Projecto de Resolução N.º 1313/XII/4.ª

Pelo apoio ao Festival Internacional de Cinema de Tróia

Pelo apoio ao Festival Internacional de Cinema de Tróia

O Festróia - Festival Internacional de Cinema de Tróia nasceu em 1985, na cidade de Setúbal, fruto da paixão pelo cinema do escritor e jornalista Mário Ventura Henriques, com o objetivo de divulgar cinematografias desconhecidas do público português e que não chegam, regra geral, aos circuitos de distribuição comercial.

Todos os anos, cerca de duas centenas de produções, selecionadas em função de elevados critérios de qualidade, são exibidas durante o festival que se realiza na cidade de Setúbal desde 1995.

De importância central na vida cultural do distrito e do país – trata-se de um dos festivais de cinema mais antigos, impulsionado pelo movimento cineclubístico – o Festróia tem secções específicas - a seção oficial faz deste festival o único festival de cinema português que integra o calendário anual da Federação Internacional das Associações de Produtores de Filmes (FIAPF), do qual também fazem parte certames como Berlim, Cannes, Veneza, San Sebastián ou São Paulo - dedicadas a Primeiras Obras, Independentes Americanos e filmes abrangidos por uma categoria mais geral - O Homem e a Natureza. Conta ainda com a presença de júris internacionais que atribuem os seus prémios específicos: a SIGNIS (organização católica internacional do Cinema); FIPRESCI (imprensa cinematográfica), e, pela primeira vez, em 2006, o galardão da CICAE (Confederação Internacional dos Cinemas de Arte e Ensaio) do qual é membro. O Auditório Municipal Charlot, cuja programação é da responsabilidade do festróia, integra o Europa Cinemas.

Ao longo das suas mais de duas décadas de existência, o festival conseguiu conquistar uma reputação invejável em Portugal e no estrangeiro, não só devido à seleção rigorosa que faz das obras que apresenta, como ao facto de servir como ponto de encontro de dezenas de personalidades do mundo do cinema. Passaram já por este festival nos últimos vinte anos Pedro Almodóvar, Robert Mitchum, Kirk Douglas, Christopher Walken, Mickey Rooney, Dennis Hopper, Ben Gazzara, Jane Russell, Lauren Bacall, Christiane Torloni, Georges Corraface, Michael York, Alberto Sordi, Francesco Rosi, Jose Antonio Bardem ou os portugueses Ruy de Carvalho e Joaquim de Almeida, entre outros importantes nomes do cinema nacional e internacional.

O festival convida sempre mais de meia centena de jornalistas de órgãos de referência como a BBC, a RTVE, o La Repubblica ou o Expresso, sendo que a imprensa especializada também é uma presença assídua, cuja qualidade foi reconhecida em 1987 pela Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica (FIPRESCI), que todos os anos envia um júri próprio ao certame, com vista a atribuir o prémio da crítica.

A média de assistência do festival ronda as 25 mil pessoas, oriundas sobretudo dos distritos de Setúbal e Lisboa, criando hábitos de visualização e fruição do cinema numa perspetiva integrada de continuidade para além da época do festival.

O anúncio do fim deste importante festival de Cinema comprova a falta de investimento e estratégia dos vários Governos na garantia da criação e fruição do cinema, levando a que a maioria dos festivais de cinema apenas sobrevivam com programação mais comercial e quase exclusivamente em Lisboa. As ameaças que surgem sobre as realizações culturais, principalmente por via dos constrangimentos financeiros constituem-se como verdadeiras formas de censura às liberdades de criação e fruição culturais e artísticas, contribuindo assim para a hegemonização cultural dominada pelo mercado e pelos objetivos do lucro e do domínio cultural e ideológico.

A referida falta de investimento, que conduziu à decisão do cancelamento do Festróia em 2015 consubstancia-se na redução do financiamento do Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA), tendo passado de 47.500 euros em 2014 para 21 mil euros para o triénio e da perda total de financiamento do Programa Media, quando no ano passado foi de 75 mil euros. De uma forma súbita e sem qualquer fundamentação o Festival Festróia que no ano passado teve o financiamento máximo, integrando o grupo de festivais com melhor classificação, não teve qualquer financiamento europeu, quando cumpria exatamente os mesmos critérios e quando inclusivamente tinha apresentado uma proposta que incluía mais filmes europeus como tinham sugerido.

Quer para a cidade, quer para a região de Setúbal, bem como para o país, o Festróia realiza um importante papel de dinamização e de elevação cultural das populações, bem como se afirma como um elemento fundamental na diversificação da fruição, dada a sua natureza original, dedicada especialmente à promoção e divulgação do cinema oriundo de países de pequena produção. O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, que acompanha desde há muito a realização do Festival e, empenhado não só na sua continuidade, como no seu crescimento, defende que o Governo deve mobilizar os recursos necessários para assegurar esses objetivos, assim cumprindo também as obrigações de promoção cultural que a Constituição da República Portuguesa lhe atribui. Não é aceitável que, no mesmo ano em que o Governo, nomeadamente o Secretário de Estado da Cultura, anunciam o crescimento substantivo das verbas para o apoio à produção cinematográfica, para festivais e outros apoios no âmbito do Cinema, o Festróia anuncie a sua não realização, contrastando com o discurso de abundância do Governo.

Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais em vigor, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. Crie um programa de financiamento transitório e extraordinário, para assegurar a continuação da realização das próximas edições do Festival Internacional de Tróia.

2. Crie um regulamento de financiamento comunitário que possa colmatar as perdas tidas pelo Festival com o fim do seu acesso ao Programa Media e reforce o financiamento a festivais no âmbito dos apoios a cargo do Instituto do Cinema e do Audiovisual, assegurando a viabilidade dos festivais de cinema realizado em Portugal.

Assembleia da República, em 18 de março de 2015

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