A Cimeira de Sevilha ficou tristemente célebre para os portugueses pelos
piores motivos: a proibição, pela polícia espanhola, da
entrada em Espanha de muitas centenas de cidadãos portugueses, incluindo
delegações do PCP, do BE e de associações que pretendiam
ir participar na manifestação, autorizada legalmente, de 22 de
Junho. Aí ficou claro que a livre circulação só
existe, sem restrições, quando interessa aos grupos económicos,
às multinacionais.
Apesar dos sucessivos Tratados comunitários garantirem a liberdade de
circulação de pessoas, bens e capitais, do Acordo de Schengen
abolir as fronteiras no interior da União Europeia, de se proclamarem
garantias de cumprimento do direito dos cidadãos exprimirem livremente
as suas opiniões, incluindo o direito a manifestarem-se pacificamente,
a verdade é que o que se passou durante a Cimeira de Sevilha clarificou
o que alguns dirigentes comunitários entendem do conceito de "livre
circulação de pessoas, de bens e de capitais".
Pressionados pela crescente contestação das políticas
comunitárias e mundiais, com cariz cada vez mais liberal, que, em nome
da segurança e do livre comércio, têm contribuído
para agravar as desigualdades entre países e povos e pôr em causa
direitos e liberdades fundamentais, os governantes deixaram estalar o verniz
e mostraram a verdadeira natureza de classe da sua política, recorrendo
à repressão e assumindo, mesmo, formas de violência inadmissíveis.
Daí que na denúncia que fizemos, junto dos diversos órgãos
comunitários, tenhamos exigido que a Comissão e o Conselho esclareçam
se, a partir de agora, em todas as Cimeira dos Conselhos Europeus, vão
suspender a aplicação do acordo de Schengen, pondo em causa o
direito à liberdade de manifestação a nível da União
Europeia, ou, pelo contrário, vão garantir os direitos e liberdades
fundamentais que nenhum pretexto de segurança e combate ao terrorismo
pode ameaçar. É que a situação é de tal modo
grave que importa que haja toda a transparência nas deliberações
comunitárias para se conhecerem os verdadeiros objectivos e os contornos
exactos das políticas comunitárias. Por isso, foi positivo que
numa Resolução do Parlamento Europeu se tenha condenado a actuação
da Presidência Espanhola.
Política de Imigração
Paralelamente às lutas de trabalhadores e à grandiosa manifestação
de Sevilha, os chefes de Estado e de Governo dos 15 Estados-membros da União
Europeia deram mais um passo no caminho da construção de uma "Europa
fortaleza", tornando também claro que há dois pesos e duas
medidas na visão comunitária de "livre circulação".
Embora na Cimeira não tenha sido adoptada a proposta da Presidência
espanhola de sanções económicas automáticas contra
os países de origem dos migrantes ou dos países de trânsito,
a verdade é que foram aprovadas maiores restrições à
imigração, esquecendo as suas causas e os dramas dos povos de
países terceiros vítimas da pobreza, da fome, dos conflitos armados
e da exploração das multinacionais dos países mais ricos,
designadamente através da cada vez maior liberalização
do comércio para as matérias primas e mercadorias que lhes interessam.
Liberalizações e luta social
A via capitalista, cada vez mais nua e crua, com a aposta em maiores liberalizações
e privatizações, incluindo em áreas sociais, a manutenção
de um Pacto de Estabilidade que apenas se preocupa com a estabilidade dos preços,
mesmo quando isso significa políticas mais restritivas, piores serviços
públicos essenciais, baixos salários, maior precariedade do emprego
e mais desemprego, só pode aumentar a contestação popular.
Ora, a resposta dos governos não pode ser a via repressiva para tentar
esvaziar manifestações e criar um clima de medo, mesmo quando
afirma que o faz em nome da segurança. O que têm é de alterar
políticas e dar resposta aos problemas, diminuindo as desigualdades sociais,
e não agravando-as.
Em democracia, o direito à indignação tem de ser garantido,
seja a nível nacional, seja a nível comunitário. Por isso,
a luta pelo emprego com direitos e por melhores condições de vida
está intimamente ligada à luta pela garantia das liberdades fundamentais
e pelo aprofundamento da democracia.
Convenção e reformas institucionais
A anunciada reforma das instituições, iniciada com o Tratado
de Nice, mesmo que este tenha sido rejeitado pelo povo irlandês, mereceu
do Conselho de Sevilha particular atenção. De facto, não
só Giscard d´Estaing fez o ponto da situação sobre
os trabalhos da Convenção a que preside, relativamente ao futuro
da União, como foi aprovada a reforma do Conselho, com a redução
e aglutinação de várias das suas formações.
Merecendo destaque a junção da Agricultura e Pescas, sobretudo
pelo momento que se vive de revisão das respectivas políticas
comuns, e a forma como foi desvalorizada a Cooperação para o Desenvolvimento,
que também deixou de ter uma formação autónoma.
Entretanto, a Comissão, na sua comunicação "Um projecto
para a União Europeia", insiste em cinco pontos essenciais:
- prosseguir o desenvolvimento das políticas comuns e alargar o seu
âmbito, designadamente nos domínios do controlo e vigilância
das fronteiras externas; no direito de asilo e estatuto dos imigrantes; polícias
e cooperação judicial civil e penal; política externa
e de defesa; - generalizar a tomada de decisão por maioria qualificada;
- elaborar um Tratado constitucional e dar substância ao conteúdo
jurídico da cidadania europeia; - reforçar a coordenação das políticas económicas
e assegurar o carácter único da representação
da zona euro; - unicidade de iniciativa em matéria de política externa e
de segurança comum, acompanhado da fusão, por fases, do Alto
Representante e do Comissário das Relações Externas.
