Projecto de Lei

Projecto de Lei N.º 330/X - Tarifas e preços de venda de electricidade a clientes finais

Limita os aumentos das tarifas e preços de venda de electricidade a clientes finais

Para pesquisar a situação: clique aqui

 

 

Constituindo a energia, um factor de produção cada vez mais estratégico, particularmente nas sociedades industrializadas, sendo a electricidade, entre as diversas formas de energia final correntemente utilizadas, aquela que apresenta um cada vez maior protagonismo, e tendo em atenção, designadamente, os graves problemas associados ao meio ambiente e à evolução dos preços e previsível escassez dos combustíveis fósseis - particularmente petróleo e gás natural - dever-se-ão tomar todo um conjunto de medidas, que vão desde o planeamento, aos investimentos, à gestão integrada dos meios, às relações entre manutenção e fiabilidade, entre outras, que nos permitam optimizar a utilização da electricidade.

A electricidade está actualmente presente em todos os aspectos da vida das sociedades - na indústria transformadora, nos transportes sobre carris, nos serviços, na agricultura e no quotidiano das pessoas e das famílias.

Pelo seu carácter estratégico, a produção, transporte, distribuição e comercialização de electricidade, assumem claramente um papel de notório interesse público, portanto muito pouco compaginável com pressões bolsistas e egoístas interesses privados

A disponibilidade da electricidade nas melhores condições técnicas, e o seu custo, jogam nos dias de hoje um papel muito importante na competitividade das economias.

Mesmo sem os anunciados aumentos, o preço da electricidade em Portugal, são mais elevados do que em vários países da União Europeia, como por exemplo o caso de Espanha, o que coloca graves problemas de competitividade às nossas empresas, particularmente às industriais.

Embora conscientes de que é necessário prosseguir o tarefa de aumento da eficiência do sistema eléctrico, seja na produção seja no transporte, seja no consumo, o preço da electricidade é uma variável que deve continuar a merecer uma muito especial atenção.

Também relativamente às famílias não é aceitável admitir os anunciados aumentos.

O brutal aumento anunciado dos preços da electricidade, é-nos apresentado como uma fatalidade, e, como tal tem de ser aceite e pago pelos consumidores, sejam eles as empresas, particularmente as industriais, sejam os particulares.

Julgamos que assim não tem que ser. A sua origem decorre de um conjunto de vícios genéticos do sistema de formação de preços, que urge explicar, desmontar, atenuar e nalguns casos mesmo eliminar, que a economia do país e a bolsa dos cidadãos não podem continuar a suportar.

E não se trata de camuflar o problema com um sempre crescente défice tarifário. Embora sob o ponto de vista contabilístico tal défice constitua um proveito não recebido dos operadores das redes de transporte e de distribuição, e estando portanto contabilisticamente imputado como dívida de clientes, ele é, em última instância, titulado pelo Estado e portanto suportado a prazo por todos nós.

Acerca dos vícios genéticos, eles são de dois tipos: vícios conjunturais e vícios estruturais.

Relativamente aos vícios conjunturais, temos dominantemente o nível dos resultados, apresentados pelas empresas produtoras EDP, Tejo Energia e Turbogás.

 Sem obviamente, colocar em causa a legitimidade e mesmo a necessidade destas empresas apresentarem resultados positivos, o que é sinónimo de boa saúde económica, a questão nacional que se coloca é a dos excessivos e mesmo fabulosos lucros que tais empresas têm vindo a apresentar, particularmente nos últimos anos, aliás de depressão e estagnação económica.

Só a EDP, teve resultados consolidados acumulados nos últimos quatro anos (2002 a 2005), no espantoso valor de 2227 milhões de euros.

No que concerne aos vícios estruturais, que incorporam de forma indexada a fórmula de cálculo do custo final, temos:

- A remuneração da produção vinculada no âmbito dos CAE (contratos de aquisição de energia)

- O excesso de produção térmica

- O preço da electricidade produzida por co-geração

- O preço da electricidade produzida por via eólica

Observemos cada uma delas com algum detalhe:

Relativamente ao preço do Mwh pago pela REN no quadro dos CAE, ela protege excessivamente as empresas produtoras, gerando sempre, independentemente dos outros factores, margens porventura excessivamente elevadas.

Excesso de produção térmica: um dos argumentos para o aumento do preço da electricidade e portanto do défice tarifário, relaciona-se com o aumento do preço dos combustíveis fósseis. Assim é de facto.

