Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Procede à primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, reforçando o controlo e prevenção das incompatibilidades, impedimentos e conflitos de interesses dos agentes e dirigentes dos Serviços de Informação da República Portuguesa

(projeto de lei n.º 181/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Quero fazer algumas observações relativamente a este projeto de lei do Partido Socialista, sendo a primeira para exprimir concordância relativamente à proposta de que os indigitados para diretores do SIS e do SIED possam ser ouvidos em audição parlamentar e não apenas o Secretário-Geral do SIRP.
Passo a enunciar três críticas a este projeto de lei, sendo a primeira relativa à possibilidade, que se admite, de que entidades privadas possam solicitar informações aos serviços de informações — ao SIS e ao SIED — através do membro do Governo respetivo.
Ora, não nos parece que os serviços de informações possam funcionar como agências, às quais entidades privadas possam recorrer para obter informações, já que, para isso, há aí umas empresas de informações comerciais. Os serviços de informações do Estado não servem para que as entidades privadas possam pedir ao Estado informações sobre matérias, ainda por cima, em segredo de Estado, porque os privados não podem ter acesso a isso e, portanto, vemos esta possibilidade como absolutamente absurda.
Não estamos a ver que a lei possa permitir que entidades privadas façam pedidos ao Governo, tais como: «peçam aí umas informações ao SIED ou ao SIS, porque isto é útil para a nossa atividade». Isso é impossível, Srs. Deputados, porque é contraditório com o estatuto constitucional e legal dos serviços de informações.
A segunda crítica prende-se com o registo de interesses. Ora, em princípio, o que é proposto não tem nada a ver com o registo de interesses como ele é normalmente entendido, uma vez que o registo de interesses é um instrumento destinado a garantir a transparência pública relativamente ao exercício de funções. Ora, não é isso que se pretende — era o que faltava que, relativamente a agentes de serviços de informações, fizessem um registo de interesses público, porque, a ser esse o caso, todos ficariam a saber quem eram os agentes dos serviços de informações.
Mas o que também nos parece absurdo é o seguinte: trata-se de um registo de interesses que fica no serviço. Mas, pergunto eu, quando alguém é recrutado para os serviços de informações, não se sabe nada dessa pessoa? Ou seja, é depois de ter sido admitida que essa pessoa vai fazer um registo de interesses e, que, depois, o Secretário-Geral vai dizer «ó diabo, não devíamos ter admitido este homem, porque ele tem aqui umas atividades que são incompatíveis com o exercício destas funções». Vai dizer isso depois de essa pessoa já lá estar a trabalhar?!
Obviamente que, a haver registos formais, no mínimo teriam de ser de candidatura. Mas depois de lá estar é que nunca se iria fazer um registo de informações onde constasse que «afinal, havia aqui umas incompatibilidades que não declarei antes de ser admitido, porque assim não me admitiam».
Não me parece, pois, manifestamente, que este registo de interesses faça sentido.
A minha terceira crítica — e, com isto, termino, Sr. Presidente — diz respeito ao aspeto do período de nojo.
Vemos, com simpatia, que se encontre uma solução para isto, para que não haja promiscuidade entre o exercício de funções, este tipo de informações e atividades privadas. Mas há reparos a fazer a este regime que é aqui proposto.
Em primeiro lugar, não podem ser excluídas todas as funções privadas. Imaginemos uma pessoa que sai do exercício de funções e vai dedicar-se à agricultura, porque tem umas hortas na sua terra. Creio que não faz sentido algum que o Estado impeça o exercício de todas e quaisquer atividades privadas, ainda que elas não tenham rigorosamente nada a ver com esse exercício de funções. Dir-me-ão: «há aqui uma possibilidade excecional de autorização». Mas coloca-se aqui um outro problema, que é o seguinte: propõe-se, para quem saia dos serviços, em qualquer circunstância, como não pode ir trabalhar para o setor privado, que o Estado arranje uma bolsa de lugares públicos, onde essa pessoa permanecerá, durante três anos, enquanto não puder ir trabalhar para o setor privado. E eu pergunto: e se essa pessoa tiver saído dos serviços por incumprimento culposo dos seus deveres? Ou seja, se uma pessoa for despedida «por indecente e má figura» — como se costuma dizer —, o Estado vai garantir-lhe o emprego na mesma categoria, durante três anos, em quaisquer circunstâncias?! Do nosso ponto de vista, isto não faz sentido, ou seja, tem que se encontrar, neste ponto, uma outra solução.
O Estado não pode premiar alguém que seja afastado do serviço por violação dos seus deveres e, portanto, tem de se encontrar, neste ponto, outra solução para o período de nojo.

O Sr. António Filipe (PCP): — Pode ser que, em sede de especialidade, se encontre uma outra solução. Consideramos que a ideia deve ser desenvolvida, mas não nos parece que esta solução, como prevista, seja muito curial.
Aplausos do PCP.

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