Como se pode apreciar, trata-se de procurar enterrar a cooperação
intergovernamental, que a Comissão considera "fonte de fraquezas",
chamar a si uma verdadeira concentração de poderes em áreas
fundamentais, pondo cobro à soberania dos Estados membros, afastando-se
também de uma concepção de direcção política
da União baseada num directório político do Conselho, dominado
pelos governos de alguns Estados membros, que considera "fonte de tensões
e bloqueios", mas para que procura encaminhar todo o processo de decisão
ao insistir no fim do direito de veto que os Estados membros ainda têm
em áreas sensíveis.
Assim, tudo leva a crer que a Convenção serve apenas de chapéu
de chuva às lutas renhidas que se vão desenvolver nos bastidores,
entre a Comissão e o Conselho, embora, naturalmente, mesmo numa organização
como a Convenção, onde participam cerca de cem pessoas, apesar
de terem sido afastadas as forças políticas que defendem caminhos
diferentes e alternativos ao federalismo, como aconteceu em Portugal com o PCP,
sempre haja oportunidade de se esgrimirem argumentos relativos à necessidade
de maior transparência e democraticidade.
Relativamente ao Tratado de Nice, foram aprovadas Declarações
sobre a Irlanda para facilitar a pressão do Governo irlandês sobre
a sua população, visando obter um voto favorável na repetição
do referendo que se vai realizar no próximo Outono para, segundo afirmam,
se realizar o alargamento no prazo previsto.
Alargamento
Apesar de, inicialmente, o alargamento ter sido uma prioridade da Presidência
espanhola, de facto foi transferido para a Presidência dinamarquesa. É
que embora Aznar tenha afirmado no discurso de encerramento que as negociações
atingiram a etapa final, por terem sido negociados 96 capítulos e encerrados
52 com os 10 países previstos para a adesão a partir de 2004,
faltam acordos em pontos sensíveis, designadamente nos pagamentos directos
previstos na Política Agrícola Comum. Claro que o primeiro-ministro
espanhol não disse como vão chegar a acordo, nem tão pouco
se referiu à necessidade de revisão das perspectivas financeiras,
ou sequer a qualquer alteração do Pacto de Estabilidade que cada
vez mais Estados-membros têm dificuldade em cumprir.
Assim, a encruzilhada em que se encontra a União Europeia poderá
ter desenvolvimentos importantes nos próximos meses, dependendo não
apenas dos interesses dos países mais poderosos e dos grupos económico-financeiros,
mas também da luta dos povos, designadamente dos trabalhadores, na defesa
dos seus justos interesses.
Custos do Alargamento - Nova Proposta e a Agenda 2000 |
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Quadro 1 - Quadro Financeiro da Agenda 2000 - 6 Países Candidatos |
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meuros
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2002
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2003
|
2004
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2005
|
2006
|
Total
|
Agricultura | 1600 | 2030 | 2450 | 2930 | 3400 | 12410 |
Fundos Estruturais | 3750 | 5830 | 7920 | 10000 | 12080 | 39580 |
Políticas Internas | 730 | 760 | 790 | 820 | 850 | 3950 |
Despesas Administrativas | 370 | 410 | 450 | 450 | 450 | 2130 |
Total | 6450 | 9030 | 11610 | 14200 | 16780 | 58070 |
Quadro 2 - Nova Proposta da Comissão - 10 Países Candidatos |
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meuros
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2002
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2003
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2004
|
2005
|
2006
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Total
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Agricultura | 0 | 0 | 2048 | 3596 | 3933 | 9577 |
Fundos Estruturais | 0 | 0 | 7067 | 8150 | 10350 | 25567 |
Políticas Internas | 0 | 0 | 1176 | 1096 | 1071 | 3343 |
Despesas Administrativas | 0 | 0 | 503 | 558 | 612 | 1673 |
Total | 0 | 0 | 10794 | 13400 | 15966 | 40160 |
Quadro 3 - Diferenças de Montantes (Agenda 2000/Nova Proposta) |
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meuros
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2002
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2003
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2004
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2005
|
2006
|
Total
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Agricultura | -1600 | -2030 | -402 | 666 | 533 | -2833 |
Fundos Estruturais | -3750 | -5830 | -853 | -1850 | -1730 | -14013 |
Políticas Internas | -730 | -760 | 386 | 276 | 221 | -607 |
Despesas Administrativas | -370 | -410 | 53 | 108 | 162 | -457 |
Total | -6450 | -9030 | -816 | -800 | -814 | -17910 |
Quadro 4 - Pagamentos Líquidos para os países candidatos |
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meuros
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2002
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2003
|
2004
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2005
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2006
|
Total
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Autorizações | 10794 | 13400 | 15966 | 40160 | ||
Pagamentos | 5686 | 10493 | 11840 | 28019 | ||
Autorizações Líquidas | 5794 | 8400 | 10966 | 25160 | ||
Pagamentos Líquidos | 686 | 5493 | 6840 | 13019 | ||
Perda das Ajudas de Pré-Adesão - Autorizações | 2674 | 5280 | 7846 | 15800 | ||
Perda das Ajudas de Pré-Adesão - Pagamentos | -2434 | 2373 | 3720 | 3659 |