Projecto de Lei

Pensões de reforma

 

Proíbe a penalização das pensões de reforma em função do limite de idade para a profissão

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EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

I

Depois de uma vida de trabalho, é justo e legítimo que os trabalhadores tenham uma reforma que lhes permita viverem o resto das suas vidas com dignidade. O sistema público de segurança social criado após o 25 de Abril surge com o objectivo de propiciar mecanismos de protecção para os momentos mais difíceis da vida dos trabalhadores e para lhes garantir uma pensão digna que permita enfrentar o resto das suas vidas com a autonomia e a dignidade que merecem.

O Primeiro-Ministro José Sócrates afirmou, no debate mensal de Abril de 2008, que as medidas decididas pelo Governo asseguram o futuro da segurança social e iriam salvar o sistema. Da análise das (pouco credíveis) estimativas apresentadas pelo Governo, facilmente se chega à conclusão de que as medidas apresentadas não resolvem o problema, nem a médio nem, tão pouco, a longo prazo.

O Governo avançou com medidas que implicam pensões mais baixas, insegurança e instabilidade para os trabalhadores e reformados. O Governo introduziu um factor ao qual chamou, para efeitos de propaganda, «factor de sustentabilidade», no sentido de associar a idade da reforma à esperança média de vida - aumentando, assim, a idade da reforma dos trabalhadores. Optou assim por medidas que irão diminuir ainda mais as já baixas pensões dos trabalhadores.

O Governo optou por aumentar a idade real da reforma, obrigando os trabalhadores a trabalharem para além dos 65 anos, e diminuiu o montante da pensão, por via da alteração da fórmula de cálculo e por via da aplicação do factor de sustentabilidade.

O efeito conjugado destas medidas implica, de acordo com afirmações do próprio Governo, que a taxa de substituição, que hoje ronda os 84%, passe a ser, em 2050, de apenas 55%. Ou seja, aponta-se para que um trabalhador passe à reforma, com uma pensão de pouco mais de metade do valor do seu salário nessa data. Com estas orientações, as pensões de reforma vão, a curto e médio prazo, agravar a cada vez maior perda de poder de compra e o empobrecimento dos trabalhadores portugueses.

A vida veio demonstrar que mais uma vez o PCP tinha razão quando afirmava, já em 2007, que era intenção do Governo aumentar a idade da reforma. Nessa altura, um abaixo-assinado promovido pelo PCP recolheu mais de 120 mil assinaturas, a demonstrar que os portugueses tinham e têm consciência do facto de que vão ter de trabalhar mais tempo para receber menos pensão.

E tinha também o PCP razão ao denunciar as graves consequências da alteração da fórmula de cálculo das pensões que, em 2007 e 2008, provocou reduções substanciais a centenas de pensionistas que sofreram cortes de várias dezenas de euros nas suas reduzidas pensões de 300 e 400 Euros.

Valeu a pena lutar, e após a apresentação do Projecto de Lei n.º 456/X em Janeiro de 2008, apenas rejeitado pelo PS, o Governo acabou por recuar, perante a luta determinada do PCP e de milhares de reformados, alterando a fórmula de cálculo das pensões, sem, contudo, garantir o pagamento dos retroactivos referentes à redução das pensões num período de cerca de um ano e meio, como seria da mais elementar justiça.

A lógica subjacente a estas medidas de redução de direitos e das prestações sociais de reforma é particularmente grave, uma vez que permite que, no futuro, o governo, seja ele PS ou PSD, venha anunciar medidas adicionais.

É uma evidência que, por outro lado, o Governo nada exige ao patronato. Fica, assim, claro que o Governo optou por penalizar os trabalhadores, por penalizar as reformas de milhares de trabalhadores, para não tocar nos interesses do patronato. Entre as tão propagandeadas "medidas anti-crise" decididas pelo Governo, estão aliás novas isenções para os patrões ao nível das contribuições para a Segurança Social, isto para além das que foram aprovadas pela maioria parlamentar do PS em sede de alteração ao Código do Trabalho.

II

O PCP tem vindo a afirmar uma política alternativa também para a segurança social. Neste sentido, apresentou nesta Legislatura um conjunto de iniciativas legislativas que visam a sustentabilidade da segurança social, sem diminuir as reformas dos trabalhadores e promovendo a sua adequada valorização.

Foi apresentada pelo PCP uma Lei de Bases para a Segurança Social, defendendo a sua sustentabilidade financeira presente e futura, com um conjunto articulado de medidas, que passam, entre outras, pela implementação de uma nova forma de contribuição anual para o sistema de segurança social com base no valor acrescentado das empresas, criando, assim, um sistema mais justo de contribuições, que tem em conta não só o número de trabalhadores que uma empresa tem mas também a riqueza que esta empresa cria. Ainda nesta Legislatura, o PCP apresentou um projecto de lei de alteração da fórmula de cálculo prevista no Decreto-Lei n.º 187/2007, cuja aplicação diminui, de uma forma absolutamente ilegítima, as já baixas pensões. Muito tardiamente, em sede de Orçamento do Estado para 2009, o Governo deu razão ao PCP e reconheceu a injustiça desta situação, alterando-a para o futuro (mas sem devolver aos reformados o que já lhes havia sido retirado).

O PCP apresentou também um projecto de lei que alterava o indexante dos apoios sociais e as novas regras de actualização das pensões. Este indexante, que condiciona o aumento das pensões ao crescimento económico, vai perpetuar as pensões de miséria e não vai permitir um real combate a esta realidade, isto é, não permite que se proceda a um aumento real do poder de compra das pensões mais baixas, perpetuando, assim, as pensões de miséria.

