O Estado da Na??o<br />

Senhor Presidente Senhor Primeiro-Ministro Senhores Deputados Chegamos ao fim desta sess?o parlamentar. Estamos no ?ltimo debate, o chamado debate sobre o "estado da Na??o". Pela voz do governo fic?mos a saber que o Pa?s est? bem e que se recomenda. De facto ouvindo o senhor Primeiro-Ministro, ministros e secret?rios de Estado at? parece que o Conselho de Ministros se deslocou de S. Bento para a EXPO para o Pavilh?o da "Realidade Virtual" e cada vez mais virtual... Aproveitando tamb?m uma conjuntura externa favor?vel ao Pa?s o governo faz seus, os louros de um crescimento econ?mico que n?o se radica infelizmente, nem no fortalecimento do nosso aparelho produtivo, nem na balan?a comercial, nem na distribui??o do Rendimento Nacional e na justi?a social. Em abono das suas teses enumera as festas, as celebra??es, a pol?tica do bet?o, o ter ultrapassado o PSD nas privatiza??es, nos "tachos" para os seus boys, na concentra??o da riqueza, no favoritismo aos grupos econ?micos e como testemunho da sua elevad?ssima sensibilidade social, diz que at? tem estado inclusive a concretizar projectos sempre defendidos pelos comunistas, como seja o do Rendimento M?nimo Nacional e o Pr?-escolar... Na verdade estamos perante duas realidades de sentido oposto. Uma delas expressa-se no crescimento econ?mico, aumento da produtividade e dos lucros. Mas a outra, que atinge a maioria dos trabalhadores, n?o pode ser silenciada. Realidade que se expressa no n?mero de desempregados que, de facto, continua a ultrapassar o meio milh?o. Que se expressa no desmesurado crescimento da precariza??o onde os contratos a prazo, o trabalho ? pe?a, ? hora, ? empreitada, o trabalho tempor?rio e clandestino se transformam em rega geral. Realidade que reflecte ainda os processos de despedimento, rescis?o e pr?-reformas for?adas sob a capa da reestrutura??o das empresas, ? o aumento dos desequil?brios da reparti??o do rendimento e as desigualdades sociais. Neste quadro o que ? que leva o governo a encetar uma das mais graves ofensivas aos direitos dos trabalhadores, visando desregulamentar e fragilizar ainda mais alguns dos pilares onde assenta o direito dos trabalhadores a n?vel do conceito do emprego, de retribui??o, da profiss?o, das f?rias do trabalho nocturno? Ao transformar as novas gera??es de trabalhadores no alvo principal desta opera??o desregulamentadora o governo assume a grave responsabilidade de promover e tentar criar num futuro pr?ximo uma gera??o de trabalhadores sem direitos! E no entanto o que vemos e o que ouvimos nas empresas e nos locais de trabalho, designadamente na iniciativa que o PCP promoveu a n?vel nacional, contactando mais de 200 mil trabalhadores em 500 empresas e locais de trabalho, ? que os trabalhadores reclamam mais justi?a social, mais seguran?a no emprego e a devida valoriza??o dos seus direitos e dos seus sal?rios. Em muitas lutas que hoje se travam em muitos sectores e empresas, por vezes para al?m de problemas reivindicativos, ? j? a luta pela dignidade que leva ? participa??o massiva dos trabalhadores como aconteceu no sector dos Transportes, da Banca, da Administra??o P?blica e nos Hot?is de Lisboa. O governo ? o primeiro respons?vel pela crescente conflitualidade social que se tem verificado no pa?s. Assumindo estas aspira??es e essa luta o Partido Comunista Portugu?s prop?e e sugere ao governo no imediato um conjunto de seis medidas que se traduziriam em estabilidade social e pol?tica e numa melhoria do n?vel e qualidade de vida dos portugueses: 1? suspender as altera??es ? legisla??o laboral e consequentemente n?o lan?ar no per?odo de f?rias a discuss?o dos respectivos diplomas; 2? prolongar o subs?dio de desemprego para os desempregados nomeadamente, para os de longa dura??o com mais de 50 anos; 3? introduzir de imediato os medicamentos gen?ricos o que permitiria ao Estado e aos utentes economizarem milh?es de contos e dar resposta a muitos problemas da sa?de, nomeadamente as filas de espera. Mas n?o venham com os falsos "gen?ricos de marca", porque isso n?o passa de um expediente para entregar o mercado dos gen?ricos nas m?os de meia d?zia de