Projecto de Resolução N.º 412/XV/1.ª

Pela realização de uma Auditoria aos processos de privatização da TAP

Exposição de motivos

A TAP está há mais de 20 anos em processo de privatização, e dele não consegue sair, por força da obsessão ideológica dos sucessivos governos e pela sua submissão ao processo de liberalização do sector aéreo imposto a partir da Comissão Europeia.

Esse longo processo trouxe à companhia prejuízos gigantescos. Importa recapitular, necessariamente de forma telegráfica, os principais passos desse caminho que tem sido imposto à TAP:

  • Primeiro processo de privatização da TAP. Abortado na sequência da falência da compradora (Swissair) depois de muitas funções integradas, com gigantescos prejuízos para a TAP;
  • Separação do sector da assistência em escala, então um sector altamente lucrativo da TAP, criação da SPDH e primeira privatização da SPDH, à Globália;
  • Compra da ex-Vem, a antiga manutenção da Varig, num processo que traria centenas de milhões de euros de prejuízos para a TAP ao longo dos anos;
  • Situação insustentável na SPDH, com gigantescos prejuízos para a TAP obrigam à primeira e conturbada renacionalização da SPDH;
  • Compra pela TAP da Portugalia ao Grupo BES por 140 milhões, para salvar o grupo BES e a Portugalia;
  • Segundo processo de privatização da SPDH, agora ao Grupo Urbanos;
  • Segundo processo de privatização da TAP arrasta-se por dois anos, sendo cancelado pelo Governo PSD/CDS a minutos de ser concretizado por absoluta falta de garantias da entretanto já falida Avianca. Um processo que provocou prejuízos sérios à TAP;
  • Terceira tentativa de privatização da TAP, desta vez a David Neelman, com o Governo PSD/CDS a fingir acreditar que era o grupo Barraqueiro o comprador (para assim cumprir a regra da UE sobre o controlo das companhias europeias). Processo é decidido de forma ilegal, com o Governo já derrotado eleitoralmente e sem legitimidade para concretizar o negócio.
  • ANA, entretanto oferecida à multinacional Vinci, impõe à TAP aumentos brutais nos alugueres e nas taxas;
  • Governo PS negoceia com o grupo comprador, legitimando a venda ilegal em troca da recuperação da maioria do capital pelo Estado, e entregando aos privados, num acordo parassocial, a gestão da companhia.
  • ANA impõe à TAP a venda das Lojas Francas, que sempre haviam sido uma componente positiva do negócio TAP;
  • Gestão privada introduz uma forte reestruturação na companhia, com muitas opções de valor questionável para a TAP (nomeadamente as opções e negócios com aviões, que sempre deixaram dúvidas se se destinavam a servir a TAP ou a Azul). Processo de crescimento da companhia, imposto pelos privados, é muito vezes descrito como estando a fazer a TAP «inchar e não crescer;
  • Apesar deste longo processo, a TAP chega ao final de 2019 numa situação económica equilibrada, e dando um poderoso contributo à economia nacional (maior exportador, emprego direto e indireto, volume de salários pago em Portugal, volume das contribuições para a Segurança Social e para os impostos nacionais, etc.);
  • No início de 2020 a pandemia abate-se sobre o sector aéreo mundial, que fica com a atividade reduzida, primeiro, quase a zero, depois, a níveis muito baixos. Quase sem receitas, com enormes despesas fixas com salários, leasings e alugueres, todas as companhias aéreas entrarão em falência se não forem capitalizadas, pelos seus acionistas ou pelos Estados;
  • Os acionistas privados cedo fazem perceber que não querem nem podem capitalizar a companhia;
  • PSD e IL defendem que a TAP deve ser abandonada, os seus trabalhadores despedidos, os seus aviões devolvidos às companhias de leasing, e o país, quando o sector aéreo recuperasse, deveria ficar à espera que uma qualquer low-cost assegurasse os voos para a diáspora, para as ilhas, para a origem do nosso turismo, etc.;
  • O PCP defende um apoio de contingência, tal como estava a ser dados às companhias de todo o mundo, que permitisse manter a capacidade produtiva intacta e preparada para o inevitável momento pós-Covid;
  • O Governo PS e a União Europeia acordam lançar a companhia num processo de reestruturação, que vai trazer mais instabilidade à empresa: despedimentos; redução de salários, ataque à contratação coletiva, redução da frota e das rotas;
  • A SPDH é colocada em insolvência, o Grupo Urbanos afastado da sua gestão, e dá-se início ao terceiro processo de privatização da SPDH;
  • No quadro do processo de reestruturação negociado com Bruxelas, dá-se início ao quarto processo de privatização da TAP, primeiro com a perspetiva de manter parte do capital no Estado, depois já se assumindo o objetivo da sua venda total.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Resolução:

Resolução

A Assembleia da República resolve, ao abrigo da alínea o) do artigo 161.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 214.º da Constituição, solicitar ao Tribunal de Contas, nos termos previstos na alínea g) do n.º 1 do artigo 5.º e no artigo 55.º da Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, na sua redação atual, que efetue uma auditoria à TAP SGPS, na qual sejam analisados:

  1. Os três processos de privatização que a empresa já sofreu, e contabilizados os custos que cada um desses processos trouxe à companhia;
  2. As consequências económicas para a TAP da separação da assistência em escala, imposta por diretiva europeia, bem como sejam auditados os custos para a TAP dos processos de privatização da SPDH;
  3. O processo de aquisição da ex-VEM, e a forma como foi conduzido esse negócio;
  4. O processo de aquisição da Portugalia, para salvar a empresa privada e a liquidez do Banco Espírito Santo, seu proprietário;
  5. A forma como a ANA se apropriou das Lojas Francas na sequência da privatização da ANA, e os custos para a TAP deste «negócio»;
  6. Os custos para o Estado português de uma eventual falência da TAP em 2020, quer os diretos (nomeadamente, execução de garantias, pagamento de indemnizações, custos com fundos de desemprego, redução de receita fiscal e na segurança social) quer os indiretos (efeito sobre o PIB, efeitos sobre o sector do turismo, custos acrescidos com missões soberanas, etc.);
  7. A inclusão, no âmbito da auditoria em curso à privatização da ANA, dos prejuízos acumulados pela TAP (e consequentemente pelo Estado) com esse processo, nomeadamente com o aumento de taxas e alugueres e pelo adiamento da construção do Novo Aeroporto de Lisboa.
  8. Mais se solicita que nessa Auditoria seja apurado, não apenas o volume dos prejuízos causados à TAP, mas igualmente a responsabilidade direta e indireta – na Companhia e no Governo – por esses atos.
  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Projectos de Resolução
  • Privatização
  • Privatização da TAP
  • TAP