Áudio
As nossas cordiais saudações a todos os presentes, os membros das Comissões de Trabalhadores do sector dos transportes que aqui vieram debater e trazer a sua opinião e a sua experiência a esta audição do PCP sobre os problemas do desenvolvimento económico do país, da situação dos trabalhadores e do sector dos transportes.
Opiniões que agradecemos e tomaremos em devida conta no nosso trabalho nos mais diversos níveis da nossa intervenção.
As opiniões que aqui vieram confirmam a gravidade da situação económica e social e do sector, com particular ênfase para os problemas sociais que afectam a vida dos trabalhadores e das populações.
Estes primeiros tempos do novo governo PS mostram que não há qualquer inversão da tendência que vinha de trás de deterioração dos problemas mais agudos, seja o problema do desemprego crescente, dos despedimentos, da precariedade, do encerramento de empresas e da utilização abusiva do lay-off e da ofensiva contra os direitos laborais e sociais que expressam bem o propósito de transferir para os trabalhadores as consequências da grave crise que o país enfrenta.
Uma crise que não é apenas reflexo da actual crise do capitalismo, mas das opções de décadas de política de direita.
Isso é bem evidente na evolução e na situação do sector dos transportes e no visível e persistente caminho de declínio económico, agravamento das injustiças e desigualdades sociais que o país apresenta.
Na verdade o governo PS encerrou um ciclo de governação com todos os problemas agravados não apenas ao nível social, mas também ao nível dos nossos défices crónicos, incluindo o de transportes e logística e abriu-se este novo ciclo governativo sem que se veja o governo a dar qualquer resposta aos verdadeiros problemas dos trabalhadores, dos portugueses e do país.
O que vemos é, a pretexto da crise, crescer a impunidade contra os que põem em causa os direitos dos trabalhadores e os rendimentos do trabalho, cada vez mais desvalorizados e pressionados por uma política que aposta essencialmente num modelo de desenvolvimento assente nos baixos salários e no trabalho sem direitos.
O que vemos é um governo resistindo à mudança da sua fracassada política, a tentar fazer passar uma imagem de vítima para desviar as atenções dos problemas que é urgente resolver e tentar impor as medidas que servem essencialmente os grandes interesses e o grande capital.
Acenam com o fantasma do desemprego para justificar uma política de congelamento e degradação dos salários, como o têm feito quer responsáveis governativos, quer o principal responsável do Banco de Portugal, como se fossem os modestos salários dos portugueses que estivessem na origem do vertiginoso aumento do desemprego no nosso país e fossem a causa das fragilidades competitivas da nossa economia.
As pressões sobre os salários, ainda ontem conheceram mais um episódio por parte dos representantes das organizações do grande patronato, desta vez para condicionar e inviabilizar o aumento acordado em concertação social do próprio Salário Mínimo Nacional para o próximo ano, com a sua contra-proposta de limitação a 460 Euros o valor deste salário.
Trata-se de uma contra-proposta inaceitável que se enquadra na estratégia mais global de desvalorização real dos salários e que tem ao mesmo tempo como objectivo obter novos privilégios que lhes permita arrecadar mais uns milhões de euros à custa dos dinheiros públicos e particularmente da Segurança Social e avançar na liberalização dos despedimentos, uma medida em relação à qual já não fazem segredo.
É muito significativo que tanto o governo, como o grande patronato apenas se preocupem com o valor dos salários e façam profundo silêncio em relação aos verdadeiros factores que pesam na competitividade da economia portuguesa.
Desde logo a questão da valorização sistemática do euro em relação ao dólar, que neste último ano se agravou em cerca de 20%. Depois, para dar apenas mais um exemplo, o problema da alta factura energética que os portugueses pagam muito acima dos seus concorrentes europeus.
Sobre isto, uns e outros nada dizem, porque são os grandes interesses que são postos em causa. Não querem mexer nos colossais lucros das grandes companhias dominadas pelo grande capital.
Uns e outros sabem que não são, dominantemente, os custos e as despesas do trabalho que constituem a principal parcela dos custos das empresas.
Mas não são apenas os salários que estão na mira da ofensiva conjunta do governo e do grande patronato nacional e europeu. São também os horários de trabalho e as condições de trabalho em geral. Isso vê-se nas actuais propostas de reformulação da Estratégia de Lisboa de aprofundamento da flexigurança e que o programa do governo, já assume, em parte, na sua neoliberal proposta de “Pacto pelo Emprego”.
Um Pacto que traz no bojo, envolto numa rebuscada fraseologia, a retoma de ofensiva desregulamentadora do mercado de trabalho do anterior governo do PS.
Um Pacto que navega nas mais retorcidas teses neoliberais que fazem do direito ao emprego e ao trabalho com direitos um obstáculo à criação de emprego.
Um Pacto onde é visível a perspectiva da utilização do elevado desemprego, como argumento para avançar na concretização do Código de Trabalho e o seu aprofundamento nos domínios da desregulação dos horários e no aumento da precariedade.
