Pouco mais de onze anos depois da entrada em circulação do euro podemos dizer que são cada vez mais aqueles que questionam a permanência do euro como moeda única e que entendem que o crescente endividamento dos Estados da Zona Euro, resulta da sua dependência dos mercados para se financiarem.
À medida que a actual crise económica e financeira, que se arrasta desde 2007, se vai desenrolando e que os desequilíbrios dentro da zona euro se vão acentuando cada vez mais é questionado o projecto da moeda única e o seu futuro.
A nível económico, existe justificação teórica para a criação de uma moeda única para um espaço formado por diversas economias quando esse espaço cumpre as condições de uma zona monetária óptima.
Nessas condições a introdução de uma moeda comum aumenta a eficiência na alocação de recursos e permite às economias que compõem a União Monetária desenvolveram-se em melhores condições do que se mantivessem as respectivas moedas próprias.
No caso da União Europeia pode dizer-se que nenhuma das condições necessárias à criação de uma zona monetária óptima existia quando foi criada a moeda única e sem surpresa, a evolução das economias desde 1999 veio acentuar ainda mais essa realidade.
Hoje, os países da zona euro não só não se aproximaram, como antes pelo contrário formam um espaço económico cada vez mais desigual.
Alguns outros economistas defenderam e continuam a defender que os custos de se criar o euro num espaço que não era à partida, uma zona monetária óptima, existem, sem dúvida, mas que os benefícios da criação da moeda única mais que compensam esses custos.
A principal razão que era apontada para afirmar que os benefícios sobrelevam os custos tem a ver com a suposta protecção que uma moeda como o euro, de peso na esfera mundial, daria ao equilíbrio monetário e financeiro dos países que compõem a união monetária, resguardando-os dos impactes destabilizadores da globalização financeira.
A profunda crise que vivemos actualmente demonstra que tal não tem sucedido.
O euro foi incapaz de assegurar o equilíbrio cambial, monetário e financeiro e mesmo antes desta crise, os altos e baixos da sua cotação face a outras moedas eram disso um claro sinal. Depois da crise, casos como o da Grécia, de Portugal, da Irlanda, da Espanha, da Itália, da Bélgica, da França e agora do Chipre pelo menos, que estão a atravessar uma das fases mais difíceis de desequilíbrio financeiro da sua história recente, demonstram bem a incapacidade do euro e das suas instituições de protegerem o equilíbrio financeiro das diversas economias.
Pode concluir-se aquilo que nós próprios na campanha contra a moeda única no 1º semestre de 1997 tínhamos dito, o projecto da moeda única não tinha qualquer racionalidade económica, era e é um projecto político.
A criação do euro confirmou-se, tal como sempre denunciámos, como parte do projecto estratégico de domínio do grande capital e das principais potências europeias, um instrumento ao serviço da exploração dos trabalhadores e dos povos e do aprofundamento das condições de rendibilidade do capital.
A principal motivação política que esteve na base do projecto da moeda única foi criar um factor suficientemente poderoso para impulsionar a integração política na Europa, sob o domínio dos interesses dos alemães.
A moeda única tem até hoje estado longe de poder ser considerado um projecto bem sucedido.
Nos seus pouco mais de doze anos de existência, o euro não resolveu nenhum problema económico europeu importante, agravou alguns e fez surgir outros.
O crescimento económico na zona euro desacelerou fortemente na última década face à anterior, o desemprego atingiu níveis elevadíssimos em especial entre os jovens, agravaram-se os défices comerciais com o exterior da União por parte das maiores economias europeia (com excepção da Alemanha) e surgiu um problema gravíssimo de sustentabilidade financeira dos Estados do Sul da Europa, que dependentes dos Mercados para se financiarem não só veem os seus níveis de endividamento disparar, como as taxas de juro desses financiamentos atingir valores insustentáveis, com os ritmos de estagnação e recessão económica em que se afundam.
A UEM assumiu-se desde o início como um dos principais instrumentos para uma maior liberalização dos movimentos de capitais e, consequentemente, um maior grau de mobilidade do capital multinacional em busca de melhores condições de exploração da mão-de-obra e domínio dos mercados dentro do espaço europeu.
Perante a situação actual que vivemos na zona euro, com três países a serem objecto de programas de assistência financeira por parte da Troika (Grécia, Irlanda e Portugal) e com outros países sob a ameaça de também eles virem a ser objecto de programas idênticos – casos da Espanha, da Itália e Chipre – sem qualquer perspectiva de se ultrapassar a crise económica e financeira que a zona euro enfrenta, são muitas as perguntas que os europeus e em especial os portugueses fazem hoje.
