1 - É necessário continuar a responder ao grave problema de saúde pública que o País enfrenta, designadamente por via das medidas de prevenção e do alargamento da capacidade de resposta por parte do Serviço Nacional de Saúde. Mas é também urgente responder à acelerada degradação da situação económica e social, designadamente ao conjunto dos problemas que estão hoje colocados a milhares de micro, pequenos e médios empresários que constituem mais de 99% do tecido económico português.
A realidade que se tem vindo a desenvolver e instalar no terreno desde meados do mês de Março é avassaladora. São dezenas de milhar as empresas que suspenderam a sua actividade. Nuns casos, decorrentes das próprias medidas de prevenção e combate, noutros, pela quebra de encomendas, pela quebra de fornecimentos de bens e serviços intermédios, ou pela ausência de procura interna ou externa. Milhares de empresas deixaram de ter qualquer entrada de receitas mantendo, no entanto, o essencial das suas obrigações fiscais e contributivas, das suas responsabilidades perante os salários dos seus trabalhadores, bem como, de outros encargos, que vão da energia ao custo das suas instalações, passando pelos seguros, água, telecomunicações, contabilidade e outros serviços.
A realidade em numerosos sectores, da restauração ao alojamento, da indústria têxtil à construção civil, dos salões de cabeleireiros e barbearias aos ginásios, do táxi ao conjunto do transporte individual de passageiros, do pequeno comércio à reparação automóvel, dos feirantes aos produtores agrícolas e pescadores, das artes e espectáculos à prestação de serviços contabilísticos entre outros, confirma a necessidade de uma resposta enérgica e vigorosa.
2- As medidas adoptadas pelo Governo são limitadas e insuficientes, no essencial dirigidas a preservar as grandes e algumas médias empresas. Medidas que se resumem a linhas de crédito bonificadas (tendo como interlocutor a Banca e os correspondentes e gravosos condicionalismos de acesso), ao diferimento de prazos e pagamentos das obrigações fiscais e ao Lay-off simplificado, com o que este significa de corte nos salários dos trabalhadores, bem como, a exclusão de um largo conjunto de empresas, dos sócios gerentes e a sobrecarga da Segurança Social que o governo estima em cerca de 1000 milhões de euros por cada mês em que vigorarem as medidas de contingência.
Medidas que não têm em conta o tecido económico português. Que esquecem o seu elevado grau de dependência e fragilidade e também a sua dimensão informal, que ignoram o facto de milhares de empresas não terem capital social relevante nem reservas para enfrentar a actual situação, que excluem dos apoios empresas que tenham situações contributivas e incidentes bancários por resolver. Se não forem adoptadas outras medidas assistir-se-á à falência de milhares de MPME, alimentando a estratégia de concentração e centralização capitalista.
3 - O PCP tem colocado, como questão primeira da resposta às consequências económicas e sociais das medidas de prevenção e combate ao surto epidémico da Covid-19, a necessidade de impedir os despedimentos e garantir o pagamento dos salários sem cortes aos trabalhadores.
Uma opção que tem presente a importância de manter vivo o mercado interno e a capacidade aquisitiva dos trabalhadores e do povo português, seja no presente, seja quando o surto epidémico for ultrapassado e que assume que é fundamental garantir que a economia do País continue a funcionar com a normalidade possível. Uma opção que se articula com a necessidade de defender e alargar a produção nacional.
Uma opção que requer uma radical alteração na intervenção da Banca que, na actual situação, tem possibilidades reais de assumir o seu papel no financiamento da economia, mas cujo controlo pelos grupos monopolistas, impede que assim aconteça. É necessário assegurar que, nesta situação, não haja distribuição de dividendos aos accionistas, mas isso, é por si só, insuficiente, o que se impõe mesmo, é que banca tenha um papel centrado no estimulo à defesa da actividade económica e à promoção do seu desenvolvimento.
4- Para o PCP, torna-se necessária a adopção e concretização urgente de medidas que respondam a duas realidades concretas:
Desde logo à realidade das micro-empresas de natureza familiar e empresários em nome individual, trabalhadores por conta própria, muitos com situações informais, vivendo de vários trabalhos parciais, à comissão, ocupados em serviços de proximidade (da construção civil e limpeza, à esteticista e explicador, cabeleireiros, taxistas, feirantes, profissionais das artes do espectáculo, entre outros.) o que exige:
a) Assegurar um complemento de rendimento avaliado em função do rendimento anterior (presente nas declarações trimestrais da Segurança Social), proporcional às perdas de encerramento ou perda de trabalho parcial/total, até um valor máximo de três Salário Mínimo Nacional - SMN (caso não tenha rendimento em 2019, deve considerar-se, o valor de um SMN);
b) Disponibilizar uma linha de crédito sem juros (proporcional às perdas de receita, no valor máximo de 12 SMN) com garantia de Estado, 2 anos de carência e amortização a 10 anos, para assegurar fundo de maneio face a custos diversos;
c) Conferir moratórias bancárias no pagamento de prestações por aquisição de instrumentos/meios ou local de trabalho;
d) Criação de um Fundo Público de Apoio à Tesouraria de microempresários e empresários em nome individual suportado pelo Orçamento do Estado e com recurso a fundos comunitários, para suportar as despesas com os apoios adiantados. A definição de volume máximo a disponibilizar por empresa, terá em conta o número de postos de trabalho e o volume de negócios.