Um Pacto onde é clara a intenção de responsabilização dos trabalhadores efectivos e dos trabalhadores mais velhos, pela precariedade e pelo crescente desemprego juvenil.
Para o governo do PS os responsáveis pelo crescente desemprego não são as suas políticas, a ofensiva do capitalismo contra os direitos dos trabalhadores e as condições de vida das populações e muito menos o modelo de desenvolvimento que lhe está subjacente que condena o país ao definhamento e à estagnação, mas as próprias vítimas desse modelo e dessas políticas, condenadas, na perspectiva do governo PS a terem que aceitar o aumento da exploração e a redução a zero dos seus direitos.
Vieram aqui muitos exemplos de como as administrações do sector dos transportes, sejam privadas ou subordinadas a um poder político enfeudado aos interesses privados, agem para impor uma crescente precarização das relações laborais, nomeadamente com o recurso à subcontratação e às empresas de aluguer de mão de obra para diminuir direitos dos trabalhadores, mas também das práticas para impor baixos salários, o bloqueio à contratação colectiva, as reformas compulsivas, a liquidação de direitos no plano da saúde e outras regalias que ao longo de anos contribuíram para manter um mínimo de dignidade para quem trabalha.
Os trabalhadores das empresas rodoviárias, ferroviárias, aviação civil, marítimas, portuárias, fluviais, além de serem objecto de uma maior e mais crescente exploração, viram destruídos milhares de postos de trabalho nestes últimos anos.
Vieram aqui igualmente exemplos de como o poder político dominante e as administrações das empresas procuram afastar e criar dificuldades aos trabalhadores no exercício do controlo de gestão e na sua acção em defesa dos seus direitos e do futuro das empresas e da economia nacional.
Uns, nomeadamente o governo, por via legislativa com as alterações à legislação laboral e por outra legislação avulsa, visando reduzir e condicionar a participação das organizações dos trabalhadores no exercício das actividades de fiscalização, bem patente nas alterações aos Estatutos do Metro e da CP.
Outros, directamente envolvidos na administração das empresas, agindo em clara violação da própria Lei, quer recusando a nomeação dos representantes eleitos dos trabalhadores, como aconteceu com o Conselho de Fiscalização do Metropolitano, quer sonegando as informações necessárias ao pleno e eficaz exercício de fiscalização, como aqui veio o exemplo da Carris ou recusando esclarecimentos exigidos ou ainda penalizando pecuniariamente os membros das Comissões de Trabalhadores.
De facto, como aqui foi salientado, a política de direita não só não dá resposta aos problemas da qualificação do emprego e da valorização do trabalho, como não tem respostas para garantir e promover o desenvolvimento do país, com mais criação de emprego e de mais riqueza para garantir uma vida digna e de trabalho para os portugueses.
Como muito bem aqui se disse, o Governo do PS, tem vindo a assumir, no essencial, as mesmas orientações da política de direita de desregulamentação do sector dos transportes, de privatização, desmantelamento e desmembramento das grandes empresas mostrando-se mais preocupado em criar condições para a preparação de uma nova ofensiva privatizadora das empresas públicas e das infra-estruturas do sector, do que esteve empenhado em resolver os problemas existentes.
Tem sido por isso que Portugal continua sem um verdadeiro sistema de transportes, integrado, com complementaridades entre os vários modos de transportes. Que continua a redução da oferta de serviço público e da função social dos transportes, com a subalternização dos transportes púbicos e de degradação da sua qualidade a favor do transporte privado.
Na verdade, nestes anos de governo do PS de José Sócrates em vez da solução dos problemas, temos assistido à concretização das mesmas orientações dos anteriores governos.
É esse o seu projecto para a CP e o transporte ferroviário com o desmantelamento desta importante empresa pública e a alienação das partes mais rentáveis dos serviços e das próprias linhas, dando seguimento ao desastroso caminho já percorrido e que conduziu ao encerramento de linhas, ramais e estações e à redução de serviços e de comboios, potenciando a utilização do transporte individual, assim como o recurso às rodoviárias privadas.
O mesmo podemos dizer em relação ao transporte aéreo e em relação ao sector portuário, onde permanece uma agenda escondida de privatizações das empresas estratégicas destes sectores, como é o caso das empresas TAP e a ANA associadas à construção do novo aeroporto de Lisboa.
Está hoje muito claro, e todos os dados o confirmam, que os anunciados benefícios para os utentes que resultariam da privatização do sistema de transportes públicos se traduziram, afinal, não só numa crescente incapacidade para promover uma política integrada de transportes, como se traduziram, em geral, em enormes custos para os utentes dos transportes e sem qualquer contrapartida na qualidade dos serviços prestados.
Uma política que agravou a crise que o país enfrenta.
Colocou-se aqui o problema da saída da crise e o caminho para a enfrentar. É para nós muito claro que não será com as políticas que têm sido seguidas que se vencerá a crise.