multinacionais; 4? criar um imposto de solidariedade sobre as grandes fortunas e avan?ar com a reforma fiscal; 5? Combater o trafego e o branqueamento de capitais aprovando legisla??o com efic?cia que permita o congelamento, apreens?o e perda para o Estado de patrim?nios de origem criminosa e a limita??o do segredo banc?rio, dotando simultaneamente a Pol?cia Judici?ria e as magistraturas dos meios necess?rios para a investiga??o e o combate ? criminalidade; 6? para concluir Sr. Primeiro-Ministro aqui fica uma ?ltima e creio que boa sugest?o: aproveite as f?rias estivais e o descanso da Assembleia da Rep?blica e ultrapasse as oposi??es e as suas diab?licas coliga??es negativas, mande ?s urtigas as press?es das seguradoras e do capital financeiro, n?o tenha receio do Sr. Kohl e ao seu pacto de estabilidade e aumente extraordinariamente os reformados! Estes agradeciam, o pa?s beneficiava e o governo e o PS tomavam uma medida justa, de verdadeira sensibilidade social, e j? n?o precisariam de gastar os neur?nios a encenar mais uma crise virtual (em Outubro) na rentr?e! Senhor Primeiro Ministro Senhores Deputados O governo pode meter a cabe?a na areia mas n?o apaga o facto de que por exemplo, o Minist?rio da agricultura falando da necessidade de equilibrar apoios entre pa?ses, sectores e agricultores come?a a aceitar que se possam reduzir as ajudas ao azeite... Estrat?gia negocial que, mais uma vez permite uma negocia??o ?s fatias, das diversas Organiza??es Comuns do Mercado (OCM), primeiro as mediterr?neas (azeite, vinho, tabaco), depois as do Norte (carne, leite, cereais). Assim como n?o apaga o facto de dizer que n?o h? uns milhares de contos para indemnizar os agricultores atingidos por pragas e temporais ... tomate (Vale do Sado e Tejo), cereja (Cova da Beira/Terra Quente), p?ra rocha (Oeste) e ir entregar 55 milh?es a latifundi?rios, at? ao fim do ano, pelas chamadas indemniza??es da Reforma Agr?ria. E tudo isto pela m?o de uma governo socialista... O governo pode meter a cabe?a na areia mas a realidade a? est? a mostrar as crescentes e intoler?veis injusti?as fiscais, com o governo sempre e sempre a adiar a reforma fiscal. Ora esta reforma para al?m do seu interesse intr?nseco, sempre ter? de servir de base a outras reformas como a da Seguran?a Social ou a da Sa?de. ? uma reforma necess?ria e urgente, que n?o pode estar dependente dos calend?rios eleitorais do governo ou de qualquer partido pol?tico. Exigem-no a justi?a social e o des?gnio da constru??o de uma sociedade mais solid?ria. Pela parte do PCP, desde o in?cio que manifestamos ao governo a nossa disponibilidade pol?tica para o avan?o e concretiza??o de uma efectiva reforma fiscal. N?o ? admiss?vel assistir passivamente ao facto de cerca de 50% do Rendimento nacional fugir ? tributa??o. N?o ? pol?tica e socialmente aceit?vel que os benef?cios fiscais, em sede de IRC, tenham atingido mais de 169 milh?es de contos, s? no ano de 1996, e que simultaneamente se continue a dizer que n?o h? dinheiro para aumentar as pens?es de reforma mais baixas. N?o ? sustent?vel que os rendimentos de capital continuem a ter um tratamento fiscal de favor, com taxas reduzidas, com isen??es e com taxas liberat?rias, sobrecarregando pesadamente os rendimentos do trabalho. Ningu?m acredita que, anualmente mais de 80 mil empresas portuguesas apresentem, para efeitos fiscais, preju?zos da ordem dos 800 ou 900 milh?es de contos e nada se fa?a para repor a verdade dos factos e para dotar a Administra??o Fiscal de capacidade efectiva de actua??o. Pela parte do PCP, reafirmamos a nossa disponibilidade para alterar este estado de coisas, para combater a fraude e a evas?o fiscais e para criar um sistema fiscal mais justo. Por isso daqui desafiamos o senhor Primeiro-Ministro a concretizar uma reforma fiscal antes do fim desta legislatura. Uma reforma fiscal assente nos princ?pios da capacidade contributiva, da igualdade, da progressividade e da simplicidade atrav?s, nomeadamente: - do alargamento das bases de tributa??o, quer no ?mbito do IRS, quer do IRC, quer ainda do imposto sobre o patrim?nio mobili?rio e imobili?rio; - da baixa das taxas do IRS