Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhoras Deputadas,
A educação, a formação e a qualificação dos portugueses têm vindo a ocupar, nos últimos meses um espaço significativo na agenda de trabalhos da Assembleia.
A preocupação perante as opções políticas do Governo de coligação cresce diariamente e a matéria legislativa anunciada, com pompa e circunstância, ao país e enviada por correio azul com chancela de muito urgente para esta casa testam os objectivos do PSD e do CDS/PP e confirmam os piores presságios.
Para este governo a constituição tem de facto substância da qual os governantes não pretendem ficar prisioneiros e muito menos fiéis depositários.
Atropelam-se direitos. Ignora-se a realidade do país.
Transforma-se a legitimidade da governação em tirania do quero posso e mando.
A Comissão de Educação Ciência e Cultura planificou o seu trabalho para viabilizar a participação dos parceiros educativos na apreciação das inúmeras e profundas alterações que o governo pretende formular no Sistema Educativo.
É consensual e considerada indispensável esta abertura ao país, particularmente no que à Lei de Bases do Sistema Educativo diz respeito.
Uma lei aprovada por lato consenso e que os portugueses ajudaram a construir.
Mas o governo não aprecia estas vivências democráticas e ignorando esta vontade dos deputados, impôs, há uma semana, a discussão na generalidade nos primeiros dias de Julho do mais importante texto legislativo em matéria de educação.
Claro que o país já devia estar habituado, sobretudo os interlocutores em matéria educativa.
Quando o governo não opta pela maré baixa do 3º período, como aconteceu o ano passado, opta pelo período das férias.
Vá lá perceber-se porquê?
Porque será inoportuno o decurso do ano lectivo? Porque não quererá o governo dar a conhecer as suas opções, enquanto as instituições funcionam.
Senhor Presidente, é importante a intervenção de V. Exa. no sentido de garantir que as diferentes propostas de Lei de Bases da Educação serão objecto de uma profunda e participada avaliação e discussão e que nestes processos terão a oportunidade de participar todos os interessados, nomeadamente os docentes, os alunos, os não docentes as famílias, as estruturas sindicais, as academias, as associações especializadas, as escolas Superiores de Educação, as Faculdades de Ciências da Educação.
Mais que produção legislativa, o nosso sistema precisa de acções que o qualifiquem e, neste momento, qualquer processo reduzido e precipitado de discussão, quer quanto ao método, quer quanto à substância terá consequências imediatas indesejáveis.
Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhoras Deputadas,
É de Educação, particularmente do Ensino Superior que falamos hoje.
E é neste subsistema também que se propõem inúmeras transformações.
Nada fica de fóra.
Os menos atentos poderiam até pensar que este subsistema teria acabado de ser descoberto por este governo.
Vagas, financiamento, autonomia e avaliação das instituições, estatutos da carreira docente são objecto de propostas governamentais.
Deveremos ser o país da comunidade europeia que mais iniciativas legislativas produz por legislatura, por governo e por tutela.
Na governação socialista, propuseram-se exactamente para algumas destas áreas um conjunto de alterações que, entretanto, já foram depostas, porque o reinado agora é outro.
Na sua grande maioria aprovam-se diplomas legais que prevêem legislação de desenvolvimento que raramente é produzida.
No entanto, sempre que se anuncia nova legislação é como se estivéssemos no grau zero.
Os governos e as maiorias que os sustentam recusam-se a fazer qualquer avaliação e justificam sempre as suas intervenções na suspeição das instituições e daqueles que, contra ventos e marés, informação e contra informação conseguem ainda gerir os destinos das instituições educativas.
As mais recentes acções do governo na área do Ensino Superior evidenciam o estado a que se chegou.
Em Bruxelas o último conselho de Ministros da Educação fixou cinco critérios de referência até 2010:
• Aumento da população estudantil • A melhoria de resultados • O crescimento de diplomas na área das ciências, acompanhado do combate à dominante masculina nestes cursos. • A educação ao longo da vida. • A redução do abandono escolar.
Qual é o cenário no Ensino Superior em Portugal e as condições para responder a estes objectivos.
O Ensino Superior em Portugal é hoje uma rede complexa na sua diversidade, nas tensões contraditórias e mesmo na conflitualidade que comporta. É resultado de contradições e insuficiências que se têm agravado com uma política de permanente estrangulamento financeiro do seu sector público e de liberalização para com um sector privado com crescimento anárquico, não respondendo às necessidades de desenvolvimento do país.
Por isso o país continua a possuir a mais baixa taxa de diplomação da Europa.
Por isso o país continua a possuir a mais baixa taxa de diplomados em ciências e tecnologias da Europa.
Por isso o país continua a possuir a mais elevada taxa de abandono e repetência no ensino superior de toda a comunidade europeia.
E sendo estes os números, há que considerar que a democratização e o alargamento de frequência no ensino superior são ainda uma prioridade.
E nesse sentido compete ao estado assumir plena responsabilidade pelo adequado financiamento do Ensino Superior Público e concretizar a progressiva gratuitidade que a Constituição consagra.
Se os compromissos assumidos fossem para levar a sério o governo deveria, de imediato, aprovar um programa extraordinário de investimento que assegurasse a qualidade e a expansão do Ensino Superior Público, considerando esta medida como objectivo nacional capaz de responder à necessária elevação do nível geral, cultural, científico e de habilitações da população portuguesa, à satisfação das necessidades do país em recursos humanos, à necessidade da melhoria da produtividade e de promoção de um desenvolvimento integrado do país.
Mas este governo não está preocupado nem com o país nem com a qualificação dos portugueses. E por isso as medidas são exclusivamente financeiras, pondo em causa direitos constitucionais como:
• A gratuitidade dos diferentes níveis de ensino; • A igualdade de oportunidades de acesso e sucesso escolares; • A necessidade de quadros qualificados; • A responsabilidade do estado, relativamente à criação de uma rede de estabelecimentos públicos que cubra as necessidades de toda a população;
E o que a Assembleia da República tem que decidir, a curto prazo, por imposição do governo e da maioria, é o financiamento do Ensino Superior que, pondo em causa a Constituição, garante o aumento das propinas, propõe o endividamento das famílias e dos jovens candidatos que contraíram empréstimos bancários para frequentar o ensino superior e consagra a igualdade de tratamento orçamental para o público e para o privado.
Mas antes, já a aprovação do Programa de Estabilidade e Crescimento determinou o investimento zero no ensino superior para os próximos anos.
E pelos bastidores, já a Direcção Geral do Ensino Superior impôs, no final do mês de Maio, um corte cego de 10% de vagas em quase todos os cursos de Ensino Superior Público.
E as excepções demonstram bem como os interesses nacionais não preocupam o governo.
Se não fosse assim como se explica que por todo o país estejamos a assistir ao encerramento durante os meses de Junho, Julho, Agosto e Setembro de muitos serviços de saúde por insuficiência de recursos humanos, enquanto o governo mantém, para o próximo ano, o mesmo número de vagas de 2002 em enfermagem e em tecnologias de saúde e em medicina não toma nenhuma decisão, enviando o ónus para as respectivas instituições.
O ensino superior, particularmente o público, poderia e deveria desempenhar uma função estratégica e decisiva no desenvolvimento do país.
Mas o governo não quer ou não sabe construir essa oportunidade.