Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP, Almoço comemorativo do 90º aniversário do PCP e do 94º aniversário da Revolução de Outubro

É possível um caminho novo de esperança para Portugal

É possível um caminho novo de esperança para Portugal

Áudio

Unimos nesta magnífica iniciativa dois acontecimentos que são de um enorme significado para os comunistas portugueses: um, de impacto e projecção mundial e de incomensuráveis reflexos no desenvolvimento da luta dos trabalhadores e dos povos e suas conquistas – a Revolução de Outubro que aqui comemoramos o seu 94º. Aniversário; outro, de uma dimensão mais nacional, mas de extraordinária importância para a vida e luta dos trabalhadores portugueses e do nosso povo – a criação do Partido Comunista Português, cujas comemorações dos 90 anos da sua existência, encerramos hoje, aqui, no Porto.

Uma comemoração conjunta que faz todo sentido, porque se somos um Partido que é criação do movimento operário português, do seu amadurecimento e evolução que passou a colocar como sua tarefa uma decisiva intervenção de transformação da sociedade, somos igualmente o resultado do efeito galvanizador da Revolução de Outubro de 1917 da sua influência e impacto e, por isso, ela é parte integrante da identidade revolucionária do PCP de que muito nos orgulhamos.

Desse notável acontecimento que abriu caminho para a construção de uma sociedade nova, portadora de um projecto de eliminação de todas as forças de exploração e opressão social e nacional, em que pela que pela primeira vez em milénios de sociedade humana, o sonho e a utopia se transformaram em projecto político e empreendimento concreto de edificação de uma sociedade sem classes sociais antagónicas, liberta da exploração do homem por outro homem e onde milhões de seres humanos outrora excluídos e espoliados de qualquer intervenção política e social se tornaram protagonistas e obreiros do seu próprio futuro.

Dessa primeira revolução socialista vitoriosa que marcou com profundíssimos sulcos a marcha do século XX e se projecta na actualidade como fonte inesgotável de inspiração revolucionária.

Dessa realização pioneira em que pela primeira vez a classe operária e seus aliados – campesinato e outras camadas exploradas – conquistaram o poder e reestruturaram a sociedade em função do interesse dos trabalhadores e da esmagadora maioria do povo.

A consagração do trabalho com direitos e livre da exploração, o fim da discriminação e a promoção e efectivação da igualdade entre mulheres e homens, o direito à saúde, o ensino e a cultura transformados em desígnio revolucionário e condição de liberdade e de progresso, a nacionalização da terra e sectores estratégicos, constituiriam a base e os alicerces mobilizadores para responder à questão de que não basta conquistar o poder, é preciso exercê-lo e defendê-lo, confiando na força e nas forças determinantes: os trabalhadores e o povo.

As transformações e realizações revolucionárias, a sua força de exemplo permitiram que noutros países se alcançassem importantes conquistas sociais, a construção do denominado Estado Social em países capitalistas desenvolvidos, onde as classes dominantes receavam novas revoluções sociais.

A Revolução de Outubro não foi apenas mais um extraordinário acto de heroísmo e libertação que fizeram avançar a sociedade. A Revolução de Outubro correspondeu a uma exigência do desenvolvimento social e marcou o início de uma nova época histórica – a passagem do capitalismo ao socialismo científico que Marx e Engels fundaram e que Lénine desenvolveu.

A Revolução de Outubro tem características próprias resultantes da sua história, da cultura, da realidade sócio-económica e política da sociedade russa, mas o que marcou o acto e o processo revolucionário de Outubro foi, e é, o seu carácter universal.

Daí a extraordinária influência que as realizações e a activas políticas de paz e de solidariedade internacionalista da URSS exerceram no desenvolvimento mundial: as já referenciadas conquistas dos trabalhadores dos outros países capitalistas; a contribuição decisiva na derrota do nazi-fascismo; a derrocada dos impérios coloniais; a expansão do socialismo no mundo; a derrota dos propósitos mais agressivos do imperialismo, tudo isto é inseparável da Revolução de Outubro e do empreendimento de nova sociedade a que deu lugar.

A própria existência da URSS, o seu papel no concerto das nações, a sua política de paz e solidariedade, deram uma contribuição determinante para a criação do clima internacional favorável ao triunfo da Revolução de Abril e travaram planos de uma intervenção de força na vida interna de Portugal.

