(petição n.º 433/XII/4.ª)
Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Antes de mais, desejamos saudar os peticionários, os que estão presentes e todos os que trouxeram esta petição à Assembleia, começando por assinalar, na qualidade de Deputado relator desta petição, que o processo de apreciação parlamentar que aqui se cumpre agora foi levado a cabo, pela nossa parte, de uma forma deliberadamente expedita para que assim pudéssemos considerar e refletir sobre o seu conteúdo em tempo útil e tê-lo em conta no processo legislativo das propostas de lei em causa.
Por isso mesmo, a opção foi não tanto o alargamento ou o prolongamento de debates, mas essencialmente o tratamento célere da petição. Portanto, nomeado o relator, os peticionários foram ouvidos uma semana depois e o relatório aprovado em Comissão no mês seguinte, em simultâneo com o debate orçamental, com as condicionantes daí decorrentes.
Face à situação em que a maioria colocou o processo legislativo de um trabalho na especialidade que, na prática, foi interrompido e ficou suspenso durante meses, sem qualquer discussão até agora, há situações graves, em alguns casos dramáticas, que se têm verificado no terreno e veremos agora, esperamos, que desenvolvimentos concretos teremos pela frente nessa matéria.
Quando esta petição declara, perante esta Assembleia, a oposição e a rejeição clara das propostas de lei n.os 226/XII (3.ª) e 227/XII (3.ª) vem dar mais força à nossa posição de denúncia, ao nosso voto contra, à nossa exigência de outro caminho e de outras opções políticas que urge seguir na área da construção.
Tal como o PCP oportunamente denunciou, os dois diplomas visam substituir a interdisciplinaridade das diferentes especialidades pela polivalência técnica, com o objetivo de proporcionar às empresas responderem ao maior número de solicitações com o menor efetivo de quadros técnicos especializados.
É a consagração da precariedade como regra e da figura das empresas de construção sem quadros de pessoal nem corpos técnicos, que metem pessoal no arranque de cada obra e mandam-no embora quando a obra acaba.
É a ameaça à qualidade do trabalho especializado, submetendo a esmagadora maioria das micro, pequenas e médias empresas às mãos de meia dúzia de grandes grupos que dominam o mercado. Os dois diplomas ilustram, ainda, um desconhecimento profundo no que diz respeito às alterações verificadas nos processos de projeto e de comunicação à obra, em particular com a generalização do uso de ferramentas informáticas e das respetivas repercussões na direção e na fiscalização das obras de construção. E o mesmo acontece no que diz respeito à realidade de um setor como o da construção civil, cuja crise o aproxima do colapso, facto que já foi evidente nas audições realizadas no início da especialidade.
O que está em causa, afinal, neste debate e nesta petição é o papel da arquitetura na sociedade, da arquitetura enquanto cultura técnica, ética, deontologia e cuja vocação deve estar vinculada ao interesse público na edificação na cidade e no ordenamento do território e que, nesse sentido, se coloca tendencialmente num terreno oposto ao do interesse privado especulativo que estas propostas de lei e as políticas em que se enquadram vêm proteger e privilegiar.
A arquitetura não se exerce de uma forma inteiramente autónoma das condições sociais concretas e das políticas dominantes. O facto de ser subalternizada nestes diplomas é significativo das opções políticas do Governo.
Não queremos deixar de responder, concretamente, a duas questões suscitadas nesta petição — a direção de obra e o famoso Decreto n.º 73/73. O PCP já apresentou, em sede de especialidade, propostas de alteração no sentido de consagrar o reconhecimento da qualificação dos arquitetos para o exercício das funções de direção de obra e de direção de fiscalização de obra.
Termino, reafirmando as exatas palavras que proferi, em nome do PCP, no debate de há 12 anos, sobre a petição também então designada por «direito à arquitetura», em 21 de maio de 2003. Dizíamos, então: «Sendo evidente e indesmentível a necessidade de pôr cobro a uma situação que é provisória há 30 anos, não podemos ignorar a importância de não incorrer no erro inverso, que é, justamente, o de não acautelar as inúmeras situações de profissionais e de instituições sobre as quais esta alteração terá impacto». Ou seja, sabemos que é um caminho que queremos percorrer, não podemos ignorar que há pessoas e instituições concretas, hoje, no terreno, de Norte a Sul do País.
Há uma tentativa do Governo insidiosa e perigosa, como é evidente, que é a de transformar o processo legislativo num conflito corporativo, despolitizando o debate e colocando classes profissionais e trabalhadores uns contra os outros.
Da parte do PCP, queremos deixar bem claro que para isso não contam connosco. O que terão é a denúncia e o repúdio que essa atitude merece. Com estas propostas de lei do Governo e com esta política, os trabalhadores são prejudicados no seu conjunto, bem como as várias profissões, as populações e o interesse público. Por isso, Srs. Deputados, como podem ver, temos muito para fazer, na especialidade, sobre estas propostas de lei.