Reorganização administrativa de Lisboa
(projetos de lei n.os 120/XII/1.ª, 183/XII/1.ª e 184/XII/1.ª)
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
O PCP denunciou, desde o primeiro momento, a forma como o PSD e o PS negociaram nos seus gabinetes um autêntico Tratado de Tordesilhas a que vieram a chamar reorganização administrativa da cidade de Lisboa.
Também desde o primeiro momento, o PCP denunciou o conteúdo dessa putativa reorganização, deixando claro que se trata de um ajuste da organização territorial aos interesses destas forças políticas e à conceção que tanto uma como outra têm de poder local. Para estes partidos, em momento algum esteve em causa a avaliação das insuficiências ou debilidades da atual resposta do poder local às necessidades das populações de Lisboa. Aliás, fizeram mesmo esta negociata nas costas desta população.
Iludindo a questão central, que é a política autárquica levada a cabo tanto por PSD como por PS, tentam responsabilizar o modelo administrativo. Para iludir que é a política de distanciamento entre eleitos e eleitores, de submissão ao poder central, de alinhamento com as políticas de privatização e concessão de serviços, de depauperação das capacidades executivas do poder local e de cedência constante aos grandes interesses económicos, nomeadamente aos que se relacionam com a especulação imobiliária, a principal causa do descontentamento e da deterioração da qualidade de vida na cidade, o PS e o PSD desviam as atenções para o mapa administrativo.
O problema não está no número de freguesias, que, eventualmente, poderia ser até superior ao existente, tendo em conta o número de habitantes de algumas das atuais freguesias — devíamos trabalhar para ter uma resposta mais próxima dos cidadãos e não mais distante —, mas, sim, no serviço que prestam as autarquias (essa devia ser a preocupação), ou seja, a câmara municipal e as freguesias. Não é aglutinando estruturas, afastando o poder dos moradores e retirando a presença territorial dos órgãos autárquicos que será possível resolver os problemas da cidade.
A cidade não pode continuar a ser entendida como um espaço de especulação imobiliária e um tabuleiro de disputa partidária em que se divide o terreno entre o PS e o PSD.
O PS e o PSD lançam, assim, um processo construído de cima para baixo (se é que alguma vez foi lá abaixo…), dos bastidores para as populações (se é que alguma vez chegou às populações…), sem qualquer apoio destas, que não compreendem como se pode dizer a um morador de Santo Estevão que vá tratar dos seus assuntos ao Socorro. É uma proposta que ofende a identidade cultural dos bairros, com destaque para a zona central da cidade, e que não apresenta nenhuma solução para os principais problemas que a cidade atravessa.
Além disso, é uma proposta que não cumpre sequer o enquadramento legal em vigor, na medida em que concebe as autarquias à margem da legislação, com atribuições e competências que atualmente não lhes são atribuídas.
Com este processo, o PS e o PSD quiseram, simultaneamente, diminuir a representatividade democrática, o número de eleitos, o número de assembleias, a proximidade do poder ao eleitor, a eficácia da resposta do poder local, mas também iniciar a marcha de destruição do poder local democrático que o atual Governo quer impor.
Bem pode o PS agora fingir não apoiar, como fez ainda há pouco, a imposição do Governo para a reforma administrativa do território, mas terá de assumir a responsabilidade de ter sido ele próprio a iniciar e a conduzir esse processo em Lisboa. São ilustrativas as palavras que acabámos de ouvir do Partido Socialista, que acaba de nos dizer que a reorganização que preconiza para a cidade de Lisboa só terá enquadramento se aquela que o PSD quer impor ao País for avante.
Os habitantes de Lisboa contam com o PCP na Assembleia da República, nas freguesias, na Assembleia Municipal e na Câmara Municipal para dar combate a mais este projeto de desfiguração do poder local democrático.
Queremos uma adaptação administrativa que dê resposta aos problemas das pessoas, e não aos caprichos do PS e do PSD.