Realidades que as dramáticas derrotas do socialismo e o desaparecimento da URSS não anulam e que, contra sistemáticas campanhas de falsificação histórica, é necessário não apenas não esquecer mas valorizar, aprendendo com as lições da experiência, nos erros e nos êxitos, retirando ensinamentos para a nossa intervenção na actualidade.

Num quadro actual, profundamente contraditório no plano nacional e internacional, onde convivem ameaças e perigos muito sérios, com exigentes mas reais possibilidades de resistir, lutar e até avançar, para além de celebrar vale a pena continuar a reflectir e tentar compreender a Revolução de Outubro, com tudo o que ela comportou de novo, as dificuldades com que se deparou, o que representou como primeira tentativa histórica, mas simultaneamente procurar situar na longa duração o seu significado e a significação da dolorosa derrota da edificação da sociedade que tinha como objectivo o socialismo e o comunismo.

Vale a pena fazê-lo quando vemos que, com o fim da União Soviética e do campo socialista, o mundo está mais injusto, mais inseguro, menos pacífico e menos democrático.

O sistema capitalista mudou muito nestes anos que nos separam das históricas jornadas de 7 de Novembro, mas a sua natureza exploradora, opressora e agressiva não só não mudou como, perante o desaparecimento da URSS e do campo socialista, passou a assumir traços cada vez mais carregados e perigosos.

Explorando a fundo o brutal desequilíbrio da correlação de forças em seu favor, o imperialismo tem vindo a prosseguir uma violenta contra-ofensiva no plano mundial com o objectivo de reconquistar posições perdidas, liquidar conquistas sociais e avanços democráticos, dominar mercados e recursos, recolonizar o planeta, impor ao mundo uma nova ordem totalitária contra os trabalhadores e contra os povos.

A ideologia dominante e os seus defensores persistem no desfiguramento da Revolução de Outubro para tentar evitar que os trabalhadores e os povos tenham a compreensão e a consciência da natureza predadora e cruel do capitalismo, quando expropria direitos sociais e civilizacionais e quando leva a guerra a várias partes do globo, sempre em nome de mais e mais lucro.

Estamos a assinalar o nonagésimo quarto aniversário da Revolução Socialista de Outubro num momento em que o capitalismo está mergulhado numa das mais profundas crises da sua História. Estamos, como previmos há muito, perante um rápido e violento aprofundamento da crise sistémica e estrutural do capitalismo e com ela o aprofundamento do seu carácter explorador, desumano e destruidor que arrasta milhões e milhões de seres humanos para vida dramática.

Num quadro de evidente declínio das principais potências capitalistas e do agudizar das contradições inter-imperialistas, de profundas alterações em curso na geopolítica mundial, de intensificação da guerra monetária, de enormes perigos de generalização de conflitos militares e de novas aventuras militaristas do imperialismo, as classes dominantes lançam-se numa perigosa e criminosa fuga para a frente face ao aprofundamento da crise. Por isso vivemos tempos que são para todos nós de dura, prolongada, mas também de exaltante luta.

Nesta fase crucial da história surge à escala de massas a consciência das causas sistémicas das desigualdades sociais a apontar o dedo acusatório ao capitalismo, a procurar saídas e soluções.

O mito do capitalismo como fim da história, construído pelas classes dominantes, esfuma-se no horizonte longínquo da irrealidade. Na verdade, não subestimando os seus recursos e capacidade de manobra, o capitalismo mostra que é incapaz de ultrapassar as suas contradições intrínsecas e de dar solução aos problemas da Humanidade.

A contradição entre as imensas potencialidades das conquistas da ciência e da técnica e as terríveis regressões e crise económica e social que percorrem o mundo contemporâneo – desemprego, fome, doença, exploração desenfreada, catástrofes ambientais – constitui, em si mesma, a confirmação de que só o socialismo pode responder às mais profundas aspirações dos trabalhadores e dos povos e salvar a Humanidade da catástrofe anunciada pela insaciável gula do grande capital.

É com a profunda convicção de que o socialismo permanece como uma possibilidade real e alternativa ao capitalismo e a mais sólida perspectiva de evolução da Humanidade que continuamos a nossa luta. Uma luta que gerações de combatentes que vem desde esse longínquo ano de 1921, a data da criação do PCP e que marcou, ela também, o início de uma nova etapa do movimento operário em Portugal.

