Uma saudação a todos os presentes, a todos vós que decidiram marcar presença neste nosso almoço e que dão hoje continuidade à intervenção dos intelectuais do Partido que ao longo da sua história sempre deram um contributo inestimável, com a força transformadora das ideias, da arte, da ciência e da cultura, para a tomada de consciência de classe e para a formação cívica, política e cultural dos trabalhadores e do nosso povo.
Trabalhadores intelectuais que também são vitimas dos efeitos da política do actual Governo, vertida no Orçamento do Estado que foi discutido nos últimos dias e votado ontem na generalidade.
Um Orçamento do Estado apresentado pelo PSD/CDS, e escrito pelo punho dos grupos económicos, uma peça mais ao seu serviço.
Um Governo, uma política e agora um Orçamento que desde o primeiro momento contaram com a firme oposição do PCP e foi e é assim, não por obsessão, mas porque o que está em curso, agora pela mão de PSD e CDS, é o aprofundamento das injustiças e desigualdades, o ataque aos direitos sociais e à soberania, àquilo que esta vossa iniciativa pretende afirmar. Uma opção contra a maioria e ao serviço dessa minoria que vai acumulando lucros recorde.
A pobreza atinge mais de dois milhões de pessoas, um em cada 10 trabalhadores é pobre, quase 3 milhões de trabalhadores recebe menos de mil euros por mês, um milhão de reformados e pensionistas recebe menos de 510 euros por mês. Enquanto os grupos económicos tiveram nos primeiros 6 meses deste ano 32 milhões de euros de lucro por dia, praticamente o mesmo que tiveram em todo o ano de 2021. E ainda temos de ouvir a ministra do Trabalho afirmar que é preciso haver realismo sobre o aumento dos salários!
E se isto não bastasse, aí está um Orçamento a brindar os grupos económicos com 1800 milhões de euros em benefícios fiscais, e mais de 1500 milhões de euros para Parcerias Público-Privadas. Isto demonstra bem como é falsa e cínica a conversa de que não há dinheiro.
Um Orçamento que acentua a injustiça fiscal, canaliza metade do orçamento da Saúde para os grupos privados que fazem da doença negócio; agrava ainda mais os problemas na Habitação em benefício dos especuladores e da banca.
Um Orçamento que espalha a propaganda e a ilusão à maioria dos jovens garantindo benefícios para uns poucos. Milhares de jovens com baixos salários, sem vínculos efectivos, com horários completamente desregulados, sem condições para adquirirem uma casa, muitas vezes sem condições de prosseguirem os seus estudos, são empurrados para fora do País e a esses o Governo tem zero medidas que permitam resolver os seus problemas.
Nos últimos anos têm saído do País muitos milhares de professores, médicos, enfermeiros, psicólogos, arquitectos, e tantos, tantos outros que tanta falta fazem ao nosso País, aos nossos serviços públicos, ao nosso desenvolvimento, para que se cumpram os direitos sociais, para que este seja um País mais soberano.
E saíram não por causa do IRS, do IMI ou do IRC, saíram em busca de melhores salários e melhores condições de vida e é a isto que é preciso responder. Saíram em busca de melhores condições de trabalho porque aqui o que encontram é a precariedade, é a instabilidade de vínculos precários, horários completamente desregulados, uma dificuldade cada vez maior em aceder aos serviços públicos e em verem cumpridos os seus direitos. Uma dificuldade cada vez maior em se sentirem felizes e realizados em todas as esferas das suas vidas.
Uma situação que no que depender deste Governo, desta política e deste Orçamento, continuará a aprofundar-se.
E tudo isto o PS decidiu viabilizar. Viabiliza porque as opções em curso dão continuidade às orientações da sua maioria absoluta e ao mesmo tempo permite que Chega e IL mantenham toda a sua agenda reaccionária e demagógica, votando contra um Orçamento com o qual estão de acordo e cuja política é também a sua.
Para a RTP, o governo quer acabar com receitas de publicidade. Mas vai mais longe e prevê o despedimento de 250 trabalhadores. A situação actual da precarização dos jornalistas, a perda de credibilidade dos órgãos de comunicação, a proliferação de notícias falsas, exigem não o enfraquecimento, mas sim o reforço do serviço público de rádio e de televisão.
