer que seja o modo da sua comunicação ao público;

b) Confiram à entidade para a qual os trabalhos são produzidos, ou a terceiros, a faculdade de alterar a estrutura ou o sentido da obra protegida, ou de introduzir quaisquer modificações que a desvirtuem ou possam afectar o bom nome e reputação do autor.

2 - São igualmente proibidas as cláusulas contratuais que:

a) Estabeleçam indiscriminadamente as formas e respectivas condições de utilização, tanto de tempo como de lugar e de preço, das obras jornalísticas protegidas pelo direito de autor ou incluam modos de exploração não conhecidos na altura da celebração do contrato;

b) Visem obter o consentimento do autor para utilizações em órgãos de comunicação social indeterminados, ainda que detidos, total ou parcialmente, por empresas participadas ou que integrem o mesmo grupo económico daquelas especificamente identificadas no contrato como beneficiárias das obras protegidas pelo direito de autor;

c) Visem obter o consentimento do autor para a comunicação ao público das obras protegidas em qualquer suporte, incluindo digital, que não esteja especificamente previsto no contrato;

d) Consagrem a disposição antecipada do direito de autor sobre as obras que este vier a produzir por um período superior a dois anos, ou excluam a possibilidade de revisão das cláusulas relativas ao direito de autor findo esse prazo;

e) Excluam o direito a uma remuneração especial, para além da convencionada, e independentemente da sua publicação, sempre que a criação intelectual exceda claramente o desempenho, ainda que zeloso, da função que ao autor estava confiada, ou quando da obra se retirem vantagens não previstas na fixação da remuneração acordada;

f) Excluam o direito à obtenção de urna compensação suplementar, a incidir sobre os resultados da exploração, sempre que se verifique existir grave lesão patrimonial por manifesta desproporção entre os proventos do autor e os lucros obtidos pelas entidades beneficiárias da transmissão, originária ou derivada, do direito de exploração sobre a obra protegida.

Artigo 7.º - G

Regime sancionatório

À violação dos direitos de autor previstos na presente Lei é aplicável o regime sancionatório estabelecido no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos a infracções de natureza idêntica.»

 

Assembleia da República, em 15 de Dezembro de 2006

 

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