Numa Europa alargada, que futuro para os Fundos Estruturais?

Em Janeiro 2001, a Comissão Europeia apresentou o seu segundo relatório
sobre a coesão económica e social (1) com
o título "Unidade da Europa, Solidariedade dos Povos, Diversidade
dos Territórios".

Com este segundo relatório pretendeu lançar a discussão
sobre a futura reforma dos fundos estruturais, que terá lugar a partir
de 2007 e que deverá ter em conta o alargamento da União Europeia
(os 15 Estados-membros actuais mais os 12 países com os quais se estabeleceram
negociações de adesão).

Apesar da utilização dos Fundos Estruturais e do Fundo de Coesão,
as disparidades do rendimento por habitante (PIB) entre as diversas regiões
da UE é ainda considerável. O rendimento médio dos 10%
da população da União que vive nas regiões mais
prósperas é 2,6 vezes superior aos 10% da população
nas regiões menos desenvolvidas. No essencial, existem dois grupos de
países: os 11 países mais prósperos e os países
chamados "da coesão" - Portugal, Espanha, Irlanda e Grécia.

Numa Europa alargada passaria a haver três grupos. Os países mais
prósperos compreendendo 12 dos actuais Estados-membros. Um grupo intermédio
em que se integraria Portugal, Espanha, Grécia e ainda Chipre, Malta,
Eslovénia e a República Checa, onde o rendimento está próximo
dos 80% da média da Europa a 27 e que representa 13% da população
total. E a grande novidade passaria a ser a existência de um terceiro
grupo de oito países onde o rendimento se situa próximo dos 40%
da média e que corresponde a 16% da população total.

Ao nível nacional, mais de um terço da população
viverá em países onde o PNB será inferior a 90% da média
da União - média de elegibilidade para o Fundo de Coesão
- contra um sexto na Europa actual.

Com o alargamento, o rendimento médio por habitante de 10% da população
vivendo nas regiões menos prósperas chegaria apenas a 31% da média
europeia. Na Europa dos 15 esta relação é de 61%.

Face a este panorama, fácil será concluir que o alargamento não
provocará pequenas alterações. Se os actuais critérios
de elegibilidade se mantiverem - PIB inferior a 75% da média da União
para as regiões de Objectivo nº 1 (todo o Portugal menos a região
de Lisboa e Vale do Tejo que saiu na revisão de 1999) e PNB inferior
a 90% da média para o Fundo de coesão - haveria regiões
menos prósperas que por uma mera análise estatística passariam
automaticamente para o clube das mais ricas, sem que objectivamente tivesse
havido qualquer alteração no âmbito da convergência
real.

Então que fazer ?

Em primeiro lugar deve-se esclarecer que possíveis alterações
nos critérios de atribuição dos fundos comunitários
provocadas pelo alargamento da União Europeia, apenas terão efeito
a partir de 2007. Até lá, Portugal receberá o que foi acordado
em 1999 e atribuído ao seu Terceiro Quadro Comunitário de Apoio.
Caso se verifique, entretanto, a adesão de novos países, estes
serão apoiados por fundos que estão em reserva para esse efeito.

O que importa discutir, neste momento, é como resolver o problema da
definição de critérios que não exclua automaticamente
as regiões onde ainda se verificam atrasos de desenvolvimento.

Neste sentido, a Comissão lançou à discussão quatro
opções.

  1. Aplicação do limiar actual de 75%, independentemente do número
    de países que venham a aderir. Esta opção eliminaria
    um grande número de regiões dos Quinze e uma futura elegibilidade
    para apoio comunitário dependeria de prioridades e critérios
    outros que os das regiões menos desenvolvidas.
  2. O mesmo critério mas considerando que todas as regiões actualmente
    Objectivo nº 1 mas que viesse a estar acima deste limiar deveriam beneficiar
    de um apoio transitório (phasing-out).
  3. A fixação de um limiar de elegibilidade mais elevado que
    75% eliminando a possibilidade de integrar regiões que sem o alargamento
    já não seriam consideradas com atraso de desenvolvimento no
    final do actual período de programação.
  4. O estabelecimento de dois limiares de elegibilidade, um para as regiões
    dos Quinze e outro para os países candidatos.

Mas haverá igualmente que decidir sobre outros aspectos como: a inclusão
ou não de critérios como a taxa de desemprego, o nível
de formação, as taxas de cofinanciamento (relação
entre o financiamento comunitário e o nacional) e, também, sobre
o futuro envelope financeiro comunitário.

