Intervenção de

Polícia Marítima - Intervenção de António Filipe na AR

Direito de associação pelo pessoal da Polícia Marítima nos termos da Lei n.º 53/98, de 18 de Agosto

 

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

Estamos hoje perante um facto raro nesta Assembleia que é o de discutirmos a Polícia Marítima (proposta de lei n.º 146/X).  

E faz todo o sentido discuti-la, mesmo do ponto de vista do seu enquadramento institucional, porquanto, sendo uma força de segurança, e como tal definida, não é uma força de segurança que esteja sob a tutela do ministério que tutela as demais forças de segurança.

É, portanto, uma situação especial estar sob a tutela do Ministério da Defesa Nacional e, mais, sob a direcção hierárquica directa do Chefe de Estado-Maior da Armada, o que é insólito porquanto a própria Guarda Nacional Republicana, que também tem, nos termos legais, uma natureza militar, não está sob tutela do Ministério da Defesa Nacional - está sob tutela do Ministério da Administração Interna e não está sob a dependência hierárquica do Chefe de Estado-Maior do Exército.

Um dia, valeria a pena discutirmos com cuidado qual a lógica do enquadramento institucional da Polícia Marítima, porque não é isso que está hoje, aqui, em discussão.

O que está hoje, aqui, em discussão é uma proposta de lei do Governo, que eu diria que é, sobretudo, uma lei eleitoral para a eleição dos representantes do pessoal da Polícia Marítima nos órgãos em que esta força de segurança tem representação.

Não vem mal ao mundo que se estabeleça esta lei eleitoral, que é, de facto, extraordinariamente minuciosa, mas é um facto a registar que esta matéria seja regulada, porque, de facto, há muitos anos que está por regulamentar o exercício de direitos associativos por parte do pessoal da Polícia Marítima.

Mas o simples facto de esta regulamentação ser finalmente proposta pelo Governo é um facto que importa registar.

Agora, eu diria que há nesta proposta de lei dois aspectos que não podem deixar de merecer o nosso reparo e a nossa crítica contundente.

Um deles diz respeito à possibilidade de, a todo o momento, o comando poder interromper as dispensas que são concedidas para a participação em actividades associativas.

E criticamos esta posição porquê? Porque essas dispensas têm de ser superiormente autorizadas, nos termos da proposta de lei, o que já é discutível, mas têm de ser autorizadas, com prazos fixados.

Ora, não faz qualquer sentido que, depois de terem sido autorizadas - o que significa, desde logo, que não há inconveniência para o serviço -, elas possam ser interrompidas, mesmo durante o seu decurso.

Isto cria uma discricionariedade total e uma insegurança por parte dos dirigentes associativos quanto ao exercício das suas funções associativas.

Depois, há um outro aspecto que não podemos deixar sem reparo, que é a reprodução, também nesta proposta de lei, da malfadada expressão da «coesão e disciplina» no seio da Polícia Marítima.

Porquê? Porque esta disposição, que existe relativamente às associações militares em geral, tem servido propósitos de inviabilização prática do exercício de direitos associativos por parte dos militares.

Porquê? Porque, ao permitir-se que o comando possa, discricionariamente, invocar a «coesão e disciplina» das Forças Armadas para proibir a actividade das associações... É isso que tem vindo a acontecer.

Esta disposição tem vindo a ser invocada de uma forma absolutamente abusiva. Eu até diria que é da mais duvidosa constitucionalidade que uma lei possa regular o exercício do direito de associação com base numa expressão tão vaga e indeterminada como é a «coesão e disciplina das Forças Armadas».

Nós temos consciência dos efeitos nefastos que esta formulação está a ter em matéria de direitos associativos dos militares e, portanto, não podemos aceitar que igual formulação seja introduzida nesta proposta de lei, porque poderá criar, precisamente, os mesmos efeitos um dia em que a Polícia Marítima se veja na contingência de ter de discordar do Governo e de ter de manifestar uma posição contrária àquela que é a política do Governo.

 

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