A Comissão Europeia começa por apresentar uma proposta de orçamento
comunitário, desta feita, para 2008. O Conselho, por sua vez, propõe
cortes significativos à proposta da Comissão. Por seu turno, o
Parlamento Europeu, no seu auto-denominado papel de "conciliador"
avança com uma proposta dita "equilibrada". Para, por fim, se chegar a
um acordo que corresponde a um recuo face à proposta do PE (ver quadro
em anexo). A votação que se realizará na próxima Quinta-feira marca a
conclusão deste processo.
O que procuram escamotear é que todas as propostas - da Comissão, do
Conselho e do PE -, ficam aquém do previsto no acordo do Quadro
financeiro 2007/2013, relativamente a 2008. Aliás, tal como aconteceu
no anterior Quadro financeiro 2000/2006.
Ou seja, os montantes previstos no actual Quadro financeiro não estão a
ser cumpridos. Recorde-se que o Quadro financeiro 2007/2013 foi
aprovado pela maioria do PE, pela Comissão e pelo Conselho. No seu
primeiro ano de execução - 2007 - o Orçamento comunitário ficou aquém
do esperado, em mais de 2 mil milhões de euros em dotações para
autorizações e em mais de 8 mil milhões em dotações para pagamentos. Em
2008, segue-se pelo mesmo caminho...
Saliente-se que as verbas e prioridades inscritas no Quadro financeiro
comunitário 2007/2013, são em si insuficientes, e incorrectas, para
promover uma real "coesão económica e social", que deveria ser o
primeiro e mais importante objectivo desta União Europeia alargada a 27
países.
No essencial, todas as propostas para o Orçamento comunitário para 2008
vão ao encontro das exigências dos países "ricos" que impõem como
limite os cerca de 1% do RNB comunitário, reduzindo assim a sua
comparticipação no mesmo.
Na realidade, a proposta "equilibrada" do PE, apesar de melhorar alguns
aspectos da proposta do Conselho - como por exemplo, a reposição de
algumas verbas para a política de coesão inicialmente propostas pela
Comissão -, representa uma redução superior a 9 mil milhões de euros,
em termos de pagamentos, face ao acordado no Quadro financeiro para
2008 - ou seja, em termos de pagamentos, o Orçamento comunitário seria
reduzido de 1,04% para 0,96% do RNB comunitário.
Novos perigos e ameaças
Em Setembro, no lançamento da "consulta" sobre a "revisão orçamental
2008/09", prevista no Acordo Inter-Institucional, a Comissão Europeia
procurava justificar esta revisão a partir das "mudanças" que a UE tem
vindo a sofrer nos últimos 10 anos e dos ditos "desafios da
globalização", acrescentamos nós, capitalista.
Não alterando os limites financeiros impostos no Quadro Financeiro
2007/2013 (em princípio!), esta revisão pretende, no entanto,
estabelecer "novas" prioridades na utilização das verbas do orçamento
comunitário a partir de 2009 e dar o mote para o debate quanto ao
sistema de recursos próprios da UE. Debate este, que deverá culminar
nas negociações do próximo quadro financeiro plurianual, para o período
após 2013.
Sem prejuízo de uma análise posterior mais detalhada, procura-se
avançar no reforço e definição de um orçamento comunitário que financie
a agenda neoliberal da dita "Estratégia de Lisboa", renacionalizando, o
mais possível, os custos de algumas políticas comuns (agricultura e
pescas) e desvirtuando os objectivos proclamados para a política de
"coesão". Isto é, pretende-se aprofundar o uso do orçamento comunitário
no financiamento de políticas de ataque aos direitos e conquistas dos
trabalhadores, como a flexigurança, na implementação do mercado
interno, no aprofundamento dos processos de liberalização e
privatização de sectores estratégicos para o desenvolvimento de cada
país, como os serviços públicos, apenas para servir os interesses de
grupos económicos e financeiros. Um orçamento comunitário em que seja
igualmente reforçado o financiamento da comunitarização da justiça e
assuntos internos, da política externa e da militarização da UE.
Prioridades e medidas que encontram na proposta de tratado, dito
"reformador", o seu enquadramento político para o aprofundamento do
rumo neoliberal, federalista e militarista para a UE.
O debate, dito "sem tabus" e tão aclamado pela Comissão Europeia, está,
pois, condicionado pelos supostos "desafios" que esta estabelece para a
UE.
O que se exige e se impõe!
Para os deputados do PCP no PE os desafios a que a UE deveria dar
resposta são a existência de mais de 80 milhões de pessoas em risco de
pobreza na UE. O crescente fosso entre ricos e pobres. É a
persistência, e mesmo a acentuação, das assimetrias regionais e das
disparidades económicas e sociais entre os diferentes Estados-Membros e
no interior de cada um deles. É a criação de uma real política de
cooperação para o desenvolvimento. É a desmilitarização das relações
internacionais e a paz.
Os deputados do PCP no PE reafirmam a necessidade de uma ruptura com as
políticas neoliberais, federalistas e militaristas da UE e a
necessidade de um orçamento comunitário que, entre outros aspectos:
- Tenha como base as contribuições nacionais de acordo com a riqueza
relativa de cada país (a partir do seu RNB), tenha uma função
redistributiva e assuma como prioridade a implementação de políticas
que promovam uma real aproximação dos níveis de desenvolvimento
económico dos diversos países e a efectiva melhoria das condições de
vida dos trabalhadores e das populações; - Rejeite qualquer tentativa de introdução de forma directa ou encapotada de impostos europeus;
- Realize uma profunda modificação da Política Agrícola Comum para,
salvaguardar a soberania e segurança alimentares de cada país, que
assegure uma justa redistribuição das ajudas agrícolas entre
agricultores, produções e países, e maiores transferências para
Portugal, que é um dos países que menos recebe da Política Agrícola
Comum, introduzindo uma efectiva modulação e plafonamento das ajudas
agrícolas em favor da pequena agricultura e da agricultura familiar; - Reforçar o financiamento comunitário da política de coesão e assegurar a sua cabal execução;
- Aumentar as taxas de co-financiamento comunitário para as regiões de
«convergência», em especial para as regiões menos desenvolvidas dos
Estados-Membros elegíveis para o Fundo de Coesão e para as regiões que
sofrem de desvantagens geográficas ou naturais permanentes, como as
regiões ultraperiféricas; - Colocar fim aos condicionalismos, como critérios de desempenho
político-económicos, para a atribuição de meios financeiros no quadro
da política de coesão que restrinjam ainda mais o acesso a esta,
nomeadamente por parte das regiões de convergência; - Colocar fim à aplicação da regra N+2 ao Fundo de Coesão e aos Fundos
estruturais (regra que prevê o corte de verbas no prazo de 2 anos caso
estas não tenham sido executadas); - Compensar integralmente as denominadas regiões de efeito estatístico, como o Algarve;
- Rejeitar a subordinação da política de coesão às prioridades
neoliberais da Estratégia de Lisboa e colocar os fundos comunitários ao
serviço das populações, no reforço do investimento público e na
promoção de serviços públicos de qualidade.
Quadro Comparativo
Pagamentos
Quadro financeiro para 2008 Revisto
Proposta da Comissão Europeia
Proposta do Conselho
Parlamento Europeu
(Outubro)
Proposta da Comissão Europeia Revista
Parlamento Europeu
(Dezembro)
milhões euros
129 681
121 582
119 410
124 194
120 346
120 346
% RNB comunitário
1,04%
0,97%
0,95%
0,99%
0,96%
0,96%