Comunicado do Gabinete de Imprensa dos Deputados do PCP ao PE

Parlamento Europeu aprova relatórios sobre a actuação da troika

1. Os relatórios aprovados pelo Parlamento Europeu e o seu conteúdo final visam essencialmente branquear as responsabilidades da União Europeia (UE), dos governos nacionais e das forças políticas da direita e da social democracia na profunda crise económica, social e política em que lançaram vários países por via da imposição de memorandos de entendimento que como a realidade comprova são autênticos pactos de agressão contra os trabalhadores e os povos e instrumentos de empobrecimento, destruição económica e retrocesso social.

Tal objectivo é indissociável das manobras ideológicas em torno da mistificação da real situação social e económica nos Estados membros da União Europeia quando se aproximam as eleições para o Parlamento Europeu. A prová-lo está o facto de os Relatórios agora aprovados conterem um conjunto de alibis que procuram apresentar a intervenção das troikas como uma “solução necessária” quando a realidade comprova que ela se afirmou como mais um problema e factor de aprofundamento da crise.

2. O relatório aprovado pela maioria do PE - em que se incluíram os deputados do PSD, CDS, PS e Rui Tavares – insiste na manipulação de que a crise é uma fatalidade e que portanto a imposição dos memorandos de entendimento da troika era o único caminho possível. Tal posição tenta mais uma vez ocultar as reais razões da crise que residem na políticas e nos pilares da União Europeia, nomeadamente: o impacto do mercado interno, de políticas comuns como a Política Agrícola Comum e da Política Comum de Pescas; da liberalização do comércio internacional, dos processos de liberalização e privatização que decorrem da estratégia UE 2020; da política do euro forte, do Pacto de Estabilidade, da “convergência nominal” e da liberalização da circulação de capitais.

3. Simultaneamente estes relatórios tentam, mais uma vez e em linha com toda a produção política e ideológica do Conselho e da Comissão, escamotear o facto inegável de que a intervenção da troika visa garantir a os lucros dos grandes grupos económicos, por via de um processo de concentração e a centralização de capital, processo bem patente no aumento dos lucros do capital financeiro e do número de milionários e suas fortunas em países massacrados pela pobreza como é o caso de Portugal.

4. O texto aprovado por esta maioria de deputados e que é agora hipocritamente apresentado por alguns como uma “crítica” à troika, visa na realidade legitimar e “democratizar” o processo e a filosofia que presidiu à intervenção da troika, por via de um “pedido” de maior “transparência” nas suas decisões. Esta é uma das razões de fundo pela qual o PCP se opôs a estes relatórios: é impossível legitimar aquilo que na sua essência é ilegítimo, porque injusto e violador da soberania de Portugal. É impossível “democratizar” um processo que é na sua génese anti-democrático porque da troika, procurando legitimar e “democratizar” um processo que, quer pela decisão político-institucional, quer pelos objectivos e consequências graves sentidas pelos trabalhadores e pelo povo português, é antidemocrático e atenta contra princípios e direitos consagrados na Constituição da República Portuguesa.

5. Contrariamente ao que afirma este relatório, a intervenção da troika não decorreu da “impreparação da UE e das instituições internacionais” para fazerem face à crise. Essa intervenção constituiu um plano coordenado entre a UE, o FMI e os subscritores nacionais (PS, PSD, CDS/PP) para transformar dívida privada em dívida pública, injectando apoios e garantias do Estado na banca e nos grandes grupos económicos, entregando recursos públicos à agiotagem e especulação dos mercados financeiros às custas do roubo dos salários e pensões, da destruição de serviços públicos, do desemprego, da destruição da capacidade produtiva, do agravamento dos défices da economia nacional e do aumento da dívida pública.

Este é o lastro da correcção dos "desequilíbrios macroeconómicos” e da “consolidação orçamental” que a maioria do PE se limita a “lamentar”. O relatório define um roteiro para a continuação da política da troika, com ou sem troika, o que agravará ainda mais a situação desastrosa em que se encontram países como Portugal, cujos indicadores económicos, nomeadamente a queda abrupta do PIB e do investimento, da produção agrícola, industrial e de energia, a queda do consumo público e privado, sobretudo das famílias, denunciam o desastre económico em curso com agravadas consequências sociais.

6. A maioria do PE insiste na tese da inevitabilidade da intervenção da troika e mantém intocáveis todos os mecanismos de concentração de capital, nomeadamente a política monetária do BCE. Relativamente a Portugal tal mistificação procura esconder a existência de alternativas. Mas as alternativas existem e passam obrigatoriamente pelo fim imediato do Memorando de Entendimento e da intervenção da troika, e pelo início urgente de um processo de renegociação da dívida pública portuguesa nos seus montantes, prazos, juros e condições de pagamento, adequando-as às necessidades de desenvolvimento económico e social do País, nomeadamente no que se refere a índices como o desemprego, o crescimento do PIB e da balança comercial.

7. O que a votação deste relatório deixa igualmente claro é o comprometimento do PSD, CDS/PP e PS com a continuação da política da troika, com ou sem programa cautelar ou outro qualquer instrumento. Tal posicionamento ficou muito claro na decisão destes três partidos votarem contra uma alteração apresentada pelos deputados do PCP que defendia a revogação imediata do Pacto para o Euro Mais, do Pacto de Estabilidade, da governação económica (six pack e two pack) e do chamado "tratado orçamental", assim como o fim do processo do semestre europeu, instrumentos e processos que asseguram a continuação da política da troika para além da vigência do memorando de entendimento.

Um posicionamento confirmado ainda pela rejeição por estes três partidos de uma outra proposta de alteração do PCP que previa a criação de um programa da UE para os países com Memorando de Entendimento que desse prioridade à solução dos problemas sociais e à defesa, valorização e promoção dos recursos nacionais de cada um dos países afectados e da sua capacidade produtiva, condição determinante para a reposição dos salários, pensões e direitos roubados.

8. A proposta de criação de um "Fundo Monetário Europeu" - apresentada como a grande solução para que a UE recupere a sua autonomia face ao FMI - não passa de uma hipócrita tentativa de desculpabilizar a acção da UE na troika (através do BCE e da Comissão Europeia) e da maioria política que a domina, procurando reabilitá-las sobretudo tendo em vista as eleições para o PE.

Sobre esta proposta importa afirmar claramente que as políticas do FMI e da UE são na sua essência e linhas orientadoras iguais. Não é por um Fundo Monetário ser exclusivamente “Europeu”, ou por ter essa designação, que a sua natureza e objectivos ao serviço da concentração e centralização de capital nos grandes grupos económicos serão alteradas, como aliás se pode comprovar na concepção e funcionamento do Mecanismo Europeu de Estabilidade, um fundo inspirado no FMI e a ele ligado na acção, cujo acesso aos seus fundos é condicionado à implementação das mesmas políticas de redução de salários e pensões, de destruição de emprego, de destruição de serviços públicos fundamentais, de privatização de quase todas as esferas da economia, de política fiscal em favor do capital e em detrimento do trabalho.

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