Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Programa de Estabilidade e Crescimento para 2010-2013

Debate do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2010-2013

Sr. Presidente,
Sr. Ministro de Estado e das Finanças,
Sr.as e Srs. Deputados:
O caminho proposto pelo PEC é errado, é irracional e impõe um pesado sacrifício ao País.
É porque as contas públicas devem corrigir-se, sim, mas ao ritmo do crescimento económico e o que o Governo quer fazer é penhorar o crescimento económico em razão de um défice de 3% completamente desajustado à situação do nosso país.
O que é que oferece o PEC do Governo e do PSD aos portugueses? Aos que já sofrem com a política de direita pede mais sacrifícios; aos desempregados dá mais desemprego; aos que precisam das prestações sociais diz-lhes que agora há um «plafonamento» e que, mesmo que a elas tenham direito segundo os critérios, não vão poder a elas ter acesso; aos que já têm baixos salários oferece o congelamento desses salários!
À recessão e estagnação da economia oferece mais recessão, mais estagnação e a continuação da divergência com a União Europeia. Este PEC, a ser aplicado, deixará o País, em 2013, numa situação ainda pior do que está hoje, em 2010! E esta é que é a razão da nossa profunda oposição!!
Diz muitas vezes o Sr. Ministro que é preciso um consenso... Hoje vimos um título de um jornal dizendo: «Banqueiros apelam ao consenso». Bem se compreende que os banqueiros queiram um consenso à volta do PEC e que o PSD tenha dado o consenso necessário para que ele singre como se tivesse sido aprovado, coisa que não será. É porque há uma oportunidade para eles de manterem a injusta taxação fiscal que o Governo lhes oferece, para continuarem a beneficiar de apoios públicos como beneficiaram nos últimos anos, quando a dívida pública (para apoiar os bancos) não era um problema.
Só é um problema para o subsídio de desemprego, para as prestações sociais e para os trabalhos. Para estes, sem dúvida, há uma oportunidade.
Sr. Ministro, se quer sacrifícios para corrigir as contas públicas, vá pedi-los a quem fez a crise, vá pedi-los a quem lucrou com a crise!
Vá pedi-los à banca; vá pedi-los às empresas energéticas, que penalizam a nossa economia e os consumidores; vá pedi-los aos grupos económicos, que esmagam as pequenas empresas e tornam pior a vida dos trabalhadores do País!! Não vá pedi-los a quem continua a sofrer com esta política de direita!
Este PEC não acaba hoje! Começa hoje e há-de ser derrotado pelo povo trabalhador!
(…)
Sr. Presidente,
Estamos a aproximar-nos do fim de um dos mais importantes debates desta Legislatura, a que o Sr. Primeiro-Ministro não quis comparecer, um debate em que o Sr. Ministro das Finanças diz que quem contesta o PEC à esquerda defende a política orçamental sem critério...!
Não, Sr. Ministro, nós temos é um critério diferente do vosso! O nosso critério não é deixar sempre a banca sem a taxação que é justa; não é penalizar sempre os mesmos, enquanto os mais ricos deixam de pagar aquilo que devem para uma sociedade mais equilibrada. Esse é o vosso critério! Foi o critério que aplicaram todos estes anos, antes da crise internacional e durante a crise internacional, e que querem continuar a aplicar depois da crise internacional!
Não é uma política sem critério que queremos; é uma política com um critério justo, uma política com um critério que defenda os interesses de todos e não apenas os interesses de um punhado de privilegiados, que continuam a ser os destinatários da vossa política.
Diz o Sr. Ministro que somos contra as regras do euro e do Pacto de Estabilidade. Pois somos! Somos nós e muitos economistas, até da área do Partido Socialista, que reconhecem que estas regras do Pacto de Estabilidade são desastrosas para uma economia como a nossa e para o nosso desenvolvimento.
Também somos contra as privatizações, em que o Governo vai vender ao desbarato empresas essenciais para o nosso desenvolvimento, para a nossa soberania até — e de tal maneira que até o CDS chega a ter dúvidas e se assusta com a extensão do programa de privatizações que os senhores aqui apresentam!
É um PEC, Sr. Ministro das Finanças (já que o Sr. Primeiro-Ministro não está cá!), que promete mais desemprego e, ao mesmo tempo, se propõe cortar no subsídio de desemprego; e, ao mesmo tempo, propõe alterações ao subsídio de desemprego que significam obrigar à baixa gradual dos salários no nosso mercado de trabalho.
É um PEC, Sr. Ministro, que propõe e anuncia mais pobreza, mas, ao mesmo tempo, propõe o corte nas prestações sociais, o corte nas reformas, o corte naquelas prestações que são essenciais para aqueles que são mais pobres.
Diz o Sr. Ministro que vai apenas repor o nível de percentagem do PIB destas despesas sociais para o nível antes da crise. Olhe, Sr. Ministro das Finanças, havia um primeiro-ministro que dizia que as pessoas não são números e eu digo-lhe que também não são percentagens do PIB!
E, onde o senhor vê percentagens do PIB, nós vemos pessoas que precisam de apoio — de apoio social, de subsídio de desemprego e de melhores reformas — e que não são uma percentagem das suas contas para entregar a Bruxelas. São desempregados, são idosos, são pobres, são pessoas que precisam do apoio do Estado!!
O Sr. Ministro das Finanças e o Governo adiam a tributação das mais-valias. Aliás, não há qualquer novidade no PEC nessa matéria, pois do Programa do Governo já constava a tributação das mais-valias, já houve dois Orçamentos do Estado e mais dois Orçamentos rectificativos e nunca cá apareceu a proposta do Governo para a tributação das mais-valias de mais longo prazo. Nunca cá apareceu e duvidamos que venha a aparecer!…
O que o Governo propõe com este PEC é renegar a justa tributação da banca, mas, por outro lado, congelar os salários e aumentar a carga fiscal para os rendimentos do trabalho — e para todos, com a questão das deduções específicas! E o PS e o PSD vão ser cúmplices na viabilização desta política contida na resolução que o PS aqui apresenta.
O PSD procura um esforço de demarcação — bem percebi que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite «acusou o toque» da vontade dos banqueiros em relação ao apoio a este Programa de Estabilidade e Crescimento... É porque, Sr.ª Deputada, o seu partido é o «seguro de vida» da continuação da política de direita e por isso é que, daqui a pouco, vai abster-se na votação do projecto de resolução.
O PSD faz o que é preciso para que continue a política de direita. E o CDS não faz, porque, desta vez, não é preciso — porque se fosse preciso, também fazia o mesmo para continuar a política de direita!
E dizem-nos, Sr. Ministro e Srs. Deputados, que não há outro caminho. Dizem-nos, há décadas, que não há outro caminho, que tem de ser este. Pois a situação em que o País está — os tais resultados, Sr.ª Deputada! — só nos demonstra que este caminho é que não serve, que a única certeza que temos, neste País, é que o caminho da política de direita não serve!!
E para os que pensam que este PEC, que hoje aqui se discute, é o fim da linha das decisões que pretendem tomar, desenganem-se! É porque hoje começa aqui, e continuará no futuro, a luta contra este Programa de Estabilidade e Crescimento, contra cada uma das suas medidas negativas, contra cada uma das suas políticas sociais!
E cá estaremos nessa luta, porque ela é indispensável para que o nosso País tenha, finalmente, uma política de desenvolvimento e não uma política de retrocesso, como a que os senhores propõem.

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