e do aumento da dedu??o espec?fica sobre os rendimentos do trabalho, possibilitados por esse alargamento; - da elimina??o das m?ltiplas taxas liberat?rias existentes e das taxas de favor que incidem sobre as mais-valias, reconduzindo o IRS e o IRC ? sua natureza de impostos ?nicos sobre todos os rendimentos, independentemente da sua natureza ou fonte; - da redu??o substancial dos benef?cios fiscais, em particular dos que s?o concedidos a opera??es e rendimentos de capital; - da introdu??o no sistema fiscal de m?todos moralizadores e mais adequados ? tributa??o da generalidade dos rendimentos de natureza comercial e industrial, associados a regimes simplificados de tributa??o, sem preju?zo das garantias dos contribuintes; - da melhoria da efici?ncia da Administra??o Fiscal; - da cria??o de um sistema eficaz de informa??es tribut?rias. Se o governo estiver disposto a avan?ar para esta necess?ria e urgente reforma fiscal, determinada por reais preocupa??es de justi?a e de redu??o das desigualdades, garanto-lhe senhor Primeiro-Ministro, que o PCP est? dispon?vel para come?ar a trabalhar nesse projecto e desde j?. Manifeste o Governo a mesma disponibilidade e vontade pol?tica. Senhor Presidente Senhor Primeiro-Ministro Senhores Deputados Este final de sess?o parlamentar creio que deveria tamb?m merecer uma reflex?o do Partido Socialista. N?o vou lembrar as perip?cias da revis?o constitucional e as converg?ncias do PS com o PSD, n?o vou recordar o fundamentalismo das leis eleitorais, nem os aplausos ? aprova??o da lei sobre a Interrup??o Volunt?ria da Gravidez logo abafadas pela pirueta da aceita??o do referendo, com a participa??o que se viu, n?o vou recordar aquilo que alguns deputados e autarcas do PS designam por ?tiros nos p?s?, quanto ? regionaliza??o, nem as ced?ncias ao PSD em todo o processo desta reforma ?num faz que anda mas n?o anda?, que foi dando substanciais trunfos aos anti-regionalistas, nem vou lembrar ainda os acordos com o PSD para a realiza??o de um vergonhoso referendo sobre a Europa, que n?o serve para nada e ainda por cima no mesmo dia em que se realiza o da regionaliza??o o que n?o permite qualquer esclarecimento s?rio e que procura fazer do Presidente da Rep?blica um simples not?rio dos ?arranjinhos? entre dois partidos, nem vou lembrar as promessas n?o cumpridas, nem comparar os irris?rios aumentos de sal?rios com as taxas de lucro do capital banc?rio e financeiro, nem a pol?tica neoliberal no ensino e as famigeradas propinas que segundo o Secret?rio Geral do PS na oposi??o s? deveriam ter lugar ap?s a reforma fiscal. Deixo isto para a pausa que as f?rias parlamentares sempre proporcionam. S? sublinho ainda que n?o fomos n?s que afirm?mos, mas um distinto socialista e ex-Secret?rio Geral do PS, que escreveu que "Portugal vive a hora mais liberal de toda a sua hist?ria", pois "as privatiza??es reduziram o poder econ?mico do sector p?blico a dimens?es inferiores ?s que ocorrem em muitos pa?ses europeus", e que "temos um mercado de trabalho reconhecido internacionalmente como dos mais desregulados e flex?veis da Europa", o que temos de concordar, que para um governo socialista ? obra. Nem fomos n?s que afirm?mos (Eduardo D?maso/ P?blico) que mais do uma "direita dos interesses" favorecida, existe sobretudo um "bloco central dos interesses" que, desde os anos 80, se tem perpetuado no poder, tanto ? sombra protectora do PS como do PSD". Se este debate ? sobre o Estado da Na??o, ent?o pode concluir-se que a Na??o dos "grandes interesses" est? bem e recomenda-se. Mas, a Na??o do mundo do trabalho, dos reformados, das classes mais desfavorecidas e mesmo das classes m?dias, essa continua ? espera de uma justi?a que n?o vem, das reformas como a reforma fiscal que n?o s?o feitas, do desenvolvimento econ?mico e do emprego est?vel que n?o s?o criados .O Pa?s necessita de uma outra pol?tica, uma pol?tica de desenvolvimento com a defesa da produ??o nacional, com efectiva e verdadeira dimens?o social e com uma grande afirma??o no sentido da defesa da soberania nacional e de um novo rumo para a constru??o europeia.

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