Nesta Legislatura, o PCP apresentou ainda, por diversas vezes, propostas de aumentos intercalares das pensões, que visavam acabar com as pensões de miséria que atiram para a pobreza milhares de trabalhadores reformados, que mereceram os votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP. Apresentou ainda propostas de diversificação das fontes de financiamento da segurança social, garantindo a sua sustentabilidade através das contribuições das empresas com maiores lucros e não da redução dos direitos de quem trabalha. A todas estas propostas o PS e o seu Governo disseram não.

Em Janeiro de 2009, o PCP apresentou dois projectos de lei revogando o factor de sustentabilidade e garantindo o direito a uma reforma sem reduções ou penalizações para todos os que se reformem após 40 anos de contribuições, independentemente da sua idade.

É no respeito pelo contributo que milhares de trabalhadores já deram na produção de riqueza e ao sistema público, solidário e universal da Segurança Social, que o PCP defende e exige o direito a uma pensão de reforma sem quaisquer penalizações ou reduções, independentemente da idade, ao cabo de 40 anos de trabalho.

Todas estas propostas e esta intervenção do PCP demonstram assim, se dúvidas ainda existissem, um caminho alternativo, de ruptura face a estas políticas que têm vindo a ser seguidas. Para além da firme oposição a estas medidas do Governo, e a este quadro social e económico de profunda injustiça que elas consubstanciam, o PCP não abdica de agir em defesa dos trabalhadores, avançando também com propostas para problemas concretos que a político do Governo está a criar. É o que sucede com o sector do transporte rodoviário de mercadorias e passageiros, e diversos outros sectores onde existem limites de idade para a actividade profissional.

III

Se por um lado, o Governo veio impor que os trabalhadores - para não serem penalizados na sua reforma - tenham de prolongar a sua vida activa, por outro lado são muitos os trabalhadores que não podem exercer a sua profissão para além dos 65 anos de idade.

É o caso, nomeadamente (mas não exclusivamente) dos motoristas de veículos pesados de mercadorias e passageiros, com cartas de condução de categorias D, D+E e das subcategorias D1 e D1+E, e ainda da categoria C+E, para viaturas cujo peso bruto ultrapasse os 20.000 kg. Nestes casos, a revalidação da habilitação legal de condução acontece pela última vez aos 60 anos de idade, permitindo aos motoristas exercer a sua profissão por mais cinco anos.

Estamos, assim, perante uma situação na qual os trabalhadores, neste caso os motoristas de veículos pesados de mercadorias e passageiros, não podem e não devem continuar a exercer a sua profissão - mas passam a ser seriamente penalizados se nessa altura passarem à reforma.

A linha política do actual Governo e da actual maioria parlamentar do PS, em matérias como esta, já foi evidenciada e torna perfeitamente previsível a primeira resposta a este problema, que aliás já foi sinalizada pelo Governo: a falsa alternativa entre a eliminação dos actuais limites de idade e a mudança de profissão (aos 65 anos!).

Por um lado seria completamente absurdo advogar que um trabalhador, no momento em que deveria passar à reforma, passasse a ser confrontado com o início de uma nova profissão. Para além de desumano, seria de resto absolutamente irracional como opção de gestão numa actividade económica.

Por outro lado, estas limitações consagradas na legislação têm uma razão de ser. No caso dos motoristas, está em causa antes de mais a segurança rodoviária. Muitas vidas têm sido ceifadas pelas situações de fadiga entre trabalhadores deste sector, e os riscos associados a esta actividade são inegavelmente cada vez maiores, à medida que a idade dos motoristas se vai tornando mais avançada.

Com efeito, seria correcto, não só pelo mais elementar humanismo e sentido de justiça social, mas inclusivamente pela defesa das condições de segurança rodoviária nosso país, que a idade de reforma destes trabalhadores fosse fixada, sem qualquer penalização, não nos 65 anos mas sim antes mesmo dessa idade. Contudo, o quadro legal, que este Governo e esta maioria parlamentar do PS decidiram, vem impor o contrário.

Por essa razão, e sem perder de vista a oposição de fundo do PCP quanto às políticas de sucessivos governos - e do actual governo em particular - que penalizam os trabalhadores e o seu direito a uma reforma digna, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta esta iniciativa que visa responder ao problema concreto de muitos trabalhadores, que agora são simultaneamente obrigados e proibidos de exercer a sua profissão depois dos 65 anos.

Com o presente projecto, o PCP propõe assim que se impeça a penalização das pensões de reforma em função do limite de idade para o exercício da actividade profissional do trabalhador.

Nestes termos, e face ao exposto, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º

Objecto

A presente Lei garante o direito à atribuição de pensões de pensões de reforma sem penalização ou redução, nos casos de existência de limite de idade para o exercício de actividade profissional.

Artigo 2.º

Âmbito pessoal

Têm direito à atribuição da pensão de velhice, no âmbito do artigo anterior, os beneficiários que, tendo cumprido o prazo de garantia, tenham completado, à data em que perfaçam a idade correspondente ao limite legalmente estabelecido para o exercício da profissão, 36 anos civis de registo de remunerações relevantes para cálculo da pensão.

Artigo 3.º

Âmbito material

O disposto na presente Lei aplica-se às profissões cujo enquadramento ou habilitação legal necessária estabeleça um limite máximo de idade igual ou inferior à idade legal de reforma.

Artigo 4.º

Suporte financeiro

O suporte financeiro da atribuição da pensão previsto na presente Lei é garantido pelo Orçamento da Segurança Social.

Artigo 5.º

Regulamentação

O Governo regulamenta a presente Lei no prazo de 180 dias.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

A presente Lei entra em vigor com a Lei do Orçamento do Estado posterior à sua publicação.

Assembleia da República, em 18 de Fevereiro de 2009.

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