É esse Partido que se assumiu como um legítimo herdeiro da Revolução de Outubro que também aqui exaltamos, dando por findo o ciclo de iniciativas comemorativas do seu 90º. Aniversário. Esse Partido com uma história de que nos orgulhamos e que atravessou, em actividade ininterrupta, quase todo o século XX até hoje, uma história feita de coragem e dedicação sem limites à causa emancipadora da classe operária e dos trabalhadores, do nosso povo, à causa da liberdade, da democracia, do socialismo e do comunismo, que enfrentou as mais diversas vicissitudes, que foi proibido, perseguido e forçado a actuar na mais severa clandestinidade e objecto da mais violenta repressão fascista, mas que nunca se entregou, nem se rendeu.

Um Partido que cedo se assumiu com a matriz do partido que somos e queremos continuara ser – o partido leninista de novo tipo – enriquecido pela nossa própria experiência e reflexão e que se afirmou na prática como o partido da classe operária e de todos os trabalhadores. Partido da resistência antifascista, da luta pela conquista da liberdade, fundador da democracia portuguesa, obreiro de Abril.

O único grande Partido que fez frente à ofensiva contra as conquistas da revolução de Abril e tem estado na primeira linha de resistência contra a política de direita e de recuperação capitalista, na defesa e aprofundamento da democracia, da soberania e da independência nacionais, na construção da unidade dos trabalhadores e do povo e na elevação da sua consciência social e política.

Nove décadas de uma história notável, uma trajectória de acção, intervenção e luta sem paralelo no panorama partidário português.

Partido do nosso tempo, que se distingue na identidade própria deste concreto Partido Comunista Português: natureza de classe, teoria revolucionária – o marxismo-leninismo –, democracia interna, linha de massas, projecto do socialismo, patriotismo e internacionalismo.

As comemorações do 90º aniversário do PCP, que decorreram por todo o país ao longo deste ano, foram uma afirmação clara e combativa da determinação do colectivo partidário para prosseguir a luta pela liberdade, pela democracia, pelo socialismo, sejam quais forem as circunstâncias que a vida venha a impor. Mas também a expressão de uma inesgotável confiança na luta da classe operária, dos trabalhadores e do povo português.

Neste momento de comemoração todos temos a percepção que vivemos tempos duros e difíceis. Tempos duros e difíceis para os trabalhadores portugueses e para o nosso povo.

Tempos difíceis, pela degradação crescente da vida de largas massas, do elevadíssimo desemprego, de generalizada precariedade das relações de trabalho, da violação dos direitos e da repressão, de quebra de rendimentos de amplas massas trabalhadoras e de outras camadas do nosso povo, com o alargamento das situações de injustiça, de pobreza e de exclusão, de degradação e definhamento dos seus sectores produtivos.

Tempos em que os portugueses, particularmente os trabalhadores, os pensionistas, os intelectuais e quadros técnicos, os pequenos e médios empresários, os agricultores, as camadas populares do nosso povo estão a sentir nas suas vidas o resultado da grave decisão do PS, PSD e CSD de vincular o país a um Pacto de agressão ilegítimo, concertado entre eles e a troika estrangeira do FMI e da União Europeia.

Mas tempos também de luta. Tempos em que os comunistas são chamados a redobrar o esforço e o trabalho para cumprir o seu insubstituível papel ao lado dos trabalhadores e do povo, combatendo a exploração, as injustiças, as desigualdades, dinamizando a resistência e a luta pela resolução dos problemas do País, pela ruptura e a mudança, por uma alternativa de esquerda.

Os portugueses estão hoje em condições de ver quanto acertadas eram as nossas análises sobre as consequências das políticas e decisões dos que nos últimos anos têm governado o país.

Anos e anos a governar, reiterando promessas de solução dos problemas nacionais que nunca resolveram, antes deixaram agravar, de forma continuada, para entregarem o país e a vida dos portugueses à completa dependência do estrangeiro e às mãos da gula do grande capital económico e financeiro e dos seus representantes.

A aplicação de programas de austeridade destes últimos tempos e agora de execução do Pacto de agressão do FMI e União Europeia, com a brutal ofensiva anti-social que transporta não vão, mais uma vez, resolver nenhum dos problemas reais do país, mas conduzir ao seu agravamento numa dimensão ainda mais grave do que a que tínhamos antes da assinatura desse acordo espúrio de agressão e sujeição do país que, PS, PSD e CDS assinaram. Isso está cada vez mais patente na evolução da situação do país.

