Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

Programa do governo - PSD/CDS estreiam-se com roubo no subsidio de Natal

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O Programa de Governo PSD/CDS apresentado, hoje, na Assembleia da República, traduz um grave ataque aos trabalhadores e ao povo português, as medidas que contem são uma sujeição ao programa assinado pelo PS, PSD e CDS com a troika, querendo ir ainda mais longe anunciando já um roubo no subsidio de natal.

Apresentação do Programa do XIX Governo Constitucional

Sr.ª Presidente,
Em primeiro lugar, dirijo-lhe uma saudação, formulando votos sinceros de êxito na responsabilidade que lhe foi atribuída e que, com certeza, cumprirá num quadro de isenção e de imparcialidade na presidência desta Assembleia da República.
Sr. Primeiro-Ministro, desejo saúde para si e para os seus. Obviamente, este voto não é extensível ao êxito das medidas que são contra os trabalhadores, contra o povo e contra o País e que estão contidas no Programa de Governo.
Lendo o Programa e descontando o cinismo e alguma propaganda, que há sempre nestas coisas, de
alguns anúncios sobre crescimento económico e emprego, e com a necessária avaliação das medidas e iniciativas próprias do Governo, o que releva é a sua sujeição ao programa assumido pelo PS, pelo PSD e pelo CDS-PP com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional.
Este Programa de Governo não é de mudança, mas de agravamento continuado das políticas executadas por sucessivos governos que fizeram o País chegar a este estado em que se encontra, e que apenas quer surpreender, porque tem mais pressa e quer ir mais fundo na imposição e
aumento dos sacrifícios a quem hoje já é sacrificado e na entrega do património do País aos grandes
interesses.
Surpreendeu, sim! É que ou eu estava distraído ou não ouvi, durante a campanha eleitoral, nem ao CDSPP nem ao PSD, por exemplo, que, caso fossem governo, iriam cortar metade do subsídio de Natal.
Dissessem-no e, se calhar, o resultado teria sido diferente.
A propósito de austeridade e sacrifício, coloco-lhe uma primeira pergunta, Sr. Primeiro-Ministro.
«Sacrifício» é uma palavra com conteúdo concreto, que pressupõe perda dolorosa, vida mais difícil. É claro no Programa que os trabalhadores vão ser mais sacrificados nos seus rendimentos de trabalho, no seu 13.º mês, nos seus direitos; que as novas gerações vão ser sacrificadas e fustigadas pela precariedade; que os reformados e os pensionistas vão sofrer rudes golpes nas suas pensões com o aumento do custo de vida, do preço dos medicamentos, das taxas moderadoras; que os desempregados, os doentes, os idosos, as pessoas com deficiência vão ficar ainda mais desprotegidos. O Sr. Primeiro-Ministro anunciou apoios. Curiosamente, quantificou tão bem a questão do 13.º mês e não quantificou esse tal apoio que aqui anunciou.
O aumento dos impostos vai recair, essencialmente, sobre quem vive dos pequenos rendimentos e, sobretudo, dos rendimentos do trabalho.
Sr. Primeiro-Ministro, é capaz de explicar a quem nos ouve quais vão ser os sacrifícios para quem
concentra a riqueza, para os detentores das grandes fortunas, para os grupos económicos, para o sector financeiro? Ou estes, pelo contrário, ainda vão banquetear-se com as privatizações?
Sem o espalhafato de Durão Barroso, com aquela história do «País de tanga», ou a dramatização de
Sócrates sobre o défice público, o Sr. Primeiro-Ministro, seguindo à risca os seus antecessores — nem aqui foi inovador —, ergue a questão do défice das contas públicas como o problema dos problemas, sacrificando os sectores produtivos, o investimento, o aumento do desemprego, a degradação das funções sociais do Estado na saúde, na educação e na segurança social. Isso foi desastroso no passado, Sr. Primeiro-Ministro!
Como desastroso será agora negar um outro rumo, o rumo do crescimento, ele em si mesmo factor de estabilização das próprias contas públicas e não o contrário, … do desenvolvimento económico e social, do aumento da produção nacional, da criação da riqueza e da sua mais justa distribuição. E não apresente como novo aquilo que é velho: as alterações mutiladoras na legislação laboral, a privatização na área da saúde e da segurança social encerram velhos ajustes de contas da direita económica e política com o que foi avanço social e civilizacional da democracia de Abril.
Coloco-lhe uma última questão, Sr. Primeiro-Ministro.
O Programa do Governo passa «como cão por vinha vindimada» sobre a questão da dívida externa. Sabe, tão bem como eu, que os juros vão ser incomportáveis e impagáveis mais adiante. Não resta por aí, ao menos, um rasgo de brio patriótico que coloque a renegociação da dívida, enquanto é tempo e há condições, mesmo sabendo que existirão sempre dificuldades nesse processo?
O Governo tem a legitimidade institucional para governar. Mas não se iluda, Sr. Primeiro-Ministro: os trabalhadores e o povo português têm uma outra legitimidade, a legitimidade democrática e constitucional para lutar pelos seus direitos, por uma vida melhor contra cada uma de todas as medidas que visem infernizar a sua vida e fazer o País andar para trás.
Não pensem que o povo português está resignado. Pode estar na expectativa, mas quando as medidas recaírem sobre a sua vida, não se iluda, Sr. Primeiro-Ministro, porque eles vão lutar pelos seus interesses e pelos seus direitos.

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