Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral do PCP, Comício «Faz das injustiças força para lutar»

O povo não precisa de alternância, está farto que tudo mude para que tudo fique na mesma

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Uma calorosa saudação a todos vós.

A todos os que agem, que lutam pela mudança e por uma vida melhor, com uma determinação extraordinária num tempo em que se procura impor a alternância para deixar tudo como está ou mesmo acelerar a política de direita, aqui estão, aqui estamos, a construir com o nosso povo a alternativa que se impõe.

O povo e os trabalhadores não precisam de alternância, estão fartos que tudo mude para que tudo fique na mesma.

Não precisamos de alternância entre aqueles que, decibéis acima ou decibéis abaixo, a única coisa de que discordam é o ritmo e a velocidade com que impõem a política de saque, de sacrifícios para a maioria, ao mesmo tempo que protegem os interesses e os lucros de uma pequeníssima minoria.

Não precisamos de alternância para a exploração, precariedade, baixos salários, horários desregulados ou mais ataques à contratação colectiva e aos direitos laborais.

O problema que enfrentamos não é de ritmo mas sim de caminho, não precisamos de alternância entre aqueles que dizem que o melhor é ir privatizando e os que dizem que o melhor é privatizar já e tudo, de alternância dos que juntos ou à vez  prosseguem o caminho de desinvestimento e desmantelamento dos serviços públicos.

O que precisamos é de uma alternativa e de uma política que seja definida em função dos interesses e direitos do povo, ao serviço de nós todos, da maioria, dos que criamos riqueza mas que não vemos resultados do trabalho que executamos, uma política ao nosso serviço, ao serviço dos trabalhadores, dos reformados, dos pequenos e médios empresários e agricultores, dos jovens.

Há uma diferença abismal entre uma política ao serviço de uma minoria em nome da maioria, e a política da maioria que responda às necessidades da maioria.

É esta a grande diferença entre a alternância e a alternativa.

A primeira coloca-se ao serviço de uma minoria, a segunda responde aos interesses e necessidades da maioria, desde logo porque é por si definida.

O que a maioria, o que o povo precisa é de progresso social, valorização dos salários, das pensões e das reformas, investimento nos serviços públicos, precisa que se cumpra e faça cumprir a Constituição, precisa que o País produza, precisa de paz e solidariedade, de trabalho, direitos, condições de vida, soberania.

A alternância apenas tem para oferecer isso mesmo, alternância, a mesma coisa com protagonistas diferentes.

Protagonistas diferentes que gritam sobre tudo e todos mas naquilo que é decisivo, naquilo que toca fundo nas opções, lá estão para desempenhar o seu papel, sempre ao lado dos grandes interesses, ao lado do governo de turno.

Nestes últimos tempos temos vindo a ser confrontados com constantes casos e casinhos, trapalhadas e trapalhices. A existência e insistência nestas questões não nos surpreende.

Agora, como sempre, a nossa posição é clara:

Condenamos os procedimentos e práticas que servem os interesses do grande capital e os seus objectivos, denunciamos todos os que se envolvem nesses escândalos e ao mesmo tempo agimos para que os problemas essenciais que atingem os trabalhadores, os reformados, as novas gerações, o País, não sejam escondidos nem desvalorizados.

Isso querem aqueles que destes casos dependem para fingirem que são real oposição ao Governo.

Fingem porque na realidade convergem na política de direita e, no essencial, com o rumo que tem vindo a ser seguido por este governo de maioria absoluta do PS.

Há dúvidas?

Esta semana voltámos a apresentar a proposta de controlo de preços do cabaz alimentar. Em Novembro, PS, PSD, IL e Chega juntaram-se para rejeitar esta proposta. Ontem voltaram a fazer o mesmo que em Novembro do ano passado, votaram contra a fixação de preços dos bens essenciais.

Mas não votaram só contra isso, ao fazê-lo votaram a favor da continuação da especulação dos preços e dos escandalosos lucros das grandes empresas, em particular da grande distribuição. Foi isto que fizeram, foi por isto que optaram. Ao lado dos grandes interesses, ao lado de uma minoria e contra a maioria dos trabalhadores e do nosso povo.

