Sr. Presidente,
Talvez dirigindo-me mais a si do que ao Sr. Primeiro-Ministro, ao fim de uma hora de debate fico com uma sanção contraditória, estranha: Portugal é um país a pulsar com uma crise imensa, com dramas sociais, numa situação profundamente inquietante, e a Assembleia da República discute generalidades, olha para o «umbigo», particularmente o Governo.
Não quero dizer mais nada do que isto, mas penso que esta Assembleia tem o passo trocado com a realidade nacional.
Sr. Primeiro-Ministro, em relação às coisas concretas, e porque falou na qualificação como condição para fazer o nosso futuro, quero dizer-lhe que fui recentemente tratar do cartão de cidadão - aquilo que é o ex-libris da Loja do Cidadão -, na Loja das Laranjeiras, tendo estado um mês à espera de marcação.
Depois de tudo tratado na Loja, tive a garantia de que, ao fim de dois meses, vou ter esse cartão.
Mas isso não é «morte de homem», admito-o perfeitamente.
A questão central que lhe quero colocar é a seguinte: entretanto, fui procurado pelos trabalhadores dessa Loja do Cidadão, jovens licenciados, com um cartão que os define como «temporários» (é isso que os marca), com uma denominação de «assistentes administrativos», dos tais que levam 425 € de salário para casa, que estão à espera de qualificações, com tarefas de tesouraria e outras tarefas técnicas e administrativas e que continuam à espera dessa tal qualificação testada pela própria experiência.
Daqui a dois meses vou lá buscar o cartão.
Mas gostava de ouvir a opinião do Sr. Primeiro-Ministro, pois o que vou dizer a esses trabalhadores é a sua resposta a uma situação que pode ser estendida a milhares de casos em Portugal.
(...)
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Quando for novamente à Loja do Cidadão, vou dizer àqueles jovens que o Primeiro-Ministro à pergunta disse nada!
Aliás, disse que isto é o «mundo das maravilhas», que a qualificação está em desenvolvimento, só que não lhes toca a eles, porque, da parte do Primeiro-Ministro deste Governo, não há uma resposta concreta para resolver um problema concreto, que é a situação em que se encontram centenas de jovens com vínculo precário e por qualificar.
Direi isso.
O Sr. Primeiro-Ministro foi, de facto, à Loja do Cidadão, só que nem um trabalhador foi capaz de se lhe dirigir, porque imaginava, com certeza, a resposta que lhe daria.
E a resposta que acabou de dar foi: «contentem-se com o emprego que têm e já não é nada mau». No essencial, foi aquilo que aqui disse!
O Sr. Primeiro-Ministro falou do apoio ao emprego.
Quero dar-lhe uma notícia de última hora: a multinacional alemã Euronadel abandonou Portugal. Agora, hoje! Mais uma, Sr. Primeiro-Ministro!
Em relação à situação de desemprego, o Sr. Ministro das Finanças foi dar uma aula de Economia na Universidade em Faro e, num rasgo metafórico, afirmou que a crise não tem solução nos livros, nas leis de economia, que já não comporta o GPS e que, agora, a solução é deixarmo-nos guiar pelas estrelas.
Ainda dizem que não somos inovadores, que não somos criativos...
Temos um Ministro das Finanças que acredita que a solução é olhar para as estrelas... Cuidado, Sr. Primeiro-Ministro, porque olhamos para o céu e para o umbigo, como vocês fazem, e acabamos por bater com o nariz na realidade.
Foi isso, com certeza, que o inspirou, no último debate: quando falei em exemplos concretos de despedimentos, de encerramentos e de falências, o Sr. Primeiro-Ministro, com a sua arrogância costumeira, e falando de cátedra, disse, mais uma vez: «Ah, mas não fala da Qimonda!
Ah, mas não fala das minas de Aljustrel!».
Bom, nós não falamos, porque temos algum senso.
No entanto, já que fez essa afirmação, diga-me, Sr. Primeiro-Ministro, em relação às minas de Aljustrel, por que é que continuam fechadas e só há a perspectiva de abrirem em Junho.
Qual é a resposta que se dá aos mineiros?
Em relação à Qimonda, o Sr. Primeiro-Ministro precipitou-se, porque estamos todos de acordo que aquela empresa faz falta à economia nacional e ao emprego, que é importante mantê-la! Porque é que pôs esse ar arrogante e garantiu o que não podia garantir?
Diga qual é a situação da Qimonda neste momento e que medidas estão a ser tomadas para garantir o seu futuro!
(...)
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Aprenda que é mais perigoso recorrer à propaganda para esconder a realidade do que denunciá-la em termos de combate político!
O que fazemos é denunciar a situação! Alertamos! Essa é obrigação de qualquer Deputado, de qualquer grupo parlamentar, tendo em conta a realidade do nosso país.
Sr. Primeiro-Ministro, claro que os mineiros de Aljustrel estão desconfiados - «gato escaldado de água fria tem medo».
Perante um Governo que prometeu tanta coisa, mas que baixou praticamente todas as bandeiras dessas promessas, há profundas razões para que os trabalhadores continuem a ter inquietações em relação ao seu futuro.
Uma pergunta concreta, Sr. Primeiro-Ministro - trata-se de uma preocupação: gostaria de saber se o Governo português admite a entrega da maioria do capital do BCP a capital estrangeiro.
O que é que o Governo português pensa fazer para impedir que o capital estrangeiro tome conta do nosso primeiro banco privado?
Gostaria de ouvir a sua opinião.