O governo de Passos e Portas anuncia-se com salvador, mas o que vemos é um país a caminhar a passos cada vez mais largos para uma mais profunda recessão económica, cujo fim não está à vista.

Vemos todos os dias mais emprego destruído, mais empresas a implodir, menos produção nacional, sem que se vislumbre e muito menos garanta a inversão desta situação. Nestes últimos três meses perderam-se quase 40 000 empregos e, em sentido lato, no final do terceiro trimestre tínhamos já ultrapassado o milhão de desempregados no país.

Vemos o semear de crescentes injustiças a um ritmo alucinante que está a degradar de forma acelerada a situação social no país. Vemos o semear da instabilidade e da destruição de vidas de forma impiedosa e brutal.

Vemos dia sim dia sim o Governo, ou a troika quando convém, com o FMI à cabeça, a anunciar medidas atrás de medidas, sempre no mesmo sentido de ataque aos direitos e rendimentos dos trabalhadores, dos reformados, das outras classes e camadas populares.

Vemos um Pacto de agressão transformado num saco sem fundo, de onde se extrai, de acordo com a estratégia do avanço em pequenos passos, novas medidas que antes se esconderam, sempre mais gravosas e com um único objectivo: – pôr o povo a carregar o fardo da crise e aumentar de forma cada vez mais radical a exploração do trabalho.

Há dias tiraram do saco o corte nos descontos dos transportes para os idosos e estudantes. Esta semana mais uma, a pretensão avançada pela troika de alargamento do roubo aos trabalhadores do sector privado do subsídio de Natal e de férias.

Dissemos quando da imposição do corte destes subsídios aos trabalhadores da Administração Pública que o seu objectivo, que o objectivo dos grandes interesses e do Governo é tornar definitivo o corte desse direito e alargar essa medida a todos os trabalhadores.

As declarações desta semana dos representantes do FMI na troika estrangeira, que não são apenas opinião própria, deixam claro que esse é um objectivo do grande capital nacional e estrangeiro e de quem os serve, pesem todas as declarações em contrário. Não lhes bastam as medidas já anteriormente anunciadas de alargamento do horário de trabalho; de eliminação do direito a descanso em dias feriado que se poderão traduzir na destruição de mais postos de trabalho; de redução do pagamento das horas extraordinárias e do trabalho nocturno; de redução do valor das indemnizações e ultrapassando todos os limites do descaramento, o alargamento selvático do conceito de despedimento com justa causa.

Não basta! Querem sempre mais! Querem a lei da selva nas relações de trabalho! É preciso dar a resposta que se impõe a estas pretensões e ameaças, porque é preciso derrotá-las!

É preciso dar-lhe a resposta que merecem, fazendo da Greve Geral do próximo dia 24 de Novembro, uma jornada memorável de luta dos trabalhadores e do povo português. Uma Greve Geral à qual é preciso dar o máximo de força, por que ela é indispensável para ampliar o movimento de contestação e protesto contra esta política e este Pacto de Agressão, e ao objectivo declarado pelo governo do PSD/CDS de conduzir o país ao empobrecimento.

Como temos afirmado a luta dos trabalhadores e do povo e a sua unidade na defesa das conquistas de gerações tornou-se uma tarefa premente. Cada vez mais se impõe unir mais os esforços de todos os trabalhadores. Esforços que precisamos de estender a todos os sectores da sociedade, alargando e dando uma robusta expressão ao movimento de exigência e rejeição do Pacto de agressão.

Uma rejeição que se tornou um imperativo nacional pelo que significa também de abdicação da soberania nacional e de extorsão do país. Só em juros e comissões do empréstimo a que chamam cinicamente ajuda, o país terá que pagar quase metade do seu valor. São 35 mil milhões, que são um roubo ao povo português e que deixam o país sem condições e meios para dar resposta aos problemas do seu desenvolvimento futuro.

Como é possível pagar juros agiotas e garantir ao mesmo tempo o crescimento económico e o emprego que o país precisa, mantendo esta ruinosa política de sistemática destruição da produção nacional que o Pacto de Agressão acentuará ainda mais? Não é possível! Este Pacto, os seus encargos e as medidas que preconiza são de completo afundamento nacional.

O seu cumprimento significará hipotecar o futuro do país por muitos anos. É por isso que a renegociação da dívida, nos termos em que nós a defendemos, é uma necessidade incontornável. Como incontornável é a necessidade da implementação de uma nova política, uma política alternativa como a que o PCP preconiza para inverter a actual situação de degradação económica e social do país.

