O PEC e as propostas do PCP

Áudio

Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP
1. Quem apresenta ao País um Programa, intitulado de “Estabilidade e Crescimento”, e prevê que nos próximos quatro anos um em cada dez portugueses em idade activa esteja desempregado – 9,8% em 2010, 9,8% em 2011, 9,5% em 2012 e 9,3% em 2013 – o que está a anunciar é o desastre económico e social do país, um país parado ou a andar para trás.

Quem projecta este conjunto de propostas e a perspectiva mais optimista que tem de crescimento económico é o de um valor de 1,7% lá para o ano de 2013, está a assumir um caminho de declínio nacional, de sistemática divergência com o desenvolvimento dos restantes países da União Europeia, de agravamento da dependência e da dívida externa.

Um Programa que é simultaneamente a rendição, sem condições, aos ditames dos mercados financeiros/agências de notação, ao grande capital europeu e ao Directório das grandes potências europeias. Não há um rasgo de coragem política, um assomo de brio patriótico, qualquer sinal de iniciativa adequada, apenas cumplicidade, resignação e impotência, expressões da indisfarçável convergência face a tais orientações!

O que agora o Governo apresenta ao país,  não é um programa de estabilidade, nem de crescimento, mas sim um programa de instabilidade, de retrocesso e declínio nacional.

2. O PEC constitui uma repetição das velhas e agora agravadas receitas, medidas e orientações que tantos sacrifícios, desigualdades e injustiças, têm imposto à maioria do povo português!

Um congelamento dos salários reais que se transformará em salários mais desvalorizados e com menos poder de compra, com o valor da taxa de inflação sistematicamente subestimado em sucessivos Orçamentos de Estado, como se verificou na última década em que os trabalhadores da administração pública perderam sempre poder de compra com excepção de 2009.

A continuação da destruição do emprego no sector público, que inevitavelmente                  se traduzirá em mais acentuada degradação e encarecimento dos serviços públicos, favorecendo a sua apropriação pelo capital privado.

Imposição do aumento da idade da reforma na Administração Pública, rompendo o acordo assinado, dos 62,5 para os 65 anos, levando milhares de trabalhadores a antecipar a sua saída para não serem ainda mais penalizados.
Novos cortes nas prestações sociais, desconhecendo-se a sua exacta dimensão, mas em que a referência a alterações no subsídio de desemprego “visando promover um mais rápido regresso à vida activa” só pode significar novas restrições no seu acesso e valor.

Cortes no investimento público, que longe de ficarem pelo adiamento de dois anos no calendário na Alta Velocidade (Lisboa/Porto e Porto Vigo), vão atingir em particular os investimentos públicos de pequena e média dimensão, seja os que forem assumidos pelo Governo Central, seja pelo Poder Local.
 
Aumento dos preços, com o anúncio já realizado de introdução de novas portagens em outras rodovias, para lá das que já estavam indiciadas.

Limitação das deduções à colecta no IRS com despesas de saúde e educação, pelos escalões de rendimento abrangidos, traduzindo uma nova penalização de milhares de portugueses de baixos rendimentos.

Um programa de privatizações que constitui um autêntico festim ao grande capital nacional e estrangeiro, atingindo sectores estratégicos e monopólios naturais, eliminando a presença do Estado em empresas estratégicas e estruturantes da economia e do território.

O PEC que o Governo agora apresenta, com o apoio do PSD e CDS/PP, vai penalizar os mesmos de sempre: trabalhadores, reformados, MPMEs, os sectores produtivos e serviços públicos essenciais, na saúde e educação!

3. Mas, mais grave ainda, é  que não responde à principal questão estrutural da economia portuguesa: o brutal nível do endividamento externo. Não há futuro sólido, sustentado e soberano sem uma aposta na produção nacional, na industrialização do país, no desenvolvimento da agricultura e das pescas.

Não se responde ao endividamento travando ou contraindo o crescimento do produto nacional!

Como certamente sucederá com os cortes no investimento e despesa pública, as restrições no mercado interno provocadas por congelamentos/reduções salariais e cortes nas prestações sociais. Como será inevitável acontecer com o Estado a prescindir das alavancas fundamentais da economia que lhe restam em empresas fornecedoras de bens e serviços essenciais, quer para as populações quer como factores de produção no centro da competitividade do tecido económico!

Na verdade, o país conhece qual o resultado de 25 anos de privatizações, da responsabilidade do PS, PSD e CDS-PP: liquidação de sectores produtivos, maior dependência  do país, perda de soberania, degradação de serviços, estrangulamento das pequenas empresas em detrimento dos lucros dos grandes grupos económicos que se formaram à sua custa. Depois de cerca de 50.000 milhões de euros que entraram para os cofres do Estado, oriundos das privatizações  e das centenas de milhões de lucros arrecadados pelos grandes grupos económicos que delas beneficiaram, o país está mais injusto, mais desigual e mais dependente.

