Projecto de Resolução N.º 791/XV/1.ª

Para uma nova política de proteção civil

Exposição de motivos

O modelo conceptual e jurídico do Sistema de Proteção Civil em vigor foi consagrado em 2006 e 2007, na sequência dos incêndios florestais ocorridos no país em 2003 e 2005.

Ao longo dos 10 anos de vigência do modelo este nunca foi globalmente avaliado.

Neste período foram-se fazendo ajustamentos regulamentares, sem que deles tivesse resultado qualquer aprofundamento de substância, apesar de muitos terem identificado, em tempo útil, diversas vulnerabilidades tanto no ponto de vista estrutural como operacional.

Chegados ao verão e outono de 2017, confrontados com a catástrofe dos incêndios florestais ocorridos e junho e outubro, foram dramaticamente expostas as fragilidades de um sistema que tem por missão primária a proteção da vida e dos bens dos cidadãos.

O balanço desta catástrofe é conhecido e não deve, em circunstância alguma, ser minimizado. O número de mortos (115) e o número de feridos (350), para além da dimensão dos prejuízos materiais registados, falam por si.

Na sequência desta situação, foi desencadeada uma ampla discussão na sociedade portuguesa sobre o que falhou para que tão grave situação se tivesse verificado. De uma forma mais ou menos explicita, todos os diagnósticos feitos convergem nos seguintes pontos: falharam as políticas de sucessivos governos que conduziram o país aos graves problemas de desordenamento florestal, falta de prevenção e erradas orientações para o sistema de proteção civil.

A nova Lei Orgânica da ANEPC, que o PCP contesta, acabou com as estruturas distritais existentes, foi concebida a pensar no acesso a fundos europeus, consagrou a crescente militarização do sistema e insiste na subalternização dos Bombeiros, apesar destes assegurarem uma presença de proximidade como mais nenhuma outra força e garantirem mais de 95% das missões de socorro no país.

Foi criada a AGIF, as Comissões Regionais e as subcomissões, que fazem planeamento para os Municípios executarem.

Para o Grupo Parlamentar do PCP, é necessário pensar e preparar o futuro.

É necessário concluir sobre o que deve ser a proteção civil e o que fazer para dotar o sistema de proteção civil de mais eficácia no desempenho das missões que lhes estão confiadas, sem esquecer que a proteção civil não se esgota nos incêndios, mas abarca todas as suas vertentes.

Revisitando as conclusões do Encontro Nacional de Quadros do PCP sobre Proteção Civil, realizado em 2007, do Seminário “Do papel e política do Estado aos meios necessários – O que falta fazer na Proteção Civil?” realizado em 13 outubro 2022, e as diversas audições públicas, identificámos várias medidas que urge serem tomadas.

Esta avaliação dá força à exigência imediata de uma nova política de proteção civil, que aposte decisivamente na prevenção dos riscos coletivos, na solidez da resposta aos eventos extremos, na formação das populações e na qualificação e valorização dos agentes.

A proteção civil é uma questão central para o desenvolvimento económico e social do País e para as populações, matéria em que o PCP está em condições e quer dar um contributo próprio, com propostas justas, com o pensamento sempre presente na defesa da segurança e da vida humana.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, considera que a política capaz de dotar o Sistema de Proteção Civil com as condições necessárias para responder com eficácia às missões que lhe estão confiadas deve assentar nos seguintes princípios e medidas fundamentais:

  1. Promoção de uma ampla reestruturação do modelo de Sistema de Proteção Civil vigente em Portugal, assegurando a efetiva participação de todos os agentes e população em geral, num debate público sobre o modelo organizativo e jurídico a adotar, e abrangendo todas as áreas de socorro e salvamento;
  2. Consideração da proteção civil como parte integrante dos diferentes instrumentos de planeamento e ordenamento do território, designadamente o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT), Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT) e Planos Diretores Municipais (PDM);
  3. Dotação do Sistema de Proteção Civil, sua estrutura e agentes, a todos os níveis, com os meios e recursos técnicos, financeiros e humanos inerentes à sua missão;
  4. Desmilitarização da estrutura da ANEPC, valorizando perfis específicos de qualificação dos diferentes agentes e instituições do sistema, designadamente os Bombeiros de Portugal, para o desempenho de cargos de direção e comando no referido organismo;
  5. Promoção de uma ação permanente de sensibilização, informação e formação dos cidadãos, no domínio da autoproteção face aos riscos, afetando aos programas concebidos com este fim os adequados recursos para a sua execução, atribuindo esta missão aos corpos de bombeiros de todo o território nacional;
  6. Atualização da legislação reguladora da prevenção e combate aos riscos tecnológicos, designadamente nas empresas e grandes complexos industriais, no âmbito da segurança das zonas envolventes e respetivas populações, e garantia dos meios necessários ao combate;
  7. Promoção, em articulação com as instituições de ensino superior, de estudos científicos; elaboração de cartas de risco e reavaliação dos Planos de Emergência, tendo por base a execução de uma avaliação nacional de risco;
  8. Reforço do financiamento das câmaras municipais para que disponham dos adequados meios técnicos e financeiros para que os serviços municipais de proteção civil possam desempenhar cabalmente a sua missão;
  9. Transferência para as câmaras municipais dos valores referentes à cobrança dos prémios de seguro, atualmente utilizadas para financiamento parcial da ANEPC, sendo esta verba utilizada para suporte orçamental das estruturas municipais de proteção civil, nomeadamente corpos de bombeiros profissionais e/ou voluntários;
  10. Promoção de uma gestão integrada dos fundos comunitários disponíveis para o investimento no sistema de proteção civil, através de uma comissão criada no âmbito do MAI, cuja composição integre a representação da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, da Associação Nacional de Freguesias e da Liga dos Bombeiros Portugueses;
  11. Integração das matérias de proteção civil nos currículos escolares, designadamente no Ensino Básico;
  12. Criação, em todos os corpos de bombeiros voluntários do país, de Equipas de Primeira Intervenção (EIP), de composição diferenciada e regulada pela tipificação de risco do território municipal, tendo por base os contratos de desenvolvimento previstos na Lei nº. 32/2017 de 13 de agosto (Regime Jurídico das Associações Humanitárias de Bombeiros); que cubram as 24 horas por dia e todos os dias da semana.
  13. Garantia de prémio aos elementos dos corpos de bombeiros voluntários que integrem Equipas de Combate a Incêndios (ECIN) e demais grupos constantes no Dispositivo Anual de Combate aos Incêndios Florestais;
  14. Melhoria dos valores de cobertura dos seguros de acidentes pessoais e acidentes profissionais que cobrem os riscos de morte e invalidez permanente, incapacidade temporária absoluta e total, e tratamentos médicos dos bombeiros;
  15. Garantia da qualificação e formação dos agentes de proteção civil, em geral, e dos bombeiros em particular, designadamente através do aprofundamento dos modelos e conteúdos de formação vigentes e a sua adequação às exigências dos novos riscos;
  16. Criação de um “modelo decisório” que permita definir objetivamente o número mínimo de efetivo de bombeiros, tipologia de veículos adequados e outros equipamentos a cada concelho, tendo em conta, entre outros, os riscos associados ao concelho, área territorial, número de habitantes e outros indicadores;
  17. Aumento do valor orçamentado para financiamento das corporações de bombeiros e definição do financiamento público para cada concelho com base no “modelo decisório”;
  18. Aprovação de um novo regime de financiamento das Associações Humanitárias de Bombeiros, enquanto entidades detentoras de corpos de bombeiros voluntários, tendo por base a tipificação de risco das suas áreas de atuação própria;
  19. Definição de um mecanismo que permita a criação de corpos de bombeiros de âmbito territorial mais alargado que o concelhio, otimizando os recursos humanos e materiais existentes e flexibilizando as áreas de atuação;
  20. Envolvimento dos corpos de bombeiros na implementação das medidas de adaptação às alterações climáticas, potenciando a sua implantação no território nacional.
  21. As missões de proteção civil, designadamente de combate a fogos rurais e de busca, salvamento ou evacuação de doentes e sinistrados, serem dotadas de meios aéreos próprios, de propriedade e gestão pública, capazes de responder com prontidão onde e quando seja necessário.
  22. A proteção civil assumir o socorro marítimo e a vigilância e salvamento nas praias.
  • Segurança das Populações
  • Projectos de Resolução
  • Proteção Civil