Lá veio a ideia do IVA zero para os bens de primeira necessidade, medida aparentemente positiva mas, camaradas e amigos, temos a experiência vivida nos combustíveis, do que significou a descida de impostos.

Veja-se em que meses as margens de lucros das gasolineiras subiram mais, exactamente nos meses em que baixaram os impostos sobre os combustíveis.

Por mais voltas que se dê, por mais gritaria que se faça, o problema maior que enfrentamos, não são os impostos, mas sim a especulação que nos rói até ao tutano.

O caminho que se impõe, o caminho que é do interesse da maioria, é o da fixação e o do controlo de preços, não é a decisão que alegra os milhões de euros de lucros que Pingo Doce e Continente, entre outros, arrecadam, mas é a única decisão que alivia a carga de quem trabalha.

Mais uma vez a nossa proposta foi chumbada, mas continua a ser justa e necessária e vamos, mas é que vamos mesmo, com a luta e a intervenção, mais cedo ou mais tarde, concretizá-la.

Há poucos dias ficámos a saber que a Navigator vai receber 40% do apoio total dado a indústrias electro-intensivas para compensar a subida dos preços da electricidade no mercado grossista ibérico.

Mais dez milhões de euros que saem dos nossos bolsos em subsídios para esta empresa, que vai ainda receber 18 milhões do PRR.

Os mesmos partidos da política de direita que se recusam a fixar preços máximos para a electricidade dos consumidores domésticos, são os mesmos que inventam mecanismos como estes para beneficiar estas empresas.

É que estamos perante uma empresa que aumentou em 151% de lucros e que se propôs a actualizar salários em 0,9%.

Mas já que falamos de lucros, o que não faltam são casos de grupos económicos que estão a lucrar à grande com a situação actual.

Sobre este escândalo o que se faz? Propaganda e aparentes boas intenções.

Veja-se a taxação de lucros extraordinários do Governo. Tímida e insuficiente na taxação, prevê  benefícios fiscais e outros apoios para compensar os grupos económicos. Tal como afirmámos, a montanha pariu um rato.

Gritaria, avisos e outras coisas que tais e no fim… pouco mais que zero, tudo com a conivência dos mesmos do costume, assim como o fizeram sobre as portagens.

Há que lhes sublinhar a coerência, sempre que toca os interesses dos grandes grupos económicos, alinham sempre pelo mesmo diapasão.

Perante o maior aumento nos últimos 20 anos no preço das portagens, o Governo vem falar em “esforço tripartido” – utilizadores, Estado e concessionárias – mas vendo bem os verdadeiros e únicos beneficiários desta decisão são os grupos económicos que detêm as concessões. Arrecadam para lá dos 1,4 mil milhões que sugam, anualmente, mais 140 milhões que o governo achou por bem entregar como forma de compensação.

É só encher à custa do povo.

E sobre o Plano Ferroviário Nacional? Linha do Vale do Vouga, anúncios muitos, concretização, datas e prazos para avançar e concluir a obra, nada. O que temos certo e seguro é que foi a luta das populações que travou a intenção de sucessivos governos, desde o PS ao PSD, de encerrar a Linha. Discursos sobre a importância da ferrovia não faltam mas o que é objectivo é que a ligação Sernada - Viseu foi encerrada e transformada numa ciclovia! 
O que é objectivo é que a ligação de Oliveira de Azeméis a Sernada, está encerrada desde 2015. O que é real e objectivo é que os estudantes do concelho de Oliveira de Azeméis, que estudam na Universidade de Aveiro, não têm transporte público adequado para as suas deslocações.

Mas acima de tudo, o que faz falta às populações é a linha do Vale do Vouga. O que as pessoas precisam é de composições dignas e confortáveis, um serviço com horários, estações e apeadeiros adequados, um serviço com tempos de percurso razoáveis!
Estamos a cerca de 40 Km do Porto, pouco mais de meia-hora por estrada. Mas, usando o Vouguinha, são 50 minutos só até Espinho, temos que mudar de estação, 7 minutos de caminhada, e apanhar outro comboio para o Porto.