A saída para os problemas nacionais exige a concretização de uma política de ruptura, patriótica e de esquerda que tenha como eixos centrais, entre outros, a valorização do trabalho e dos trabalhadores; a defesa dos sectores produtivos e da produção nacional e um papel determinante do Estado nos sectores estratégicos, designadamente na banca, na energia, nas telecomunicações e nos transportes.
Uma política que pressupõe garantir a concretização e o desenvolvimento de um conjunto de vectores estratégicos que têm na recuperação pelo Estado do comando político e democrático do processo de desenvolvimento, a primeira grande linha de orientação visando a afirmação da soberania, a subordinação do poder económico ao poder político e o planeamento democrático.
Isso exige a afirmação da propriedade social e do papel do Estado em sectores estratégicos e a concretização de um Sector Empresarial do Estado forte e dinâmico como condição chave para a manutenção em mãos nacionais de alavancas económicas decisivas para a promoção do desenvolvimento.
Uma condição essencial para assegurar políticas visando um desenvolvimento independente e autosustentado do País, nas quais se inclui um sector de transportes e comunicações assegurando a boa mobilidade dos portugueses e a competitividade do transporte de mercadorias, na base de um sistema de transportes constituído por empresas públicas, única forma de garantir a efectiva prioridade ao serviço público e o apoio à actividade produtiva.
No fundo, uma orientação em ruptura com a política prosseguida nestes anos de governo do PS de José Sócrates e que no concreto se oriente para a promoção do desenvolvimento económico e do sector dos transportes, nomeadamente:
Na defesa da TAP, como empresa aérea de bandeira e totalmente de capitais públicos, necessária para a salvaguarda do interesse nacional e do desenvolvimento do país.
Na Manutenção Aeronáutica, realizando os necessários investimentos (Oficina de Motores e Novo Hangar, entre outros).
Na defesa da ANA, como empresa pública gestora dos aeroportos do país e da NAV, cuja privatização e colocação sobre interesses privados, nacionais ou estrangeiros, colocaria em causa todo o sector aéreo.
No que se refere à ANA não há nenhuma razão nos planos financeiro, económico ou político que justifique a decisão da sua privatização.
O PCP considera que não se justifica, nem é aceitável associar a privatização desta importante empresa pública à construção de um novo Aeroporto de Lisboa, criando nos portugueses a ilusão que o país garante uma nova infra-estrutura sem custos para o Estado, mas na verdade o que vai acontecer é a perda de receitas, de capacidade de investimento nas restantes infra-estruturas aeroportuárias e a transferência de património público a favor dos interesses do grande capital nacional e estrangeiro.
Também as consequências estão à vista de todos face à liberalização do Handling, com enormes prejuízos para todo o sector aéreo e para os trabalhadores.
Na reconstrução da unidade do sector ferroviário nacional e no seu carácter plenamente público e apostando na produção de equipamentos ferroviários e material circulante.
Na valorização do metropolitano, combatendo a subcontratação e a privatização.
Isto é, uma aposta decidida nos transportes públicos.
No momento em que se avança com a construção da rede ferroviária de alta velocidade, o PCP, aproveita esta iniciativa para mais uma vez tornar públicas as suas preocupações sobre a evolução deste projecto. Um projecto que não pode por em causa o necessário desenvolvimento e modernização da rede ferroviária convencional, que afirme a natureza pública do investimento e exploração seja condição para a promoção de uma maior incorporação da produção nacional no desenvolvimento do projecto.
A realidade do sector dos transportes tal como a realidade do país, exigem a continuação da luta pela ruptura e pela mudança.
Mudança que se constrói também com o desenvolvimento da luta em defesa dos interesses concretos dos trabalhadores, porque vai ser a luta que vai determinar a solução de muitos problemas que os trabalhadores e povo hoje enfrentam.
Luta que precisamos de preparar e estimular, porque será com a luta que forçará o pêndulo das decisões que resultam da nova correlação de forças que hoje existe na Assembleia da República e no novo quadro político.
Porque só a luta pode levar o governo a dar respostas.
Porque só a luta será determinante para abrir as portas à rectificação das injustiças e às soluções concretas de melhoria das condições de vida do povo.
Luta como aquela que recentemente travaram os trabalhadores da CP na sua longa batalha pelo direito à greve e também da CP - Carga que garantiu a manutenção dos direitos e a passagem a efectivos de todos os trabalhadores contratados a prazo.
Perante as políticas que se esboçam e os graves problemas sociais que se avolumam, os tempos que aí vêm só podem ser tempos de acção e de luta.
E o que gostaria de lhes dizer é que podem contar com o PCP para, nos mais diversos patamares da sua intervenção, nomeadamente na Assembleia da República, denunciar os ataques aos trabalhadores e suas organizações.
Podem contar com o PCP para combater a liberalização e destruição do sector dos transportes.
Podem contar com o PCP e a sua proposta para responder às expectativas e aspirações a uma vida melhor para os trabalhadores e para inverter o actual rumo que segue o país.