Comunicado do Grupo de Trabalho do PCP para as Questões das Toxicodependências e do Narcotráfico

Prevenção da Toxicodependência - Adiamentos não são toleráveis

O continuado agravamento da situação da toxicodependência em Portugal e o desperdiçar ou adiar de oportunidades recentes na Assembleia da República para levar mais longe o combate a este flagelo colocaram ao PCP a necessidade de alertar a opinião pública e de salientar medidas que contribuam para a adopção de uma política efectiva de prevenção da toxicodependência e combate ao tráfico de drogas.

1. No nosso país o número de toxicodependentes aumenta, com especialistas a estimá-lo muito acima dos 100 mil. A sida a hepatite e as mortes por causas ligadas à droga atingem números alarmantes. O tráfico expande-se, são sintetizadas e colocadas no mercado novas drogas, publicitadas como inofensivas, mas de facto perigosas, muitas das quais portadoras de mecanismos mais rápidos e mais sofisticados de dependência. Cresce a criminalidade associada à toxicodependência e as prisões enchem-se de toxicodependentes que constituem mais de 2/3 dos 13 mil reclusos existentes em Portugal.

O brutal agravamento deste flagelo no nosso país, que provoca crescentes preocupações nos portugueses, é indissociável de uma política global promovida pelo PSD e agora prosseguida pelo PS que acentua as fragilidades que conduzem à toxicodependência. Paralelamente a não tomada de medidas ao nível da dimensão dos problemas, associou ao drama da dependência, a angústia de milhares de famílias pela falta de apoios, pela exploração de que são vítimas por parte de instituições privadas em consequência da carência de estruturas públicas para o atendimento, o tratamento e a reinserção social.

2. Oito meses passados com o Governo PS mantém-se às claras o funcionamento dos grandes hipermercados da droga: Casal Ventoso, Pedreira dos Húngaros e tantos outros. Mantém-se, e sem perspectivas de alteração a falta de resposta às necessidades de tratamento e reinserção social.

A esse respeito não pode deixar de ser salientada a insuficiência das medidas anunciadas em recente reunião do Conselho de Ministros.

De facto, apesar dos repetidos anúncios de que a droga seria combatida como sendo o "inimigo nº 1" do actual Governo, a verdade é que se mantém uma linha de absoluta continuidade em relação ao que vinha sendo feito pelo Governo PSD e que os actuais membros do Governo tanto criticaram no passado recente. Em particular a continuidade de orientações e políticas, tendo já o discurso da preocupação e da necessidade de mudança de há pouco, dado subitamente lugar ao discurso da auto-satisfação injustificada do Governo em relação à sua política.

Tal como o PSD fez por duas vezes, o Governo PS insiste em reformular o Projecto Vida, apostando afinal, tal como o PSD, em apresentar novas versões sobre novas versões e em substituir a insuficiência manifesta de acção real por uma forte presença mediática.

A revisão da lei da droga que acaba de ser aprovada, reforçou alguns mecanismos de combate ao tráfico de droga (que no caso do chamado "agente infiltrado" comportam alguns perigos para os quais o PCP alertou), agravou o regime penal aplicável aos casos mais graves de tráfico de droga e, por proposta do PCP:

— consagrou a gratuitidade do tratamento de toxicodependentes através dos serviços do Ministério da Saúde;

— consagrou a urgência no atendimento dos toxicodependentes com processos em curso ou com penas suspensas;

— consagrou a articulação entre os serviços de saúde e os serviços prisionais no cumprimento do dever de assegurar o tratamento de toxicodependentes em prisão preventiva ou em cumprimento de penas de prisão;

— consagrou o dever do Governo apresentar à Assembleia da República, até 31 de Março de cada ano, um Relatório anual sobre a situação do país em matéria de toxicodependência.

