Projecto de Resolução N.º 1576/XII/4.ª

Pelo apoio aos agricultores da Península de Setúbal – reintegração das zonas rurais e desfavorecidas da região no PDR 2020

Pelo apoio aos agricultores da Península de Setúbal – reintegração das zonas rurais e desfavorecidas da região no PDR 2020

Exposição de Motivos

A Península de Setúbal é um território com importante produção agrícola e com produtos de elevada qualidade. As características dominantes da região resultam da localização privilegiada, dos fatores climáticos e dos recursos aquíferos, proporcionando um enorme potencial agrícola e florestal.
A Península de Setúbal desde há muito que se constituiu como produtora de vinhos de grande qualidade, merecendo destaque o famoso Moscatel de Setúbal. Existem na região cerca de 9.400 hectares de vinha que se distribuem pelos concelhos de Palmela, Montijo, Setúbal e Sesimbra e que estão na base das Indicações Geográficas “DOC Setúbal”, “DOC Palmela” e “Regional Terras do Sado”.
De entre os produtos agrícolas sobressai o Queijo de Azeitão DOP, produto reconhecido a nível internacional pela sua qualidade. Mas existe uma vasta e importante área de horticultura, fruticultura – com particular referência para a maçã riscadinha de Palmela – bem como o mel ou ainda as flores e culturas ornamentais. Na agropecuária, ganha destaque o facto de aqui se situar, principalmente na zona da Moita, uma das maiores senão a maior bacia leiteira da Área Metropolitana de Lisboa
Ora, face a esta realidade, sucedeu que numa decisão sem qualquer fundamento e totalmente incompreensível, o Governo excluiu a Península de Setúbal na delimitação dos territórios rurais abrangidos pelo Programa de Desenvolvimento Rural 2020. Assim, nos termos do “Mapa das zonas rurais e lista de freguesias” publicado pelo Governo, todas as freguesias rurais da Região, onde se produz intensamente uma enorme variedade de produtos agrícolas, deixaram de ser consideradas como rurais.
Esta situação coloca sérias implicações no acesso a fundos comunitários, designadamente no que concerne à Medida 10 / LEADER, (art.º 42.º, 43.º e 44.º do Reg. 1305/2013 – regulamentação relativa ao apoio ao Desenvolvimento Rural pelo FEADER).
Entre as principais prioridades do Desenvolvimento Rural alvo de apoio do FEADER às Estratégias de Desenvolvimento Local (EDL), o Governo aponta a «Prioridade 6 - promover a inclusão social, a redução da pobreza e o desenvolvimento económico das zonas rurais, no seguinte domínio: (a) facilitação da diversificação, da criação e do desenvolvimento das pequenas empresas e da criação de empregos; (b) fomento do desenvolvimento local nas zonas rurais.»
Com esta decisão, o Governo exclui todas as zonas rurais da Península de Setúbal da possibilidade de acesso a estes apoios ao investimento.
Para referir desde logo o caso mais flagrante, Poceirão e Marateca figuram entre as freguesias mais marcadamente rurais da península de Setúbal: têm uma baixa densidade populacional, são freguesias com mais de 900 explorações agrícolas recenseadas e a base do trabalho e da economia é a agricultura.
A retirada destas freguesias da lista de zonas rurais é uma falta de respeito pelas tradições e pela cultura destas populações, que querem manter o seu caráter, a sua identidade, a sua atividade.
Deve ainda ser referido o caso da Freguesia do Castelo – Sesimbra. Trata-se de uma freguesia que se apresenta como referência no contexto rural, com uma densidade populacional de apenas 106 habitantes por quilómetro quadrado, sendo constituída em cerca de 89% por aglomerados com menos de 2000 habitantes, e onde se tem desenvolvido um esforço significativo, no sentido de potenciar o seu desenvolvimento rural através de projetos inovadores.
Nos últimos anos, apresentaram-se na freguesia diversas candidaturas ao PRODER, que foram cruciais para o aumento da população jovem no sector agrícola, preservando-se a identidade, a cultura e a igualdade entre homens e mulheres. Destaca-se ainda a aposta que foi realizada na preservação do património, com diversas candidaturas aprovadas nesta área, bem como a identificação de novas necessidades na preservação do património.
Seguramente que esta incompreensível decisão do Governo, ao decretar que a Península de Setúbal não tem zonas rurais, não pode estar relacionada com a localização destes territórios na Área Metropolitana de Lisboa – até porque o Concelho de Mafra, sendo parte da AML, continua a ter todas as freguesias consideradas como rurais. Fica portanto por esclarecer qual foi a verdadeira motivação do Governo para decidir desta forma. E subsiste a perplexidade: se estas zonas não são rurais, o que é uma zona rural?!
Entretanto, com a Portaria n.º 22/2015, de 5 de fevereiro, o Governo estabeleceu uma nova listagem de zonas desfavorecidas, revogando a portaria n.º 377/88 de 11 de junho. Através dessa nova portaria, as freguesias Poceirão e São Pedro da Marateca do concelho de Palmela deixam de ser classificadas enquanto desfavorecidas, quando também já tinham deixado de ser classificadas rurais.
Com o processo de extinção e agregação de freguesias e a criação da União de Freguesias de Poceirão e Marateca, o resultado foi a exclusão deste território, penalizando-o gravemente.
Esta opção do Governo vem prejudicar ainda mais, não só os agricultores e as populações rurais ao nível local, mas também a própria economia da região, uma vez que o corte do acesso a apoios relevantes repercute-se no tecido económico em que a agricultura está integrada. A este nível, destaca-se no quadro do PDR 2020, a medida n.º 9, «Manutenção da atividade agrícola em zonas desfavorecidas», encontra-se inserida na área relativa ao «Ambiente, eficiência no uso dos recursos e clima».
Esta decisão que significa mais uma profunda machadada nos direitos e interesses dos agricultores e das populações rurais, que veem negado o acesso à implementação de iniciativas de desenvolvimento local de base comunitária (DLBC/rural), assim como os apoios majorados que os agricultores tem direito em zonas desfavorecidas, nomeadamente nas ajudas aos investimentos e mas indemnizações compensatórias.
Importa relembrar que toda a área da freguesia da Marateca sempre foi classificada como desfavorecida. Há cerca de quatro anos, os agricultores da Freguesia do Poceirão, sob a orientação da Associação dos Agricultores do Distrito de Setúbal, desenvolveu várias ações de luta contra a injustiça de deixar de ser considerada zona rural e desfavorecida, quando antes, integrada na Freguesia da Marateca, assim era considerada. Com o processo de criação da freguesia do Poceirão em Maio de 1988, a área que transitou da freguesia de São Pedro da Marateca era zona rural e desfavorecida, e assim continuou – e bem, porque a população não perdeu direitos.
Realizaram-se então reuniões e marchas de protesto dos agricultores, reclamando aos sucessivos Governos que a Freguesia do Poceirão fosse na totalidade considerada zona desfavorecida, e o que acontece hoje é que o atual governo não só não alargou como retirou a zona desfavorecida existente nas Freguesias do Poceirão e Marateca, hoje denominada União de Freguesias.
Constata-se que, tal como os agricultores denunciaram, e a publicação da referida portaria veio confirmar, o processo de extinção e agregação de freguesias e a criação da União de Freguesias de Poceirão e Marateca foi uma medida profundamente gravosa para as populações. Tinham e têm razão os agricultores e a população quando lutaram e lutam contra a extinção das suas freguesias e a denominada União de freguesias, imposta pelo governo, ao arrepio da sua vontade, direitos e interesses.
Se já antes não se fazia justiça em relação a estes territórios, agora com a nova classificação essa injustiça ainda se aprofunda quando se considera também esta como zona não rural e desfavorecida. É isso que os agricultores, e nomeadamente os pequenos produtores da Região, exigem que se reconheça – e que haja consequências práticas desse reconhecimento.
O Governo, com esta decisão, penaliza ainda mais as populações rurais e os agricultores destas freguesias, que são verdadeiramente rurais e desfavorecidas, com particular relevo para os pequenos e médios agricultores e para a agricultura familiar.
É urgente e indispensável que o Governo tome medidas urgentes no sentido de corrigir esta injustiça e inverter estas gravosas decisões.
E seria inaceitável que agora alguém pretendesse afirmar que, estando a regulamentação já aprovada e em vigor, estas regras não poderiam ser alteradas. Pelo contrário: bem recentemente o Governo aprovou e fez publicar alterações aos regulamentos de Programas Operacionais temáticos, que vieram abrir novas possibilidades aos grupos económicos para acesso aos fundos comunitários (como se verificou no artigo 4.º do Regulamento do PO Competitividade e Internacionalização).
Neste processo, e neste contexto, o que se impõe é uma alteração do Regulamento do PDR 2020 – no sentido de corrigir uma injustiça e devolver aos produtores desta Região o direito e o reconhecimento que agora lhes foi retirado.

