Declaração política, trazendo à colação a precariedade laboral dos trabalhadores Portugueses
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
A precariedade laboral é uma praga social que atinge hoje cerca de 1 452 600 trabalhadores, sobretudo jovens e mulheres.
Não são números! São demasiados «Antónios» e «Marias», que vivem com a angústia de conhecer novamente o desemprego; que não sabem quando e se terão direito ao domingo na folga semanal; que não sabem se vão receber sempre a dia certo; que não sabem se terão perspectiva de valorização do seu trabalho e progressão na carreira. São também enfermeiros, professores, psicólogos e outros, que escondem habilitações académicas para ter um ganha-pão.
São pessoas disponíveis para quase tudo, para em troca receberem uma mão cheia de quase nada.
A política laboral dês te Governo e dos seus antecessores representa um retrocesso civilizacional, que agrava a exploração e fragiliza os direitos dos trabalhadores, enquanto reforça o poder dos grandes grupos económicos e do patronato. A defesa mistificada da precariedade, primeiro, pelo governo PSD/CDS-PP e, depois, pelo anterior governo PS, foi erguida contra o direito ao trabalho consagrado na Constituição da República Portuguesa. Aproveitando preceitos da legislação laboral e a sua violação, à boleia da fragilidade da
inspecção do trabalho e da ineficácia da justiça laboral, a precariedade de excepção passou a regra, de caso isolado passou a uma quase inevitabilidade.
Para o PCP, a precariedade não é uma dimensão «pós-moderna e global» da nossa economia! A precariedade representa formas de exploração seculares, que urge erradicar, como já foi
erradicado o trabalho infantil. Portugal é o terceiro país da União Europeia com maior nível de precariedade - são um em cada três os jovens que, face à precariedade do seu vínculo laboral, só conhecem a precariedade da vida: obstáculos à sua autonomia e independência, insegurança laboral e pessoal.
Por tudo isto, é urgente garantir que a um posto de trabalho permanente corresponda um vínculo efectivo.
Mas, perante esta praga social, o que apresenta o Governo PS? Um «pacto para o emprego», que
corresponde a um manifesto à precariedade escamoteada, que não defende direitos para os que não os têm, mas que retira, sim, direitos àqueles que têm alguns. Pretende acabar com os recibos verdes na Administração Pública, não para integrar estes trabalhadores no quadro mas para os despedir, como fez a mais de 56 000, ou para os transformar em empresários em nome individual - nome eufemístico de precário.
É o próprio Estado que mantém mão-de-obra qualificada a recibos verdes - veja-se na Autoridade para as Condições do Trabalho e no Instituto Tecnológico e Nuclear! Promove o trabalho temporário, permitindo que muitos centros de emprego funcionem hoje como entrepostos das empresas de trabalho temporário.
Na primeira semana de Novembro, os trabalhadores de fiscalização de uma empresa de transporte ferroviário conquistaram, com a sua luta, a integração efectiva na empresa sem passar pela incerteza de três anos renovados anualmente. Foi uma vitória da luta dos trabalhadores, mas foi também uma vitória da democracia portuguesa, que deve animar todos aqueles que lutam pelo direito ao emprego - e ao emprego com direitos!
É urgente promover a estabilidade do emprego, cumprindo e fazendo cumprir o direito ao trabalho e à segurança no emprego, assegurando vínculos de trabalho estáveis e combatendo todas as formas de precariedade.
Por isso, o PCP defende: a revogação da norma do Código do Trabalho que discrimina os jovens e outros trabalhadores à procura do primeiro emprego; o reforço da fiscalização do cumprimento das normas de trabalho, nomeadamente no uso abusivo e ilegal de contratos a termo, dos falsos recibos verdes e do trabalho temporário, bem como a criminalização do falso recurso aos recibos verdes; o aperfeiçoamento da legislação para que os contratos de trabalho a termo sejam limitados a necessidades efectivamente temporárias de trabalho; e a regularização da situação dos trabalhadores com falsos recibos verdes, nomeadamente na Administração Pública.
Dando voz às concretas aspirações dos trabalhadores, denunciamos ainda a situação dos trabalhadores de um estaleiro de reparação naval, em Setúbal, onde muitos dormem em contentores e outros chegam do Bairro da Bela Vista e da Quinta da Princesa para jogar a sua sorte às 7 horas da manhã, numa praça de jorna do século XXI: dos cerca de 2000 trabalhadores desta empresa, apenas 200 têm um vínculo efectivo - tal como nos anos 30, da Grande Depressão, quando os patrões apenas escolhiam os mais fortes para trabalhar, tal
como nas fábricas de indústria conserveira, onde só havia trabalho quando tocava a sirene...!
São condições de trabalho desumanas e indignas próprias do século XIX que o Partido Socialista, pelo Código do Trabalho de Vieira da Silva, retomou e que, pelo Pacto para o Emprego da nova Ministra, pretende aprofundar, intrometendo-se abusivamente no direito dos trabalhadores à contratação colectiva para impor a adaptabilidade e a desregulamentação dos horários de trabalho, assumindo já, na esteira do Livro Verde, a introdução da «flexigurança à portuguesa».
São estes e tantos outros exemplos que dão mais força às nossas propostas e que colocam como questão inadiável a urgente erradicação da precariedade laboral.
Os trabalhadores podem contar sempre com o Partido Comunista Português.
(...)
Obrigada, Sr. Presidente.
Relativamente às questões que me foram colocadas, agradeço desde já a simpatia da Sr.ª Deputada do Partido Socialista. No entanto, parece que a simpatia fica pela sua opinião, porque no dia da discussão do Programa do Governo o que aqui tivemos foi mais do mesmo: ouvimos pelas palavras da Sr.ª Ministra que a precariedade vai continuar a ser a antecâmara do desemprego, que o que o Governo tem para contrariar os 8500 estágios profissionais que constam no Programa do Governo é a manutenção da norma no Código do Trabalho que discrimina os jovens à procura do primeiro emprego.
De facto, o que nos preocupa profundamente e julgo que à maior parte dos portugueses é que, só no mês de Setembro, 44% dos processos que deram entrada nos centros de emprego vieram pela não renovação dos contratos.
Portanto, após um dia da divulgação dos números do INE relativos ao desemprego, falar da precariedade é falar de duas dimensões da dignidade humana que têm de ser combatidas.
Relativamente a esta matéria, o PCP tem propostas concretas - não nos ficamos apenas pelas palavras.
Temos políticas que provavelmente vão ser discutidas com os Srs. Deputados e o Governo terá oportunidade de referenciar o que desempenha fazer.
De facto, preocupa-nos que hoje, em 2009, este Governo queira praticar condições de trabalho dignas do século XIX. Estamos no século XXI e entendemos que na base do desenvolvimento da nossa economia não devem estar relações de trabalho degradadas que já marcaram séculos e séculos de exploração. Muito pelo contrário!
O que tem de estar na base do desenvolvimento da nossa economia é o reconhecimento do trabalho, da valorização do trabalho e dos trabalhadores, porque apenas poderá haver
desenvolvimento económico se houver o reconhecimento de um dos direitos mais elementares da dignidade humana que é o direito à segurança no trabalho.
Por parte do PCP não nos ficaremos apenas por esta declaração política, porque certamente teremos muitas oportunidades para levar as nossas propostas à discussão e, de uma vez por todas, erradicar esta praga social que é a precariedade, dando direito ao trabalho e ao trabalho com direitos.