É preciso responder aos direitos e garantias que estão na nossa Constituição.
O que este Orçamento mostra, e o que as políticas que têm sido seguidas por este Governo confirmam, é que se está a preparar nas áreas da educação, saúde, cultura, comunicação social, investigação, segurança social, o aprofundamento da ofensiva privatizadora, o que reclama da parte dos trabalhadores destas áreas e da população uma intervenção decidida contra estas opções, sob pena de ainda termos maiores limitações na acessibilidade, o aprofundamento das assimetrias regionais e a intensificação da mercantilização em resultado do processo de privatização.
As novas regras orçamentais, aprovadas por PS, PSD e CDS, apoiadas por IL e CH, como aliás acontece com a generalidade da linha política que vem sendo seguida, vão ameaçar ainda mais o investimento, o desenvolvimento, a melhoria das condições de vida, contribuem para as políticas de empobrecimento da maioria e de concentração de riqueza nas mãos de um punhado.
Os serviços públicos que já enfrentam tantas dificuldades, muitas vezes apenas suportados pela entrega, pela dedicação dos seus trabalhadores, continuarão a definhar. Sem um forte investimento público, os direitos sociais são postos em causa, como já está a acontecer para milhões de pessoas.
Muito em particular para os moradores de bairros das áreas metropolitanas sujeitas às injustiças e à discriminação, e cujo grito ouvimos no passado sábado descendo a Avenida da Liberdade, clamando por uma vida justa, na sequência da morte de Odair Moniz. Gente que muito justamente diz que é preciso um firme combate às injustiças, às desigualdades, às discriminações, à ausência de perspectivas e de futuro, fruto das políticas que negam o direito ao trabalho, a um salário digno, à habitação, à educação, à saúde, à cultura, uma realidade que precisa de resposta.
Uma luta e exigências que não se confundem com condenáveis acções de violência e destruição, com aproveitamentos e instigações que afectam as populações incluindo a grave situação do Tiago, motorista de uma empresa rodoviária. Uma luta que não se confunde com a promoção do ódio, do racismo e da xenofobia, que exige soluções e respostas integradas.
O que a realidade mostra é que é muito mais o que nos une a todos do que aquilo que nos separa.
O País precisa de outra política. Profundamente sujeitos à precariedade, ao desemprego, ao subaproveitamento e à desvalorização das suas qualificações, à quebra do seu rendimento, à degradação das suas carreiras, é de todo o interesse dos trabalhadores intelectuais a política alternativa que propomos.
Uma política que invista neles, que os contrate, que crie emprego, que valorize as suas carreiras, que efective os seus vínculos laborais, que lhes dê estabilidade no trabalho e na vida, que aproveite a sua formação e o seu conhecimento, que corresponda às suas expectativas, que aumente os seus salários, que coloque todo o seu saber, conhecimento, criatividade e entusiasmo ao serviço do desenvolvimento do País.
Uma luta e uma alternativa que sabemos que é exigente e difícil, mas também necessária. Os nossos inimigos de classe também o sabem e isso justifica, e muito, todo o investimento contra o Partido, contra quem lhes faz frente, um investimento numa brutal ofensiva ideológica que é também contra os direitos, o progresso e é sempre contra o regime democrático.
Podemos e com razão dizer que ofensiva sempre houve, podemos até dizer mais, houve, está aí e vai continuar. O elemento novo é a dimensão e os meios ao dispor dessa ofensiva.
A instrumentalização do ensino, da cultura, da comunicação social, que abdica de uma política soberana para a ciência, investigação, tecnologia e desenvolvimento, que faz com que se aceite e perpetue o sistema dominante, que não se vislumbre uma alternativa emancipatória.
As Teses para o XXII Congresso levam-nos a reflectir sobre as difíceis condições em que lutamos e intervimos. Mas levam-nos também à importante discussão sobre as formas de tomar a iniciativa, potenciar os meios do Partido, intervir a partir da realidade concreta, lutar para transformar.
