O PCP apresentou um Projecto de Lei que propõe a alteração do Código de Processo Penal estabelecendo a obrigatoriedade de assistência do arguido por defensor no inquérito e garantindo maior celeridade no julgamento da criminalidade de menor gravidade. João Oliveira afirmou que o alcance prático desta proposta é o de estabelecer como obrigatoriedade aquilo que já hoje é um direito do arguido, o de fazer-se acompanhar por defensor nas diligências processuais para as quais seja convocado.
Código Penal, Código da Execução das Penas e Código de Processo Penal
Procede à alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro,
Procede à terceira alteração ao Código da Execução das Penas e medidas privativas de liberdade aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, e
Altera o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro,
(propostas de lei n.os 75/XII/1.ª, 76/XII/1.ª e 77/XII (1.ª)
Altera o Código de Processo Penal, estabelecendo a obrigatoriedade de assistência do arguido por defensor no inquérito e garantindo maior celeridade no julgamento da criminalidade de menor gravidade
(projeto de lei n.º 266/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Sr.ª Ministra da Justiça,
Apesar da exiguidade do tempo que lhe resta, julgo que, ainda assim, será suficiente para dar resposta a duas questões muito concretas que tenho para lhe colocar.
A primeira questão, Sr.ª Ministra, tem a ver com a valoração das declarações não só do arguido mas também das testemunhas, em sede de audiência de julgamento. Quero perguntar-lhe, Sr.ª Ministra, se já se deu conta de que as propostas que apresenta significam a possibilidade de um arguido ser condenado depois de ser julgado sem que estejam presentes ele próprio e as testemunhas.
A proposta que a Sr.ª Ministra veio aqui justificar, em relação à valoração das declarações quer do arguido, quer das testemunhas, permite isto: um arguido ser condenado sem que esteja presente no julgamento, nem sequer que estejam presentes as testemunhas.
A segunda pergunta, Sr.ª Ministra, tem a ver com o Código de Execução das Penas. A Sr.ª Ministra utiliza um argumento que tem a ver com a ressocialização dos reclusos estrangeiros que são condenados à expulsão do País. Gostava de saber, Sr.ª Ministra, em que é que esse juízo sobre a ressocialização dos condenados não é aplicável também aos condenados estrangeiros e aos nacionais que não foram sujeitos a uma pena de expulsão do País.
(…)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo:
Vou aproveitar não só para apresentar o projeto de lei do PCP mas também para tomar posição relativamente às propostas de lei.
O projeto de lei que o PCP apresenta incide fundamentalmente sobre duas matérias.
Por um lado, incide na assistência do arguido pelo defensor durante o processo, nomeadamente durante a fase do inquérito. Recuperamos uma proposta que já apresentámos anteriormente, na revisão de 2007, a qual vai, aliás, no sentido da proposta apresentada pelo Governo, com uma redação que alarga o âmbito da assistência do arguido pelo defensor, permitindo, designadamente, a assistência por defensor em todos os atos processuais em que o arguido tenha a obrigação de estar presente ou possa prestar declarações.
Por outro lado, apresentamos também propostas relativamente aos processos sumário, abreviado e sumaríssimo que resultam de um conjunto de outras propostas que temos apresentado na Assembleia da República, em sede de revisão do Código de Processo Penal, e que gostaria de confrontar com as soluções que o Governo apresenta, uma vez que consideramos que os mecanismos atualmente previstos para a utilização quer do processo sumário, quer do processo sumaríssimo, quer do processo abreviado, não são hoje utilizados com a abrangência com que poderiam ser. E isto porquê? Devido à exiguidade dos prazos a que está sujeita a utilização dos processos especiais. Muitas vezes, por falta de agenda do tribunal ou por necessidade de obtenção de meios de prova — os quais, apesar de poderem ser obtidos em curto prazo, não são compatíveis com os prazos definidos para os respetivos processos —, esses prazos acabam por impedir a utilização dos processos especiais, nomeadamente do processo sumário, remetendo os processos para o processo comum.
Portanto, ao contrário do Governo, entendemos que a solução para a utilização do processo sumário não é alargar o processo sumário a crimes de maior gravidade mas, sim, permitir a utilização generalizada do mesmo nos crimes de menor gravidade, o que já hoje é possível, apesar de depois, na prática, não se verificarem as condições que permitam a sua utilização.
