Autoriza o Governo a legislar em matéria de ofertas públicas de aquisição
Sr. Presidente, Vindo o Governo apresentar uma proposta de lei para dinamizar as OPA e facilitar o assalto do capital estrangeiro a empresas estratégicas nacionais, pergunto-lhe se não considera que o Governo, neste momento, deveria concentrar as suas atenções e energias nos problemas dos sectores produtivos, na dinamização das exportações e nos factores centrais da competitividade da economia portuguesa.
Não está o Governo preocupado com as consequências gravíssimas dos elevados preços da energia para tantos sectores produtivos portugueses, como o das pescas, dos têxteis, da cristalaria ou da cerâmica? Pelos vistos, não estáP!o rque não consegui obter uma resposta do Sr. Ministro da Economia, aproveito a presença nesta Assembleia da República do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças para lhe perguntar se foi por razões orçamentais que o Governo não deu seguimento, na União Europeia, aos processos que permitiriam ajudas públicas de 9,8 milhões de euros para oito barcos em construção nos Estaleiros Navais Sobre a proposta de lei n.º 67/X, coloco-lhe duas questões. Considera o Governo que a legislação que agora nos é proposta reforça ou não a capacidade de o Estado português intervir nas OPA, permitindo- lhe particularmente defender melhor o comando nacional sobre empresas estratégicas do País? Por outro lado, pedia-lhe que nos dissesse que importância tem hoje, em Portugal, o chamado mercado de capitais na resposta às necessidades de financiamento das empresas do tecido produtivo português. (…)
Sr. Presidente, Diz o Governo do PS que «(…) o lançamento recente de várias operações deste tipo…» — OPA — «… no mercado português e a especulação sobre o eventual lançamento de novas operações, incluindo por parte de empresas estrangeiras, torna imperiosa a rápida adequação do ordenamento jurídico português às regras comunitárias, por forma a evitar o tratamento diferenciado nos mercados de capitais dos diferentes Estados-membros». É na base destas preocupações que o Governo apresenta a proposta de lei n.º 67/X, para o autorizar a legislar em matéria de ofertas públicas de aquisição, vulgo OPA, transpondo a Directiva 2004/25/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004. Diga-se, em primeiro lugar, que tais preocupações e tanta urgência são sinais inquietantes de uma política, são a marca de uma política que à produção prefere a especulação e que ao investimento produtivo prefere os jogos de bolsa do capital financeiro. Não é sem razão que, um dia destes, um conhecido industrial da área do partido do Governo, questionado sobre o «desafio que lançava ao Governo, na sua qualidade de empresário», respondeu: «O desafio que lançava fazia-o ao Governo e aos grandes grupos económicos portugueses: parem de fazer negócios especulativos no mercado interno, para haver um esforço conjunto na exportação, sem o que não há soluções para a economia portuguesa». Mas podem lá os grandes grupos económicos portugueses «que fogem da indústria como diabo da cruz», segundo o mesmo empresário, abandonarem as OPA e os negócios especulativos, se podem ver os seus pecúlios aumentados da noite para o dia em milhões e milhões de euros — Belmiro Azevedo terá ganho 335 milhões de euros entre 6 e 14 de Fevereiro — sem trabalho nem riscos! É nessa direcção e sentido que intervém o Governo PS/Sócrates. Eliminar obstáculos e restrições para facilitar, através do jogo bolsista, a concentração e centralização de capitais. Mais: preocupado pelas notícias — especulações, segundo o preâmbulo da proposta de lei — sobre possíveis OPA «por parte de empresas estrangeiras», o Governo PS decide, igualmente, facilitar-lhes o assalto aos famosos «centros de decisão nacional». São conhecidas as ficções de um argumentário velho e revelho para justificar a incontornável realidade do movimento do capital e as preocupações com os trabalhadores, «tapando o sol com uma peneira», sabido que estas operações significam «emagrecimentos», isto é, o despedimento de milhares de trabalhadores, como, aliás, não é ocultado nas anunciadas OPA da Sonae sobre a PT e do BCP sobre o BPI! Mas, mesmo nesta matéria, o Governo classifica apenas como «grave» a violação do direito à informação dos trabalhadores e não como «muito grave», o que deveria determinar não apenas uma mais pesada coima mas também a própria anulação da OPA. Manipulam-se, como é habitual em casos que tais, os interesses dos pequenos accionistas e, em nome dos seus ganhos de uns cêntimos por acção, consolida-se o domínio dos grandes grupos e os negócios especulativos dos grandes accionistas! Não vale a pena, certamente, falar aqui da outra grossa ficção, da necessidade das OPA para dinamizar o mercado de capitais, para que, assim, este possa «desempenhar também em Portugal um papel fundamental no financiamento das empresas». Estas operações não servem os interesses da economia portuguesa! Reafirmamos o que dissemos em anterior debate: as OPA pretendem sobretudo liquidar o papel do Estado em sectores estratégicos; as OPA facilitam a colocação de sectores estratégicos nacionais sob o comando de grupos e interesses estrangeiros; as OPA produzem desmembramentos em grupos empresariais fortes, produzindo desemprego e graves danos nas potencialidades empresariais desses grupos; as OPA visam acelerar a concentração e entralização do capital, em completa contradição com a advogada defesa da concorrência, que as privatizações prometeram aumentar; as OPA não são um sinal de revitalização da economia nacional. O facto de Portugal, com o valor das duas OPA já conhecidas, ter atingido o 4.º lugar no ranking dos países europeus com mais fusões e aquisições no 1.º trimestre deste ano não apaga a brutalidade dos mais de 500 000 desempregados, ultrapassando no ranking do desemprego a média da União Europeia. Não resolve a desesperada aflição de milhares de micro, pequenas e médias empresas portuguesas. As OPAS não respondem à estagnação da economia real do País. Quaisquer que sejam os seus desfechos não acrescentam um fósforo ao PIB nacional. É por isso que, em nome dos interesses dos trabalhadores e do País, o PCP continuará a combater a «financeirização» da nossa economia, a economia de casino, o regabofe especulativo. Seria bom que as energias do Governo se pudessem, antes, virar para os trabalhadores, para os empresários do sector produtivo, para a economia das nossas fábricas, dos nossos campos, das nossas pescas.
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