Intervenção de Alma Rivera na Assembleia de República, Reunião Plenária

Pela concretização do Estatuto da Agricultura Familiar

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Sr. Presidente, Senhores Deputados.

 

Por mais voltas que se lhe dê, por muito que alguns nos queiram distrair com aspectos laterais, em matéria da agricultura há quatro aspectos que são incontornáveis.

Por um lado a dimensão e o peso relativo da pequena e média agricultura. Dizem os censos agrícolas que mais de 85% das explorações agrícolas em Portugal são Familiares, que ocupam mais de 50% do Solo Agrícola Útil e mais de 80% da mão de obra.

Em segundo lugar, as dificuldades com que se debatem todos os agricultores, seja por razões climatéricas como a seca, seja pelo aumento especulativo dos preços dos factores de produção, seja pela dificuldade de escoamento dos seus produtos a preço justo, sujeitos que estão à ditadura da grande distribuição. Também é com o suor dos pequenos agricultores que GALP, Jerónimo Martins ou SONAE viverem à tripa forra!

O terceiro aspecto é a desigualdade de tratamento da pequena e média agricultura, com o escandaloso favorecimento do grande agronegócio, traduzido no facto de 7% dos beneficiários de apoios da PAC receberem 70% das ajudas, por opção deliberada de sucessivos Governos, em que PS e PSD partilham iguais responsabilidades, a que se soma a teia burocrática que impede os pequenos de acederem a essas ajudas, teia que, aliás, se acentuará com o PEPAC que agora se vai iniciar.

O quarto e último aspecto, que decorre dos anteriores, é termos, não obstante os milhões que os governantes não se cansam de anunciar que despejam sobre a agricultura nacional e os casos de sucesso que gostam de visitar, um mundo rural mais pobre, um País mais dependente do estrangeiro para a sua alimentação, com casos que colocam mesmo em causa a segurança nacional, com uma balança agroalimentar que continua acima dos 3500 milhões de euros negativos.

Sim sr. Presidente e Senhores deputados, tanta concentração da propriedade, tanta modernidade, tanto aumento da área média das explorações, traduziram-se num País mais vulnerável, como por estes dias se vê com uma armazenagem de cereais para apenas 15 dias, ou como os dramáticos incêndios que ano após ano percorrem serras de mato, onde antes havia pequena agricultura, bem demonstram.

Os sucessivos Governos gostaram, e este não é excepção, de andar de braço dado com o grande agronegócio e isso vê-se, seja na opção de cortar a direito nos apoios aos mais pequenos na PAC, com um corte de 50% para os agricultores com menos de 1 hectare no Regime da Pequena Agricultura, que devia envergonhar o PS e o seu Governo, seja no desprezo a que votaram o Estatuto da Agricultura Familiar.

 

Sim, srs. Deputados, a agricultura familiar, a que vai aos mercados vender, a que tem na nessa actividade um complemento do seu salário ou da sua reforma, assume uma importância estratégica para a produção nacional, para a qualidade e para a soberania alimentar, para a ocupação harmoniosa do território, para a defesa do meio ambiente, da floresta e do mundo rural, para a coesão económica e social em vastas regiões.

Uma agricultura familiar onde o Governo falha em tudo ou quase tudo! A começar pela não concretização do Estatuto da Agricultura Familiar, que não é mais que uma “vaga declaração política” sem substância e sem qualquer vantagem para o universo dos pequenos e médios agricultores familiares em Portugal. Vejam-se os números publicados pela DGADR, a 31 de Dezembro de 2022, que nos dizem que, do universo de mais de 250 000 potenciais candidatos, apenas se conta com 3518 candidaturas, e destas, apenas se encontram atribuídos 2446 Títulos de Reconhecimento de Agricultura Familiar, dos quais, apenas 669 se encontram ativos, quase um terço de há um ano atrás.

É por isso que o PCP hoje trás a debate um projeto de lei para que o Estatuto da Agricultura Familiar se traduza no instrumento de desenvolvimento da Agricultura, do Mundo Rural e da soberania alimentar de que o país necessita. É obrigatório que se adotem medidas para promoção e concretização do Estatuto, que se reforcem as estruturas do Ministério da Agricultura e Alimentação necessárias a prestar o apoio devido aos agricultores, em especial aos beneficiários do Título de EAF e que seja posto em prática um verdadeiro programa de valorização da pequena e média agricultura, diversificada, capaz de responder às necessidades do país.

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