É olhar para a proposta do primeiro Orçamento de Estado, filho deste Pacto de Agressão, e ver o seu sentido profundamente regressivo. Um Orçamento que pretende impor uma diminuição geral dos salários, quer pela sua diminuição directa, como no caso dos trabalhadores da Administração Pública - mantendo o corte de 2011 e acrescentando o roubo de dois subsídios -, quer pela alteração das regras relativas ao horário de trabalho ou à diminuição para metade do pagamento de horas extraordinárias.

Um Orçamento que pretende diminuir as reformas, as pensões e as prestações sociais, mesmo aos desempregados, agravando ainda mais a desigual distribuição da riqueza, retirando ou mutilando os direitos que assistem àqueles que trabalharam e contribuíram dos seus salários uma vida inteira.

Um roubo nos salários e pensões, no valor de mais de 2000 milhões de euros, ao mesmo tempo que se multiplicam os apoios ao sector financeiro.

Com este Orçamento os trabalhadores portugueses são condenados a trabalhar mais, a receber menos e pagar mais impostos. Mais IRS, mais IMI, mais IVA, em cima dos aumentos dos preços da electricidade, das portagens, dos custos da saúde e dos transportes. Aumento também com um forte impacto na sobrevivência do pequeno comércio, da restauração e de outras actividades, particularmente as viradas para o mercado interno.

Um orçamento que pretende dar um golpe severo no direito à saúde, com um corte de quase 1000 milhões de euros à custa de novos encerramentos, do aumento das listas de espera à custa do aumento das taxas moderadoras e medicamentos e à custa do despedimento dos profissionais necessários aos serviços de saúde.

Um orçamento que ataca de forma brutal a escola pública e aplica um corte de quase 20% às verbas destinadas à educação. Com o despedimento de milhares de professores, o encerramento sistemático de escolas, a falta de milhares de auxiliares, as dívidas às autarquias, o aumento do número de alunos por turma e o empobrecimento dos currículos.

As consequências negativas deste orçamento são vastas e profundas também na nossa economia, no emprego, nas nossas estruturas produtivas, no aumento da dependência externa com as políticas de corte drástico no investimento e de drástica redução do poder de compra das populações.

Um Orçamento que dá razões acrescidas à luta e ao protesto populares!

É perante um Orçamento desta gravidade que o PS decide abster-se. Diz que se trata de um voto de “abstenção violenta”, mas a adjectivação escolhida para qualificar tal votação não consegue esconder que se trata, de facto, de um voto solidário com os seus aliados e parceiros do Pacto de Agressão.

Tudo sempre justificado, por uns e por outros, pelo que dizem ser o interesse nacional, mas de facto para defesa dos interesses dos grandes grupos económicos e, particularmente da banca. Dessa banca que se prepara para ser levada ao colo pelo Governo e pelo Presidente da República, com 12 mil milhões de euros no seu bornal livre de obrigações, depois das fitas do costume e dos conflitos encenados para levarem a água ao seu moinho e justificar o injustificável.

Os banqueiros querem o dinheiro público, mas não querem qualquer controlo. Querem o dinheiro dos contribuintes para recapitalizar e valorizar os seus bancos e património, mas as acções a adquirir pelo Estado, correspondentes ao investimento, são não ao preço do mercado mas pelo valor que eles próprios têm contabilizado os seus activos. Ou seja, querem com esta operação reduzir a participação do Estado no capital dos bancos a recapitalizar. Aqui já não é o mercado que manda, mas o que lhes convém! Querem o máximo de dinheiro e manter o máximo do seu poder e decisão!

Dizem que assim deve ser porque ajudaram o país comprando dívida pública e agora o país tem que os ajudar a para eles ajudarem os pequenos e médios empresários. Dizem isto sem corar de vergonha! Nunca investiram um euro que não fosse para obter um avultado lucro. Só nos últimos quatro anos, entre 2007 e 2010, a banca obteve 9 000 milhões de euros de lucro. Lucros obtidos desviando muita da sua actividade para a esfera especulativa e não apara o apoio à economia, incluindo, naturalmente nas operações de especulação sobre a dívida pública, comprando dinheiro a juros baixos no BCE e vendendo a juros agiotas.