No que diz respeito à consideração dos territórios em causa como zonas desfavorecidas, ganha ainda mais relevância e oportunidade a questão política da definição das Freguesias: da sua extinção, agregação – ou neste caso, da sua reconstituição e devolução às populações. Também por essa razão, e no quadro de uma intervenção coerente e integrada, o PCP apresenta esta iniciativa, em articulação com as que já apresentámos para a criação das Freguesias em causa no Distrito de Setúbal.

Nestes termos, e tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do Artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do número 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte

Resolução

A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, resolve recomendar ao Governo que seja urgentemente revista a Regulamentação do Programa de Desenvolvimento Rural 2020, com as seguintes alterações:

1. Que todas as zonas rurais da Península de Setúbal – nomeadamente Canha, Pegões, Santo Isidro, Alto Estanqueiro-Jardia, Sarilhos Grandes, Castelo, Alcochete e São Francisco, Poceirão, Marateca, Quinta do Anjo, Pinhal Novo, Palmela, Gâmbia Pontes e Alto da Guerra, Sado, São Simão, São Lourenço, Moita e Alhos Vedros – sejam devidamente classificadas como tal e incluídas na correspondente Lista;
2. Que todos os territórios anteriormente considerados como “zonas desfavorecidas” sejam integrados na listagem atualmente em vigor, com a correspondente alteração da Portaria n.º 22/2015, de 5 de fevereiro.

Assembleia da República, em 3 de julho de 2015

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