Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Procede à alteração do Código Penal

(proposta de lei n.º 75/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
O PCP avoca, hoje, para Plenário a discussão de alguns artigos que consideramos que devem merecer uma última reflexão por parte da Assembleia da República pela gravidade das soluções que alguns deles comportam e pela possibilidade de aperfeiçoar redações que foram aprovadas em sede de especialidade e que, apesar de não constituírem problemas graves, deviam merecer uma última consideração na redação que está proposta.
Começo pelo último grupo que respeita às alterações propostas quanto à suspensão dos prazos de prescrição e ao crime de falsas declarações — alterações, estas, previstas para o Código Penal —, porque julgamos que, sendo problemas que existem de facto, que devem merecer atenção por parte da Assembleia da República, bem como uma alteração na forma como estão hoje previstas ou não, no caso das falsas declarações, no Código Penal, as redações que estão propostas levantam dúvidas e problemas. Dúvidas que, em alguns casos, são de importância mais relevante, nomeadamente em relação aos prazos de suspensão de prescrição, que podem até suscitar problemas de constitucionalidade, como já aqui foi referido. Em relação às falsas declarações, avocámos esses artigos, porque o que está proposto é que se retome uma norma de 1944, que foi retirada do nosso ordenamento jurídico, porque não era aplicada pelos nossos tribunais, uma vez que a sua redação era de tal forma ampla e inexata que os nossos tribunais reconheceram que não era possível a sua aplicação.
Ora, o PCP apresentou soluções que permitem ultrapassar estas dificuldades e trazemo-las hoje a discussão.
De igual modo, em relação à questão dos pequenos furtos, entendemos que não se justifica que os nossos tribunais continuem a empregar recursos, tempo e disponibilidade do sistema judicial para dar uma resposta penal a questões que não devem ter uma resposta penal mas, sim, uma resposta do ponto de vista social. Entendemos, pois, que a solução para esse problema não pode ser o encarecimento do acesso à justiça exigindo acusações particulares, exigindo constituição como assistente para evitar o recurso à justiça. Essa solução não é a correta. Entendemos que ela deve ser, sim, adotada do ponto de vista processual penal para evitar que estas situações possam ser sujeitas a julgamento e para que possa, nomeadamente, haver a possibilidade de suspensão provisória do processo.
Há, no entanto, questões mais graves em relação às quais gostávamos de deixar uma última possibilidade de elas serem devidamente ponderadas. Essas questões têm que ver, em primeiro lugar, com uma tentativa de resposta penal à contestação social de que o Governo vai sendo alvo, nomeadamente por alteração ao crime de resistência e coação sobre funcionário, com a qual esta maioria pretende responder, do ponto de vista penal, à contestação social de que o Governo vai sendo alvo. Não é admissível este tipo de soluções! Não é admissível este tipo de opções políticas!
Por fim, no que tem que ver com as declarações dos arguidos e das testemunhas prestadas em fase anterior à audiência de julgamento e com a utilização do processo sumário para crimes mais graves, entendemos, Sr.as e Srs. Deputados, que estas soluções comprometem aspetos estruturantes do nosso Código de Processo Penal, não têm qualquer justificação, quer do ponto de vista académico, quer do ponto de vista doutrinal e muito menos do ponto de vista da eficácia do sistema penal português.
Julgamos que há uma última possibilidade de reverter aquilo que esta maioria pretende impor, que pode significar uma verdadeira desestruturação de princípios fundamentais do nosso processo penal.

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