Ao contrário do PSD e do PP, que centraram a sua intervenção sobre a revisão da lei da droga na reivindicação demagógica de agravamentos indiscriminados de penas, o PCP, reforçando a penalização do tráfico, consciente de que o objectivo visado com a penalização do consumo de drogas consiste precisamente em evitá-lo e de que para isso é indispensável encaminhar os toxicodependentes para soluções de tratamento, propôs a não sujeição dos simples consumidores a penas de prisão, prevendo formas alternativas de reacção penal (multa substituível por trabalho a favor da comunidade) sempre substituíveis por soluções de tratamento voluntário. Tais propostas foram rejeitadas pelo PS, PSD e CDS/PP.

Assim, a revisão da lei da droga recentemente aprovada na Assembleia da República, contendo aspectos inegavelmente positivos, alguns dos quais por proposta do PCP, foi, globalmente considerada, uma oportunidade desperdiçada para levar mais longe este combate e não substitui a necessidade de levar à prática políticas globais e coerentes de combate à droga, que alterem as causas mais profundas da toxicodependência e que articulem devidamente as vertentes de prevenção do consumo e de repressão do tráfico de drogas.

3. Tendo consciência das dificuldades de um combate eficaz à toxicodependência no quadro das formas de organização da sociedade e das políticas dominantes, o PCP entende que há muito a fazer para diminuir a dimensão do problema da toxicodependência e não tem sobre isso uma visão partidarizada, pois considera necessário, possível e indispensável unir diversificados esforços e vontades, no caminho de uma nova política para fazer face a este flagelo.

No quadro das ideias que têm sido avançadas pelo PCP e pela JCP e de entre as medidas que considera indispensáveis e urgentes para enfrentar o flagelo da toxicodependência, o grupo de trabalho do PCP para as questões da toxicodependência e narcotráfico, salienta:

— a necessidade de se concluir com urgência o processo de discussão e aprovação final do Projecto de Lei do PCP, já aprovado na generalidade, que cria uma rede pública para o atendimento, tratamento e reinserção social, por forma a garantir que todos os toxicodependentes que procurem tratamento, independentemente da região onde residam, tenham acesso rápido e gratuito, quer a centros de atendimento, quer a comunidades terapêuticas ou a unidades de internamento, quer ainda a casas de saída e a soluções de reinserção sócio-laboral. Assim, o PCP propõe:

- a rápida concretização do objectivo de, numa primeira fase, disponibilizar 1 000 camas em comunidades terapêuticas públicas, sem prejuízo do carácter supletivo das instituições privadas de qualidade reconhecida e devidamente autorizadas e fiscalizadas;

- criação urgente de Centros de Atendimento de Toxicodependentes em todos os distritos do país que ainda não dispõem de equipamentos desta natureza e a criação de novos CAT nas regiões do país mais afectadas por problemas de toxicodependência, onde os Centros existentes se encontram em clara situação de ruptura, ou a uma distância que dificulta o acompanhamento;

— a indispensabilidade de, na elaboração do Orçamento de Estado para 1997 se considerar, expressamente e sem subterfúgios, a dotação das verbas indispensáveis à concretização destes objectivos;

— face à atitude incompreensível do PS, PSD e PP de recusar a proposta do PCP de — mantendo a reprovação legal do consumo de drogas — não sujeitar os simples consumidores a penas de prisão, que em vez de os afastarem da droga podem contribuir para os envolver ainda mais no consumo e afundar na toxicodependência (conhecida a degradação do meio prisional existente), o PCP considerando o toxicodependente como um doente, que precisa de tratamento e não de reclusão, insiste na necessidade e urgência de consagrar legalmente as medidas alternativas à prisão que, com tanta insensibilidade foram recusadas.

— No âmbito das medidas de combate ao tráfico, a necessidade de reforçar os meios técnicos e de agir com efectiva vontade política contra o branqueamento de capitais.

O PCP considera que perante a situação existente e o quotidiano com que somos confrontados, pode e deve reflectir-se sobre o caminho mais adequado a seguir, mas não se pode ser insensível e acima de tudo não se pode adiar uma acção de prevenção e combate decidida e coerente à toxicodependência e ao tráfico de drogas, para cuja concretização é precisa uma cada vez maior mobilização do povo português

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