Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

PCP apresenta projecto que regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas

Sr.ª Presidente,
Srs. deputados,

A passagem da responsabilidade das decisões sobre cultivo dos Organismos Geneticamente Modificados da União Europeia para os Estados membros trouxe a questão dos OGM novamente para a ordem do dia. Perante esta possibilidade, pelo menos dois ministros, já manifestaram a intenção de não impor limitações.

Os impactos positivos do desenvolvimento científico e tecnológico na área da biotecnologia, não podem deixar de pugnar por uma criteriosa aplicação do princípio da precaução, em particular ao sector da agricultura relativamente ao qual existe uma crescente pressão para a introdução de organismos geneticamente modificados.

A agricultura dominante em Portugal é a das explorações agrícolas familiares, de pequena e média dimensão. As explorações de carácter empresarial e de grandes dimensões, centrada em produções intensivas e de massa, que têm vindo a consolidar a sua posição por acção do actual Governo, têm também maior apetência para procurar o lucro máximo através da procteção ecológica mínima. A agricultura nacional só tem a ganhar com a defesa e promoção da qualidade de um produto nacional, “biológico”, de espécies regionais e tradicionais, ao invés da padronização da produção, de massa e de modo intensivo.

A actual legislação responsabiliza o produtor de agricultura convencional ou biológica pela tomada de precauções que limitem a contaminação das suas explorações pelas transgénicas vizinhas, cujos produtores são, pouco mais que responsabilizados pela notificação dos produtores adjacentes. São já conhecidos, no mundo, os casos dos agricultores judicialmente perseguidos por deterem variedades patenteadas que chegaram às suas explorações por polinização cruzada.

Portugal não terá vantagens em optar pelo cultivo transgénico. O Estado deve zelar pela capacidade produtiva da generalidade dos agricultores portugueses, por condições que lhes assegurem rendimentos e condições de vida digna, proporcionando aos portugueses uma produção agroalimentar simultaneamente sadia e de qualidade. Ao invés copia soluções que põem em causa os modos de produção convencional e que apenas servem os interesses de alguns grandes produtores e do agronegócio.

A actual legislação sobre zonas livres de organismos geneticamente modificados inibe na prática a declaração como zona livre, ao atribuir supremacia ao direito de cultivar transgénicos sobre o direito de os não cultivar. Com a legislação atual, basta um qualquer proprietário agrícola de uma determinada região pretender cultivar organismos geneticamente modificados para que as declarações de zona livre deixem de fazer efeito.
Com o presente Projecto de Lei, o PCP propõe que a agricultura convencional e/ou biológica sejam a regra e que todo o país seja considerado zona livre de transgénicos, remetendo o cultivo de organismos geneticamente modificados para o âmbito da excepção. Hoje, em nome do princípio da precaução, admitimos a excepção para a investigação e a experimentação científica. Amanhã, face ao desenvolvimento da ciência e técnica, os portugueses saberão decidir o que é melhor para os agricultores e para o País.

Disse.

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