Amigas e amigos, camaradas
“Cumprir a Constituição, assegurar o desenvolvimento soberano do País”, é o tema que nos trás aqui hoje, neste último debate inserido na campanha do nosso partido “Por uma política alternativa patriótica e de esquerda”, campanha que tem por objectivo, como diz o Comité Central, “...ampliar em largos sectores do povo português a convicção de que não só é necessária como é possível uma política alternativa à política de direita, de que o PCP é portador...”.
A actual crise capitalista e as políticas de destruição da economia, aumento da exploração e liquidação de direitos, não apenas estão a pôr em causa o desenvolvimento de Portugal como, a não serem travados, colocam o nosso país no limiar de um novo sistema económico e dum novo regime político, liquidando o regime democrático e a nossa soberania, conquistados com a Revolução.
O governo mais à direita depois do 25 de Abril, governo do grande capital, entendeu chegada a oportunidade da revanche, e sua política não tem precedentes no plano económico, social e político.
A estratégia é clara: desmantelar o que resta do regime democrático.
Este objectivo só será alcançado à custa das liberdades e dos direitos de participação democrática dos cidadãos e em particular dos trabalhadores e das suas organizações representativas. E só será consumado afrontando a Constituição da República.
A nossa Constituição, pelo seu conteúdo progressista é, e será sempre, um sério obstáculo à concretização dos seus projectos em matéria de direitos dos trabalhadores, de privatização de serviços públicos e de desmantelamento dos sistemas públicos de saúde, segurança social e ensino e mesmo de reconfiguração do sistema político e dos poderes dos órgãos de soberania.
Como o PCP tem dito e repetido, não é na Constituição que estão as causas da crise, mas antes no seu reiterado incumprimento.
Bem ao contrário, é na Lei fundamental, e no respeito pelos seus princípios e normas, que se podem e devem encontrar as saídas para a dramática situação com que o país está confrontado.
A situação que o país vive não se deve à Constituição, mas sim ao seu incumprimento por aqueles que juraram cumpri-la e fazê-la cumprir, através de políticas de direita sistematicamente aplicadas por sucessivos governos, que frontalmente contrariam as suas normas e princípios.
Não é devido à Constituição que o país enfrenta a gravíssima crise económica e social em curso - se a Constituição fosse cumprida o país estaria em melhores condições de responder à crise económica; por exemplo, com um sector empresarial do Estado com intervenção decisiva nas áreas estratégicas.
Não é devido à Constituição que aumenta a desigualdade, a exploração e a pobreza na nossa sociedade - se a Constituição fosse cumprida não avançaria o corte sistemático nos salários e nas prestações sociais, empobrecendo os trabalhadores, enquanto a riqueza se concentra nas mãos de poucos.
Não é devido à Constituição que o país enfrenta elevados défices estruturais e que vê definhar a produção nacional - se a Constituição fosse cumprida não seriam destruídos o aparelho produtivo e a produção nacional.
Não é devido à Constituição que perto de 1,5 milhões de portugueses estão desempregados, sem conseguir criar riqueza para si e para o seu país - se a Constituição fosse cumprida a prioridade de criação de emprego com direitos seria uma realidade.
Não é devido à Constituição que a soberania nacional se vê amputada e condicionada - se a Constituição fosse cumprida Portugal pugnaria nas suas relações internacionais, incluindo na União Europeia, por uma política de cooperação visando o desenvolvimento e a paz.
Nesta “questão constitucional” há uma outra vertente, a do regime democrático, que julgo valer a pena relevar.
Sabemos que para os grandes interesses económicos tem sido fundamental a instrumentalização e subordinação do poder político.
Mas o que temos visto é que, para aqueles que colocaram o pais em estado de excepção, (excepção feita, já se vê, ao grande capital e aos seus interesses), isso já não basta. Eles almejam, e em parte têm conseguido, condicionar o próprio poder judicial, a justiça e os tribunais e pô-los ao seu serviço.
Não fica de fora inclusivamente o Tribunal Constitucional, agora sujeito a afronta e enxovalho, e desafio, por parte de um governo arrogante e contra a lei. Pelos mesmos que a todo o momento enche a boca com o Estado de direito.
Dir-se-ia que, ao velho sonho da direita – uma maioria, um governo e um presidente, estaria a faltar uma pedra angular, o Tribunal Constitucional.
Ou, não sendo isso viável, que a justiça constitucional fosse temporariamente transformada numa “justiça da crise” ao serviço exclusivo do pacto de agressão que está a destruir o país e a infernizar a vida do povo português.
Vivemos um momento crucial em que a própria separação de poderes ganha redobrada importância e em que está posta à prova a independência dos tribunais. E estes, particularmente no quadro actual, são valores a preservar, para a sobrevivência do próprio regime democrático.
Amigos, camaradas
A sanha contra a Constituição não conhece limites. Como há dias aconteceu com um facto cuja gravidade não podemos deixar passar sem um firme protesto e alerta.
A proposta do partido "Os Verdes" para que a nossa lei fundamental seja ensinada aos alunos do terceiro ciclo e do secundário foi, já se esperava, rejeitada pelos partidos da maioria, na Assembleia da República.
O que não se esperava, porque ultrapassa tudo em arrogância e descaro, era a reacção de um deputado do PSD, para mais presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, ao afirmar que deve ser evitado o contacto dos alunos com a Lei fundamental, por ser um texto datado e de forte carga ideológica (como que a pôr na Constituição o rótulo de “perigo! manter fora do alcance das crianças!”).
Esta confissão pública do ódio à Constituição da República, esta energia, e mesmo desespero, na luta que contra ela continuam a mover as forças mais reaccionárias, só pode ser explicada pelo próprio conteúdo progressista da Constituição.
Por isso, a exigência do cumprimento e respeito pela Constituição tornou-se um factor crucial na defesa do regime democrático e, numa situação politica particularmente grave e muito perigosa, deverá constituir uma plataforma para a unidade das forças democráticas na luta contra a direita e a política de direita.
Por isso, os comunistas portugueses, fieis aos compromissos com o povo português continuarão a defesa activa da Constituição da República, essencial para a construção de um Portugal com futuro.
Dizendo não à submissão da vida política e social ao poder económico, ao poder dos grandes grupos e das multinacionais.
Dizendo não à liquidação das funções sociais do Estado e ao desaparecimento do Estado social de progresso.
Dizendo não à desregulação do trabalho e à desvalorização do insubstituível papel social que desempenha, e à liquidação da vida democrática dentro das empresas.
Dizendo não ao enfraquecimento do papel do Estado, como garante último da universalidade do exercício dos direitos.
É necessário continuar a resistir e a lutar. Com muita confiança, ao lado de todos aqueles, e são cada dia mais, que lutam pela derrota deste governo e desta política, por uma alternativa patriótica e de esquerda para o nosso país.