A proposta de Orçamento do Estado que está em discussão é marcada pelo carácter claramente insuficiente das respostas que admite face à visível degradação da situação económica e social. A opção primeira do governo é a de continuar a trabalhar para o défice das contas públicas em vez de olhar para os problemas do País.
Com a redução do défice que está prevista já para o próximo ano, o País prescinde de utilizar cerca de 6 mil milhões de euros. Temos feito essa denúncia mas o Governo persiste, mesmo quando não está obrigado, em limitar a despesa social, em conter o investimento público, em impedir o reforço dos serviços públicos essenciais, quando eles mais fazem falta como é o caso da saúde.
Para o PCP a sustentabilidade das contas do estado deve fazer-se por via da recuperação económica, do investimento produtivo, do crescimento económico e, simultaneamente, com opções diferentes que permitam obter receitas onde elas existem e não sujeitas à justa tributação, a partir de critérios de justiça fiscal e de defesa do interesse público.
É com esse enquadramento que apresentamos hoje algumas das propostas que, introduzindo critérios de justiça fiscal na tributação de rendimentos mais elevados e de capital ou reduzindo a despesa do Estado com a transferência de dinheiros públicos para grupos económicos, permitiriam reforçar a justiça fiscal e contributiva e simultaneamente alargar a receita do Estado para responder ao muito que há para fazer e que aguarda resposta.
Do conjunto de propostas entregues hoje, destacamos as propostas para o aumento da receita que fixam:
- a obrigatoriedade do englobamento obrigatório para todos os rendimentos a partir de 100 mil euros em sede de IRS, pondo fim ao privilégio dos rendimentos de capital, face aos rendimentos do trabalho neste imposto;
- a eliminação de vários benefícios fiscais atribuídos ao grande capital e às actividades especulativas e que custam largas centenas de milhões de euros todos os anos;
- a taxação das transferências para os paraísos fiscais feitas pelos grupos económicos e a tributação em Portugal dos lucros e dividendos de grupos económicos como o Pingo Doce/Jerónimo Martins em vez da sua evasão para países como a Holanda;
- a criação de um escalão intermédio na derrama estadual, taxando os lucros entre 20 e 35 milhões de euros com uma taxa de 9%;
- o resgate das Parcerias Público Privadas, que custa ao País mais de mil milhões de euros todos os anos.
A acelerada degradação da situação com que se confrontam milhares de MPME, que já acusavam há muito problemas estruturais que foram agora expostos com inegável crueza pelos impactos da epidemia, coloca a necessidade de medidas urgentes, propostas pelo PCP, como o fim das limitações que sucessivamente têm sido impostas às MPME no acesso às medidas de apoio decididas ao longo dos últimos meses ou o apoio aos sócio-gerentes assegurando a sua efectiva implementação.
A defesa dos sectores produtivos, particularmente os que asseguram bens estratégicos como a alimentação do Povo português, num quadro de grande volatilidade internacional e em que o País precisa de diminuir dependências, criar riqueza e emprego, é também objecto da intervenção do PCP face à indiferença que a proposta do Governo lhes atribui. Destacamos neste âmbito:
- um vasto conjunto de medidas que dão conteúdo e eficácia ao Estatuto da Agricultura familiar com a mobilização de diversos recursos por via da criação de um Fundo Autónomo que lhes dê suporte;
- a criação de um regime de electricidade verde para a actividade agrícola;
- a criação de um regime extraordinário de regularização das explorações pecuárias;
- a valorização da Casa do Douro representativa dos vitivinicultores Durienses;
- a isenção de IMI para os baldios;
- a criação de um programa de indemnização aos agricultores pela destruição da produção por animais selvagens;
- um plano de defesa e valorização da floresta nacional;
- o reforço de estruturas públicas como a Inspecção Geral Veterinária e a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e Ordenamento do Território;
- a criação de um Programa de Apoio à pesca de pequena escala, local e costeira e ao rendimento dos trabalhadores da pesca;
- verbas para investimento no conhecimento e investigação de recursos piscícolas;
- apoios à formação de mestres e outros profissionais para embarcações de pesca;
- um plano de intervenção nas barras e portos nacionais, dragagens e requalificação de lotas e postos de venda de pescado.
Articulada com a intervenção em torno dos sectores produtivos, propomos igualmente medidas urgentes de preservação dos valores ambientais, com destaque para a água enquanto recurso vital para o País. Propomos neste Orçamento do Estado assegurar o controlo público dos sistemas de gestão de resíduos urbanos, invertendo o processo de privatização negativo para os interesses do país, a par do lançamento de vários programas, designadamente de identificação e combate a espécies invasoras, um sistema de monotorização de recursos hídricos, o reforço do orçamento da Agência Portuguesa do Ambiente, um estudo do impacto das culturas intensivas e superintensivas, bem como a Avaliação Ambiental e Grandes Condicionantes para a Prospecção e Exploração de depósitos minerais.
Ainda na área dos transportes e da energia, que estão inegavelmente ligadas à dimensão ambiental, não podemos deixar de destacar a proposta de dotação de 40 milhões de euros para reforço da oferta pública de transportes que apresentamos no âmbito do ProTransp, bem como a regulação do preço do gás de botija, acabando com as inaceitáveis margens de lucro das empresas que controlam o sector e permitindo que, a par da proposta da redução do IVA, centenas de milhar de famílias tenham energia/gás mais baratos.