4. O PCP alertou e combateu as opções do Governo PS, apoiadas por PSD e CDS, de transferir incomensuráveis recursos públicos para o capital financeiro. Foram as mesmas vozes que hoje estão alinhadas com esta declaração de guerra aos trabalhadores e ao Povo português, que na altura clamaram por mais apoios à banca e aos grupos económicos.

Quando se tratou de salvar banqueiros não havia preocupações com o défice das contas públicas.
Grupos económicos que mesmo em tempos de crise contaram sempre com as mãos largas do Estado, beneficiando de apoios fiscais, dinheiros públicos e negócios chorudos, expressos na escandalosa massa de lucros – só a banca arrecadou em 2009, cerca de 5 milhões de euros por dia, ou uma EDP que voltou a atingir mais de mil milhões de euros de lucros no ano passado.
 
Ao contrário do que dizem PS, PSD e CDS-PP, este caminho não é inevitável. Este caminho, este chamado Programa de Estabilidade  é sobretudo uma opção pelos mais ricos e poderosos, contra o Povo e o país.   

5. Ao mesmo tempo que rejeita veementemente esta proposta de Plano de Estabilidade e Crescimento, o PCP não prescinde de avançar com medidas que, inseridas num projecto de ruptura com a política de direita e mudança na vida nacional, contribuam para a defesa do emprego, o desenvolvimento da produção nacional, o combate às injustiças sociais, a afirmação da nossa soberania.

O país precisa de outro rumo. O país precisa de uma política de ruptura, patriótica e de esquerda designadamente com:

- O aumento dos salários e pensões visando critérios de justiça social e a dinamização do Mercado Interno, designadamente, tendo como objectivo a elevação do Salário Mínimo Nacional para pelo menos 600 € em 2013, uma valorização dos restantes salários  e o aumento das pensões a começar por mais 25€  naquelas que são mais baixas.

- A defesa da produção nacional dando grande centralidade às políticas de apoio às PME’s, privilegiando o mercado interno, enfrentando com outras políticas os défices estruturais da nossa economia – energético, agro-alimentar, tecnológico – alargando o investimento público, impondo a obrigatoriedade de incorporação da produção nacional nos grandes projectos, a para da taxação das importações e de apoios às exportações.

- Outra política fiscal que contribua para o desenvolvimento económico, a satisfação das necessidades do Estado, a justiça social e o equilíbrio das contas públicas, com a efectivação do valor de 25% de taxa de IRC para a banca, fim do off-shore da Madeira e dos benefícios fiscais nele envolvidos, a taxação das mais valias realizadas na bolsa, o corte nas deduções/benefícios fiscais em sede de IRC, resultantes de dividendos, mobiliário, mais-valias e a introdução de uma taxa suplementar (+ 10% no IRC durante os próximos 3 anos) sobre lucros dos grandes Grupos Económicos e Financeiros.

- Combate ao desemprego e o apoio aos desempregados tendo como objectivo uma política de pleno emprego, combatendo os despedimentos com legislação dissuasora, combatendo a precariedade, alargando o emprego público e a prestação de serviços às populações. Apoiando quem está desempregado, designadamente com o alargamento do acesso ao subsídio de desemprego.

- Defender um forte e dinâmico sector empresarial do Estado, pondo fim imediato ao processo de privatizações em curso, assim como das chamadas parcerias público-privadas, e afirmando o interesse nacional em sectores estratégicos por via do controlo público de sectores como a banca.

- Congelar e mesmo reduzir preços de bens e serviços essenciais – banca; seguros; energia; portagens; transportes e comunicações e  telecomunicações.
 
- Uma forte iniciativa política do Estado Português junto da União Europeia, visando a renegociação do calendário estabelecido de diminuição da dívida pública, a diminuição das contrapartidas nacionais (Estado e agentes económicos) para a aplicação dos fundos comunitários propondo um valor máximo de 10%, a suspensão de remessas do Estado Português (ou devolução de parte do que enviamos) para o Orçamento Comunitário. Estas e outras medidas, ao contrário das que são avançadas no PEC visando a convergência económica e social dentro da União Europeia e não a divergência.

Estas e outras medidas são necessárias e são possíveis. Em sentido contrário aos dos grandes interesses, mas correspondendo aos interesses dos trabalhadores e do povo, às suas aspirações e direitos e à afirmação de um caminho de progresso e desenvolvimento para o país.

6. A perspectiva de paralisia e retrocesso económico, de degradação da situação social e agravamento  de todos os problemas nacionais que a  proposta do PEC comporta, tornam ainda mais premente e inevitável uma forte resposta de luta e de resistência dos trabalhadores e das outras camadas populares em relação a uma política que há muito está a condenar  o país ao declínio. 

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