Contudo, ninguém questiona a nossa estrutura básica de produção de electricidade, relativamente aos papéis relativos protagonizados pela produção hidroeléctrica e pela produção térmica.

A conjugação da não concretização pela EDP, nos últimos 10 anos, particularmente após o início da privatização da empresa, de grandes aproveitamentos hidroeléctricos, ao mesmo tempo que se construía e se autorizava a construção de mais e mais centrais térmicas de ciclo combinado, a gás natural, constitui um verdadeiro crime contra a economia nacional. Crime com consequências sobre o já brutal défice energético nos prejuízos ambientais, na necessidade de aquisição de mais quotas de CO2, no aumento da nossa dependência face ao exterior e obviamente também, sobre o preço do KWh.

Tudo isto ocorre, ao mesmo tempo que Portugal tem por aproveitar, em grandes aproveitamentos hidroeléctricos, ainda com a vantagem de serem praticamente todos do tipo albufeira, portanto com maior imunidade às variações de hidraulicidade, pelo menos  7 TWh de recursos hídricos.

Isto é, só estes recursos podem substituir em ano médio cerca de 1/3 da produção térmica vinculada.

E com o aproveitamento do potencial ainda não explorado e uma gestão integrada entre a produção hidroeléctrica e a produção eólica, este valor pode ser claramente ampliado.

No que respeita à co-geração, processo de aproveitamento energético, cuja bondade intrínseca está ligada à produção de calor nas indústrias de processo, e que tem sido nos últimos anos, completamente subvertido, transformando-se em muitas situações num negócio autónomo de muitas empresas, em que as centrais de co-geração se estão a transformar em verdadeiras centrais térmicas, dado o preço pago pelo KWh de 0,107 euros, ser quase o dobro do valor  médio de aquisição ao abrigo dos CAE. 

Pelas suas repercussões esta questão terá de ser revista.

Relativamente aos aproveitamentos eólicos, cujo interesse e necessidade objectiva para o país não é possível questionar, face às enormes potencialidades existentes e à potência já instalada ou em curso de instalação, devemos contudo ter em consideração que o seu período de incubação e arranque já passou há muito, pelo que é inaceitável, que em Portugal, o valor do MWh seja pago a cerca de 90 euros, enquanto em vários países da EU da dimensão de Portugal, tal MWh seja subsidiado até ao valor de 50 euros.

Embora saibamos que existem contratos assinados, com períodos de vigência de 15 anos terão de ser encontradas soluções e compromissos neste domínio, dada a insustentabilidade da actual situação.

Se estes vícios que apresentámos, começarem a ser resolvidos, de forma segura e continuada, poderemos começar a ter uma electricidade mais barata e uma economia mais competitiva.

Por todas estas razões, nos termos constitucionais e regimentais, o grupo Parlamentar do PCP, apresenta o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º
Objecto e âmbito de aplicação

A presente Lei limita os aumentos das tarifas e preços de venda de electricidade a clientes finais a serem aplicadas pelo comercializador de último recurso (regulado) em conformidade com a alínea b) do nº 3 do Artigo 49º do DL 29/2006, de 15 de Fevereiro.

Artigo 2.º
Limitação do aumento das tarifas

O valor global resultante da aplicação das tarifas e preços, a que se refere o nº anterior, a clientes finais em qualquer nível de tensão, não pode, em cada ano, ter aumentos superiores à taxa de inflação esperada para esse ano.

Artigo 3.º
Correcção dos desequilíbrios energéticos

 

O Governo apresentará à Assembleia da República, no prazo de 6 meses, um Plano de Correcção dos Desequilíbrios Energéticos com medidas concretas visando, designadamente:

a) A revisão das margens dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE), corrigindo as margens excessivas, preservando a saúde financeira das empresas;

b) A retoma do investimento em projectos hidroeléctricos de forma a minorar os custos e a dependência das centrais térmicas;

c) A correcção dos mecanismos de apoio à co-geração, reconduzindo-os aos seus objectivos iniciais de reaproveitamento e uso racional dos recursos energéticos;

d) A progressiva transição dos apoios à energia eólica para um quadro de preços adequado à crescente dimensão e estabilização do sector.

Artigo 4.º
Entrada em vigor

A presente Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

 

Assembleia da República, em 12 de Dezembro de 2006

 

 

  • Assembleia da República
  • Projectos de Lei