Relativamente às propostas que o Governo apresenta, gostaria, Sr.ª Ministra da Justiça, de começar por identificar aquelas com as quais concordamos, ainda que possam merecer algumas propostas de alteração que estamos a preparar e que apresentaremos na especialidade.
Em relação ao Código Penal, Sr.ª Ministra, concordamos com a perspetiva de fazer depender de acusação particular os crimes de furto nas condições previstas. No entanto, não prescindimos da necessidade de distinguir muitas vezes o bem objeto do furto, e até as circunstâncias concretas em que ocorre o furto, no sentido de fazer também alguma distinção da natureza social, da origem social e até da importância dos bens, porque julgamos que o furto de bens alimentares ou de bens de primeira necessidade não é o mesmo que o furto de telemóveis ou de outro tipo de bens. Julgamos que essa consideração deve ser tida em conta pelo que apresentaremos, na especialidade, propostas nesse sentido.
No que concerne à suspensão da prescrição dos crimes, estamos de acordo com as considerações que o Governo faz. Julgamos, no entanto, que os prazos previstos para a suspensão estão desadequados e proporemos, na especialidade, um mecanismo de proporcionalidade em relação ao próprio prazo de prescrição dos crimes, porque julgamos que essa pode ser uma forma de resolver o problema existente na proposta que o Governo apresenta.
Já no que respeita às falsas declarações, Sr.ª Ministra, temos algumas dúvidas sobre a adequação desta proposta e até sobre as próprias intenções do Governo, uma vez que o texto da proposta de alteração ao Código Penal vai muito além das intenções assumidas pelo Governo. Todavia, estamos disponíveis para apresentar propostas no sentido das preocupações que o Governo assume, porque julgamos que a redação da lei pode ser alterada de modo a adequar essas necessidades.
Quanto ao Código de Processo Penal, concordamos com as propostas apresentadas pelo Governo em relação à resposta, hoje obrigatória, do arguido no que respeita aos seus antecedentes criminais; à manutenção do termo de identidade e residência até um momento posterior do ponto de vista processual; ao alargamento das exigências de assistência do arguido por defensor; e também — e este é um aspeto muito importante — à documentação dos atos, nomeadamente utilizando os meios audiovisuais.
Sr.ª Ministra, no entanto, o Governo apresenta propostas que nos suscitam as maiores dúvidas e até as maiores discordâncias e, por exiguidade do tempo, vou referir muito sucintamente algumas delas.
Começo pelo Código da Execução das Penas. A execução da sanção acessória de expulsão do País está hoje ligada às condições da liberdade condicional por haver um equilíbrio, que deve ser mantido, em relação às exigências para a antecipação dessa pena de expulsão do País e ao que está previsto quanto à liberdade condicional.
O Governo propõe a rutura desse equilíbrio sem justificar esta opção, e essa é uma opção com a qual discordamos profundamente.
No que respeita às declarações do arguido e das testemunhas, a nossa discordância é frontal. As alterações que o Governo propõe aos artigos 356.º e 357.º, no que respeita à valoração das declarações das testemunhas e do arguido, significam a possibilidade de utilização dessas declarações para condenar um arguido em sede de julgamento, quando não esteve presente nem o arguido nem as testemunhas. E esse é um alargamento, Sr.ª Ministra, com o qual não estamos de acordo.
Concordamos com a necessidade de rever o regime de valoração das declarações (particularmente, das testemunhas, não tanto do arguido), sobretudo para impedir que as acusações acabem por chegar à fase…
Sr. Presidente, esta matéria, se calhar, justificava outra grelha de tempos, mas vou concluir o mais depressa possível.
Sr.ª Ministra da Justiça, é preciso alterar este regime para impedir que as testemunhas, convenientemente, se esqueçam daquilo que disseram na fase de inquérito ou apresentem uma versão contraditória àquela que apresentaram em sede de inquérito. As propostas apresentadas pelo Governo é que vão muito além destas necessidades e ultrapassam em muito o que seria aceitável.
A concluir, Sr.ª Ministra, em relação ao processo sumário, queria apenas dizer que não é a opção pelo alargamento da utilização do processo sumário aos crimes de maior gravidade que vai resolver os problemas de celeridade da justiça. Pelo contrário, essa opção vai colocar sobre os tribunais uma pressão de celeridade na realização da justiça que não é compatível com o julgamento de crimes de maior gravidade e, por isso, já apresentámos uma proposta alternativa.