Isto não está fácil mas também é verdade que o nosso trabalho, o nosso esforço, a nossa persistência, mas também a coerência, a verdade e a coragem, alargam fileiras, alargam a luta de massas, aproximam outros democratas e patriotas, outros sectores que passam a estar integrados na luta mais geral pela melhoria das condições de vida e pela alternativa patriótica e de esquerda.
É esse o desafio que está colocado, como poderemos desenvolver a luta, chamar mais gente para trabalhar connosco, para dar o seu contributo, para se inscrever, para reforçar o Partido, para assumir tarefas, para contribuir com a sua formação, o seu saber, a sua experiência, para que aumentem, diversifiquem e qualifiquem a iniciativa cultural, política e ideológica do Partido.
É assim na luta de sectores diversos, como é o caso dos investigadores, que ainda na semana passada se manifestaram pelo direito a vínculos permanentes, pelo fim de uma precariedade absolutamente generalizada e pela resolução da situação de milhares que estão em risco de ficar no desemprego se nada for feito.
É assim na luta dos trabalhadores da Cultura, também afectados pela precariedade e por uma profunda instabilidade, situação que exige que o Estado assuma a sua responsabilidade enquanto garante de liberdade de criação artística e da sua fruição, com uma real valorização da Cultura e dos seus trabalhadores, através de um serviço público de cultura.
Temos variados e ricos exemplos deste trabalho em unidade, que é enriquecido com os contributos de vários sectores. Há varias linhas de trabalho que estão em curso e há tudo o resto que é muito que é preciso fazer.
Permitam-me destacar a comemoração dos 500 anos do nascimento de Luís de Camões e a comemoração dos 100 anos do nascimento de Carlos Paredes. Comemorações que evidenciam a importância que damos ao direito à cultura. Direito que ocupa um lugar central nos objectivos do PCP, que consideramos muito justamente uma das quatro vertentes fundamentais de uma democracia avançada inspirada nos valores de Abril.
Uma democracia simultaneamente política, económica, social e cultural, com uma política cultural orientada para a salvaguarda, o estudo e a divulgação do património cultural nacional, regional e local, erudito e popular, tradicional ou actual. Uma política que, entre outros objectivos, estimule o combate à mercantilização e à colonização cultural. Que fomente a promoção internacional da cultura e da língua portuguesas, em estreita cooperação com os outros países que a usam.
Continuemos o trabalho de mobilização destes sectores para o movimento pela paz. Uma importantíssima questão dos nossos dias, que teve um justo e merecido destaque na vossa última Assembleia. Uma questão que não perdeu actualidade, que, pelo contrário, se agravou e se tornou um tema ainda mais premente tendo em conta a evolução no Médio Oriente e a situação dramática do povo palestiniano.
O que é necessário é travar o genocídio que Israel leva a cabo, desde logo pugnando pelo cessar-fogo e exigindo que se pare de fornecer armas a Israel. O que é necessário é que se reconheça o Estado da Palestina. É necessário que o Governo deixe de ser submisso aos interesses de quem ganha com a guerra, cumpra a Constituição da República Portuguesa e contribua activamente para a paz entre todos os povos, como é seu dever.
São muitas e exigentes as tarefas que temos pela frente. Desde logo o XXII Congresso, que está em construção e que queremos que envolva o máximo de camaradas, porque mais camaradas a participar enriquecem a discussão e aperfeiçoam as linhas de trabalho necessárias para levar por diante a nossa intervenção e luta.
Também a importante campanha “Aumentar salários e pensões, para uma vida melhor”, ligada à vida e que mobiliza os trabalhadores e a população a participarem activamente na exigência das reivindicações mais prementes para a melhoria das suas condições de vida.
Uma participação essencial que vai ter expressão no próximo dia 9 de Novembro, na grande manifestação nacional promovida pela CGTP-IN, em Lisboa e no Porto, para exigir nas ruas melhores condições de trabalho e de vida.
Muitas e exigentes tarefas, mas também empolgantes e justas. Necessárias e concretizáveis, ao alcance de um Partido como o nosso, com os intelectuais, com os trabalhadores e o povo, por uma vida melhor, pela paz e progresso social, pela democracia e o socialismo.