O seu dinheiro correu sempre no sentido de obter mais lucro para os seus accionistas e não em função do interesse do país ou da economia nacional. É assim que tem sido e é assim que querem garantir que continue a ser. É por isso que os 12 000 mil milhões, se realmente quer que sejam para injectar e dinamizar a economia, deviam ir direitos à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e deixar a dita recapitalização dos bancos privados ao cuidado dos seus accionistas.

A situação hoje em Portugal, reflectindo as opções políticas nacionais de uma governação de restauração capitalista conduzida pelo PSD, CDS e PS, é igualmente indissociável da evolução e profundíssima crise do processo de integração capitalista da União Europeia, materializado no seu carácter neoliberal, militarista e federalista.

Uma crise que tendo forte expressão na economia e saldando-se por uma situação catastrófica do ponto de vista social vai contudo além disso. É uma crise dos próprios fundamentos e dos pilares económicos, políticos e ideológicos da União Europa. Uma crise que a crise económica apenas veio por mais a nu. Tal como o sistema capitalista está a reagir à sua própria crise com o aprofundamento do seu carácter explorador, opressor e criminoso, também a União Europeia, que é seu instrumento, reage à crise dos seus fundamentos com o aprofundamento do seu carácter neoliberal e militarista, com a tentativa de regressão das conquistas e direitos, com novas estratégias de domínio económico e político de tipo colonial e saltos federalistas, com ainda maiores restrições democráticas e com uma ainda maior concentração do poder económico e político.

Os recentes acontecimentos na Grécia e na Itália, as decisões dos seus Conselhos, demonstram de forma muito eloquente que o processo de integração capitalista não serve os interesses dos trabalhadores e dos povos. Antes serve para acentuar as assimetrias de desenvolvimento e os ataques à soberania dos povos e à própria democracia, aprofundando o domínio do capital monopolista e das grandes potências.

Estes últimos acontecimentos nestes países mostram bem quem manda por cima das opções e da vontade dos povos e quanto vale a democracia face às determinações do mercado, desse mercado que mais não é que a expressão e vontade dos mega bancos, dos grandes interesses económicos, do grande capital monopolista e dos seus interesses.

Quando as eleições não lhes servem acabam com elas e passam a impor as soluções que lhes convêm.

Com os partidos políticos que os têm servido se apresentam já desgastados e desacreditados, tratam de impor os seus homens na direcção da governação sob a capa dos governos de técnicos ou tecnocratas, ditos independentes, mas de facto tomando partido pelos mesmos interesses. Governos de técnicos, mas como a mesma agenda ideológica neoliberal e o mesmo programa político.

Este é o novo disfarce que, aqui em Portugal, se tentou também fazer passar nas finanças, na economia, para criar a ilusão de que apenas trabalham para o bem do país e dos povos. Nada mais ilusório. Talvez não seja por acaso que o novo primeiro-ministro da Grécia, Lucas Papademos, apresentado como técnico, tal como o de Itália, o senhor Mario Monti, bem como o novel presidente do Banco Central Europeu, estejam todos ligados ao Goldman Sach, um dos maiores bancos de investimento do mundo. A sua independência é uma ficção!

A democracia é a dos seus interesses, a tal dos mercados. As soluções técnicas são as opções políticas que servem os interesses do grande capital financeiro e dos grandes grupos económicos. Depois de engolirem a economia, os direitos dos trabalhadores e dos povos, agem para reduzir a democracia à sua expressão mais ínfima!

É por tudo isto que não podemos cruzar os braços e a luta dos povos é o caminho!

Nem o nosso país, nem o nosso povo estão condenados. Há soluções alternativas. Com uma política patriótica e de esquerda, que tenha como objectivos o desenvolvimento económico, a elevação das condições de vida dos trabalhadores e populações, a defesa e promoção do interesse público e dos direitos dos cidadãos, o apoio efectivo às micro, pequenas e médias empresas, e a defesa e afirmação da soberania, é possível um Portugal mais desenvolvido, justo e soberano e com futuro.

São grandes a exigências que se colocam ao nosso Partido. São grandes os perigos e ameaças que pesam sobre os trabalhadores, o nosso povo e o próprio regime democrático de Abril.

Mas nós temos confiança. Confiança nas nossas próprias forças e nas possibilidades que se podem abrir com a luta dos trabalhadores e do nosso povo.

Sabemos que o percurso é difícil. Nunca nada foi fácil na vida e na luta deste Partido durante os estes seus 90 anos de existência. Mas, unidos e determinado e com a luta dos trabalhadores e do povo seremos capazes de abrir um caminho novo de esperança para Portugal.