É possível que isto assim continue? É este o plano que nos apregoam de modernidade?

E o que dizer da saúde?

Discursos muitos, mas na pratica procura-se esvaziar os serviços e concentrar os recursos e sobrecarregar os hospitais de Aveiro e Santa Maria da Feira. Há falta de pessoal, há. Então que se dêem condições ao pessoal médico para que se fixe no Serviço Nacional de Saúde, que sejam valorizados e respeitados.

Se há falta de pessoal, de médicos ou de assistentes operacionais, que leva ao encerramento de centros de saúde, é porque o Governo insiste no caminho de desmantelamento do serviço público e reforça os meios dos grupos económicos que lucram com o negócio da doença.

O caso do centro de saúde de Maceda, em Ovar, é paradigmático.

Construído de raiz com dinheiro dos munícipes,  quase meio milhão de euros, para ser encerrado pouco tempo depois. E ali está, construído, pronto a usar, mas sem pessoal médico.

E se este é um caso paradigmático, está longe de ser único.

Urge reverter esta situação, e da nossa parte continuaremos a animar a luta das populações e a bater-nos pela aprovação das nossas propostas, no sentido de investir, reforçar e valorizar o Serviço Nacional de Saúde.

Que não pense o PS que por ter maioria absoluta, e que por poder contar sempre com o apoio da direita naquilo que é essencial, está à vontade para praticar a sua política.

Não estamos condenados à alternância. A alternativa existe, é preciso dar-lhe corpo.

Da nossa parte, podem contar com o mais firme combate à política de direita, venha ela de onde vier. Com a cara levantada de quem tem uma história e uma acção que falam por si, de quem está, em todos os momentos, incluindo nos mais difíceis, ao lado do povo, a lutar por ele.

E é mesmo de luta que falamos. Luta que se desenvolve em múltiplas frentes.

Luta dos trabalhadores, que justamente pretendem melhores condições laborais, aumentos salariais, horários regulados, contratos efectivos.

Luta dos reformados, que tal como a restante população e de forma particular sentem a perda de poder de compra, o aumento do custo de vida, e o autêntico roubo nas suas pensões.

Luta dos estudantes por uma educação pública, gratuita e de qualidade e pela exigência do acesso para quem pretende continuar os seus estudos.

A luta das populações contra o aumento do custo de vida que também hoje teve expressão em vários pontos do País.

Luta dos professores, que têm razões de sobra para a sua justa indignação.

Luta das mulheres, dos jovens, dos utentes dos mais variados serviços públicos, de todos quantos anseiam por uma vida melhor.

Luta que terá destaque no próximo dia 9 de Fevereiro, no Dia Nacional de Indignação, Protesto e Luta convocado pela CGTP-IN.

Podemos ter os discursos mais belos, as propostas mais bem feitas, o programa mais claro.

A alternativa não vai surgir porque a realidade e a vida nos dá razão. A alternativa não vai surgir porque as pessoas simplesmente já não suportam mais a política de direita. A alternativa vai surgir porque a construímos.

Porque com confiança, com determinação, com paciência, com persistência, não viramos a cara à luta, não tememos qualquer confrontação, qualquer comentário, qualquer preconceito que sobre nós possam ter.

Mais do que não temer, queremos ouvir todos.

Queremos saber o que nos separa para nos concentrarmos naquilo que nos une, nos nossos objectivos comuns, no muito que temos para caminhar lado a lado no sentido do progresso social.

Vamos então com confiança para o contacto, para a conversa e talvez, sejamos surpreendidos com o quão próximos estamos daquele amigo, familiar, vizinho, estudante, reformado, utente, trabalhador.

Todos são precisos, todos aqueles que não se conformam com o actual estado de coisas. Todos aqueles que não se conformam com a injustiça. Todos aqueles que acreditam que é possível um mundo melhor, os que já chegaram a essa conclusão e os muitos que, não acreditando agora que tal é possível, perceberão, mais cedo que tarde, que essa mudança está ao alcance de um colectivo unido, forte e organizado.

De uma coisa todos podem estar certos, por muita coisa que nos separe: não haverá ponta de progresso social que não contará com o activo empenho do PCP.