Com a criação da zona euro prometeram-nos, mais crescimento e mais emprego e o que se viu foi exactamente o contrário, a nossa economia estagnou nos últimos 11 anos, o investimento caiu para níveis inferiores a 1995, o emprego diminuiu em cerca de 563 mil postos de trabalho, o desemprego aproxima-se em termos reais do milhão e meio, os défices orçamentais sucedem-se e endividamento do Estado não para de crescer.
Prometeram-nos estabilidade cambial e o que aconteceu foi que passámos a ter com o euro uma taxa de câmbio que sobrevalorizou 30 a 40% a nossa estrutura produtiva, o que conduziu à destruição do sector produtor de bens transaccionáveis, a que pertence a esmagadora maioria do aparelho produtivo nacional, ao mesmo tempo que o sector produtor de bens não transaccionáveis enriquecia.
Disse-se que com a adesão ao euro deixaria de haver problemas de financiamento e o que aconteceu foi exactamente o contrário, o Estado passou a depender do financiamento dos Mercados e o nosso país corre hoje o risco de ver o financiamento externo cortado e está dependente de um denominado “programa de assistência financeira” e de todo um pacote de medidas draconianas a ele associado. Como se tudo isto não fosse já um cenário de horror avisam-nos de que o ajustamento que está ser feito é para continuar por muitos anos.
A presença do nosso país na zona euro conduziu-nos a uma situação quase insustentável - de estagnação, destruição do aparelho produtivo, desemprego, empobrecimento e crescente endividamento externo – que não é possível manter por muito mais tempo.
Portugal necessita de rapidamente começar a crescer, aumentar a sua competitividade, apostar no aumento da produção nacional, na substituição de importações, no aumento das exportações de grande valor acrescentado, o que só será possível de forma consequente com a desvalorização da nossa moeda. Ora dentro da zona euro isso não é possível, pois se há países como Portugal, Espanha, a Grécia, a Itália e até mesmo a França que têm acumulado défices das suas Balanças de Pagamento e para quem uma desvalorização do euro seria bem vinda, já outros países como a Alemanha, a Áustria, a Holanda e a Finlândia só têm a ganhar com a sua valorização.
Daqui decorre um claro antagonismo entre a permanência no Euro e a necessidade de se criarem condições para que o país cresça e se desenvolva.
A saída do Euro sendo uma condição necessária para a nossa sobrevivência como país independente e soberano, não é no entanto só por si uma condição suficiente par tal.
A saída do euro terá de ser equacionada avaliando e controlando um conjunto de impactos e questões sem dúvida relevantes: por exemplo o nível de desvalorização da nova moeda, o efeito inflacionista daí resultante, a fuga de capitais, a necessidade de nacionalizar o sector bancário, o encarecimento das importações - muitas delas importantes para a nossa economia –, a reclamação junto da União Europeia de um Fundo Financeiro de Apoio que pudesse compensar a desvalorização da nova moeda, a criação de um regime de controlo de circulação de capitais que impeça a sua fuga, a consideração da integração da nova moeda no chamado mecanismo de taxas de câmbio onde permanecem hoje os 10 países integrantes da União Europeia que não fazem parte da zona euro, assegurando-se que a sua taxa de câmbio de referência se situe na banda de flutuação admissível de mais e menos 15% em relação ao euro.
O impacto da saída do euro seria também minimizado se esta saída negociada fosse uma decisão que envolvesse outros países para além do nosso, falamos nomeadamente da Espanha, responsável por cerca de 1/3 das nossas relações comerciais e a França, responsável por pouco mais de 1/10 do nosso comércio externo.
Como diz a última resolução do Congresso do PCP, o povo português tem o direito inalienável a decidir o seu destino, promovendo linhas de acção convergentes com outros países da EU vítimas também de processos de especulação e ingerência no sentido da luta pela dissolução da UEM e à adopção de medidas que preparem o país face a qualquer reconfiguração da zona Euro – nomeadamente as que resultem da saída de Portugal de euro, seja por decisão própria ou desenvolvimento da crise da EU – salvaguardando os interesses dos trabalhadores e do povo português, vítimas de décadas de políticas e decisões contrárias às suas justas aspirações e direitos.