Em Fevereiro de 2002 o Parlamento Europeu pronunciou-se sobre este documento,
aprovando o relatório (2) do deputado Francesco
Mussoto (PPE - italiano) por 408 votos a favor, 23 contra e 10 abstenções.
Logo no início deste relatório se lembra que o princípio
da coesão e, por conseguinte da solidariedade, está consagrado
no Tratado. Daí a necessidade de fazer face ao problema do contributo
das outras políticas comunitárias (PAC, concorrência, fiscal,
etc.), reorientando-as a favor da coesão económica e social, devendo
esta passar a desempenhar um papel de liderança, se não mesmo
tornar-se na política primordial da União alargada.

Salientando-se que o alargamento não deverá ocorrer em detrimento
das regiões menos prósperas dos actuais Estados-membros - a "convergência
estatística" não pode ser confundida com a "convergência
real" -, considera o Parlamento Europeu que numa União alargada
será necessário um grande esforço de solidariedade - política
económica e financeira - relativamente aos novos países membros,
tal como será também essencial prosseguir devidamente o apoio
às actuais regiões que registam atrasos de desenvolvimento e às
regiões em reconversão económica.

Por isso, afirma que o actual limiar de 0,45% do PIB comunitário destinado
à política de coesão constitui um limiar abaixo do qual
se comprometeriam as finalidades desta política e considera que, no futuro
imediato, é necessária uma avaliação das necessidades
no contexto das perspectivas financeiras com vista ao alargamento, sublinhando
que os recursos financeiros deverão ser adequados aos desafio de uma
Europa alargada.

O Parlamento Europeu considera também que as opções 1
e 4 apresentadas pela Comissão, não são aceitáveis.

Primeiro relatório intercalar

Em Janeiro de 2002, a Comissão apresentou um "Primeiro relatório
intercalar sobre coesão" (3) onde faz uma
primeira avaliação da coesão económica e social
numa União a 25 (o Conselho Europeu de Laeken concluiu que a Bulgária
e a Roménia não estariam aptas a aderir em 2004).

  • No caso de uma União a 25 e considerando os dados disponíveis
    de 1997, 1998, 1999, as regiões cujo PIB per capita foi inferior a
    75% da média da UE prevista no acervo comunitário representarão
    115 milhões de habitantes, ou seja, 25% da população
    total.
  • Entre estes, quatro cidadãos em cada dez residem nas regiões
    dos 15 Estados-membros actuais, enquanto que os outros seis pertencem a países
    candidatos.
  • As regiões actualmente abrangidas pelo objectivo nº 1, que se
    situariam, depois do alargamento, acima do limiar de 75%, representariam 37
    milhões de habitantes. Para cerca de dois terços da população
    destas regiões, esta situação resultaria do efeito mecânico
    devido à redução da média comunitária em
    cerca de 13%. O último terço já se encontra acima dos
    75%.

No debate travado neste último ano, a vários níveis e
com diferentes estruturas, algumas preocupações aparecem com grande
nitidez.

  • A necessidade de uma análise aprofundada para as consequências
    do alargamento, especialmente para as regiões com atrasos de desenvolvimento.
  • A manutenção do apoio às regiões que, de uma
    forma artificial e meramente estatística, vejam o seu PIB per capita
    ultrapassar o limiar de 75% da média comunitária.
  • Os meios de que a política de coesão deverá dispor
    para que se torne credível.

As restrições orçamentais resultantes do Pacto de Estabilidade
tentarão alguns países a oporem-se à revisão das
perspectivas financeiras (mesmo aqueles que recebem um retorno dos fundos estruturais
aplicados em outras regiões, e que a Comissão prometeu analisar).

No entanto, não podemos esquecer que o Pacto de Estabilidade em matéria
de défice/excedente orçamental é bastante mais exigente
para os Estados-membros menos prósperos, que têm de o condicionar
com a manutenção de níveis de investimento elevados por
forma a manterem o nível de convergência real. Também os
Estados-membros mais prósperos continuam a atribuir um volume mais elevado
de auxílios de Estado do que os menos desenvolvidos, o que reduz o impacto
da política estrutural nestes países.

Continuaremos a participar na discussão a realizar no Parlamento Europeu
em defesa do que mais se ajustar ao interesse nacional e, como a próxima
reforma dos fundos estruturais será ainda decidida por unanimidade, nada
será concluído sem a aprovação do governo português.

(1) - COM(2001) 24
(2) - A5-0007/2002
(3) - COM(2002) 46

Fátima Garcia