Intervenção de Paulo Sá na Assembleia de República

PCP apresenta Projecto para Lei de Bases do Ambiente

Paulo Sá na apresentação do projecto que estabelece as bases para as políticas do ambiente, afirmou que A Lei de Bases vigente, vinte e cinco anos após a sua entrada em vigor, não dá, nem poderia dar, respostas adequadas a questões tão importantes e atuais como alterações climáticas, valorização e tratamento dos resíduos, “pegada ecológica” e sustentabilidade ambiental, padrões de consumo e de produção, bem-estar animal e minimização de exploração de outros seres vivos, entre outras. Urge, pois, modernizar esta lei, aperfeiçoando e alargando o seu conteúdo.

Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados,

A atual Lei de Bases do Ambiente, aprovada em 1987, contém os princípios gerais de uma política ambiental assente no papel determinante do Estado, no âmbito da qual o direito a um ambiente humano e ecologicamente equilibrado é assegurado pela ação de organismos públicos, complementada com a participação e envolvimento dos cidadãos.

Contudo, por ação e omissão de sucessivos governos do PS, PSD e CDS, o Estado não tem cumprido cabalmente as suas funções de defesa e preservação do ambiente, e de harmonização do desenvolvimento económico e social com a gestão sustentável dos recursos naturais.

Pelo contrário, ao longo dos anos caminhou-se no sentido de fragilizar e até destruir a capacidade de intervenção do Estado e dos seus organismos próprios. Esta minimização da presença do Estado serviu, e continua a servir, uma estratégia de mercantilização dos recursos naturais, colocando o seu valor ecológico e correspondente valor económico ao serviço de interesses privados, conduzindo à degradação da riqueza natural e à privação das populações do pleno usufruto dessa riqueza.

Esta estratégia conheceu recentemente novos desenvolvimentos com o PREMAC – Plano de Redução e Melhoria da Administração Central, que se traduziu num salto qualitativo na redução da capacidade de intervenção do Estado a todos os níveis e, em particular, na conservação e proteção da natureza, agravada com a aprovação do Orçamento do Estado para 2012, no qual o Governo, adotando a política do “mais por menos”, efetivamente abdica das suas responsabilidades no que à preservação do meio ambiente diz respeito.

Rejeitando a redução do papel do Estado no cumprimento das suas funções constitucionais e a consequente transferência para os grandes grupos económicos e financeiros de setores potencialmente lucrativos na área do ambiente, o PCP apresenta uma Lei de Bases em que o papel do Estado, como garante do direito ao ambiente, é reafirmado e aprofundado.

Mas o projeto de lei do PCP vai também mais longe no que diz respeito à forma como é abordada a relação entre o homem e a natureza. Contrariamente às erróneas conceções assentes no antagonismo entre estas duas entidades, o projeto do PCP assume a possibilidade de uma relação equilibrada e harmoniosa entre o ser humano e o meio ambiente, capaz de abrir caminho ao desenvolvimento económico e ao progresso social e, simultaneamente, à preservação da natureza, da qual depende o bem-estar de todos os seres humanos e, em última análise, a sobrevivência da própria espécie.

A Lei de Bases vigente, vinte e cinco anos após a sua entrada em vigor, não dá, nem poderia dar, respostas adequadas a questões tão importantes e atuais como alterações climáticas, valorização e tratamento dos resíduos, “pegada ecológica” e sustentabilidade ambiental, padrões de consumo e de produção, bem-estar animal e minimização de exploração de outros seres vivos, entre outras. Urge, pois, modernizar esta lei, aperfeiçoando e alargando o seu conteúdo.

Este é um dos objetivos do Projeto de Lei que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta à Assembleia da República. Contudo, não nos limitamos a adicionar temas à lei atual. Introduzimos novos e inovadores mecanismos legais para dar combate à degradação dos recursos naturais e aos impactos negativos das atividades humanas no meio ambiente.

Introduzimos vetores de intervenção política que se assumem como fundamentais, nomeadamente sobre riscos, catástrofes ambientais, danos e segurança ambiental; sobre a utilização de organismos geneticamente modificados; sobre o habitat humano, o bem-estar e a qualidade de vida; sobre a integridade do ciclo da água, alterações climáticas, modelo produtivo e gestão de materiais obsoletos. Introduzimos ainda uma abordagem integrada do sistema produtivo e dos seus efeitos na natureza, a única capaz de conciliar o desenvolvimento humano com a preservação das condições naturais que lhe são essenciais.

Além disso, o Projeto de Lei do PCP propõe também a introdução de disposições legais sobre a conservação da natureza, em torno de uma abordagem transversal das riquezas naturais, integrando a sua componente estética, cultural, económica, humana e ecológica.

Este é um Projeto de Lei que não opõe os hábitos, práticas e atividades tradicionais e autóctones à conservação da natureza, que não afasta as populações das áreas e valores a proteger e que não estimula o abandono do território pela sua ocupação tradicional. Pelo contrário, afirma que a proteção da natureza e a salvaguarda dos valores ambientais será tanto mais eficaz quanto maior for o envolvimento das populações e será tanto mais justificada quanto maior for o benefício dessa proteção para a generalidade dos que dela podem usufruir. Contudo, sempre que, com base em elementos cientificamente comprovados, se considere fundamental a limitação de uma atividade ou de um direito das populações a bem da salvaguarda dos valores naturais, o projeto do PCP prevê que os planos de ordenamento das áreas protegidas sejam acompanhados por planos de desenvolvimento e investimento regionais para compensar essas populações.

Embora, o Projeto de Lei que aqui apresentamos se traduza num significativo passo em frente para a concretização dos direitos previstos na Constituição da República Portuguesa, não temos dúvidas que a compatibilização plena entre a preservação da natureza, por um lado, e o desenvolvimento humano, por outro, não poderá ocorrer no quadro do sistema económico e social capitalista, em que a obtenção de lucro e a acumulação de capital se sobrepõe à procura do bem-estar das populações e à proteção da natureza. Só a superação do modelo de produção capitalista permitirá harmonizar a relação do homem com a natureza, travando a sobre-exploração dos recursos naturais, biológicos e geológicos.

O Projeto de Lei de Bases do Ambiente do PCP introduz questões centrais da política ambiental dos dias de hoje, não numa perspetiva meramente mitigadora, mas também transformadora, que faz do bem-estar das pessoas e da qualidade de vida o padrão e o motor para um desenvolvimento harmonioso com a natureza e em equilíbrio com a sua capacidade de suporte e de renovação.

Disse.

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