E por outro lado medidas dirigidas a outros pequenos empresários, que tenham como objectivo:
a) Garantir uma resposta imediata para assegurar o pagamento integral dos salários aos trabalhadores de empresas cuja actividade está suspensa, criando mecanismos específicos, incluindo um Fundo com esse objectivo, com meios financeiros a disponibilizar pelo Orçamento do Estado;
b) Adequar as actuais linhas de crédito criadas pelo Governo assegurando prontidão e liquidez mínima às tesourarias sem significarem um incomportável peso futuro na sobrevivência destas empresas, assegurando:
- Crédito à taxa de juro zero, com amortizações a 10 anos, com garantia do Estado, constituindo para esse objectivo um Fundo de Garantia;
- A existência de incidentes bancários e/ou situações de incumprimento para com a Segurança Social e o Fisco não poderá ser factor de exclusão destes apoios (desde que haja negociação em curso ou reclamação de regularização das dívidas apresentada até 30 de Abril), sendo que, 5% do crédito concedido terá como objectivo a regularização desse tipo de situações. O acesso a esses créditos é garantido também às empresas criadas há menos de 12 meses.
c) No plano fiscal, para além do protelamento de prazos já vigente assegurar que: em 2020 não se procederá ao Pagamento Por Conta de IRC (nem sequer das moratórias decididas pelo Governo); o Estado deve ainda acelerar o reembolso do IVA (para o que bastará a confirmação pelo contabilista certificado) e do IRC devido às empresas, assim como do IRS, no caso de empresários em nome individual.
d) No que diz respeito aos gerentes e sócios gerentes com carreiras contributivas da Segurança Social, avançar com a aplicação do regime previsto para os trabalhadores independentes com o reforço dos respectivos montantes e o alargamento das condições de acesso.
e) O Governo deve agilizar a aplicação do Decreto Lei 12/2003 para assegurar o apoio social estabelecido a todos os micro e pequenos empresários com carreiras contributivas que, no actual quadro, se viram obrigados a encerrar definitivamente a sua actividade;
f) Deve ser permitido accionar moratórias de dívidas ao Estado, estabelecendo prazos adequados para o seu ressarcimento futuro e deverá assegurar-se junto do sector bancário moratórias do pagamento e créditos, nomeadamente, decorrentes de empréstimos ou leasings contraídos para investimentos em meios de produção e trabalho;
g) As MPME devem ter o direito de suspender contratos de abastecimento de energia e telecomunicações - mesmo que fidelizados -, e beneficiar da isenção das taxas associadas, sem custos acrescidos antes ou depois do reinício de actividades;
São ainda de considerar outras dimensões de ajuda pública às micro e pequenas empresas:
- Agilização dos mecanismos de contacto e intervenção junto das MPME, e das suas associações representativas, capacitando as estruturas do Ministério da Economia (designadamente no âmbito do IAPMEI) e do Ministério da Segurança Social.
- Dinamizar todo o investimento público que estava em curso, impedindo a paragem de obras e empreitadas, seja pela administração central, seja pela administração local.
- Acelerar o pagamento das dívidas do Estado às empresas, priorizando as MPME’s, a par da redefinição de critérios para as aquisições do Estado em diversos domínios, dando prioridade à substituição de importações por produção nacional e à contratualização com estas empresas.
- Intervir para a redução dos preços dos combustíveis e da energia eléctrica, bem como, junto de sectores, cuja especificidade requerem outro tipo de consideração, como seja a agricultura, as pescas, ou os transportes.
5 - A rápida degradação da situação económica e social, a ausência de um horizonte temporal para o fim do surto epidémico, a par das fragilidades estruturais do tecido económico e da insuficiência das medidas do Governo, suscitam em milhares de empresários, apreensão, preocupação e até legítimo desespero.
A situação de emergência sanitária, mas também de emergência económica e social, requer medidas excepcionais que estão muito para lá das respostas que o Governo tem adiantado.
Medidas e opções que requerem uma ruptura com as limitações e constrangimentos orçamentais e com as opções de classe que estão subjacentes à política de direita que quer o Governo PS, quer PSD, CDS e partidos sucedâneos partilham.
Os recursos não são, como sabemos ilimitados, é por isso que precisam de ser usados, não para defender os lucros e privilégios dos grandes grupos económicos, mas para proteger rendimentos dos trabalhadores, dos reformados, dos MPME’s e assegurar a produção material de bens e o fornecimento de serviços que respondam, nesta fase, às necessidades do País.
A situação impõe com redobrada actualidade a intervenção do Estado directamente na banca e noutras empresas estratégicas para a economia portuguesa, a necessária regulação e fixação de preços, a mobilização de enormes recursos públicos que assegurem os rendimentos e a dinamização da actividade económica.
As MPME não são um problema para o País mas sim um instrumento essencial para responder à recuperação da actividade económica nacional.
O País precisa dos trabalhadores e da sua força produtiva, grande parte dela parada neste momento, para vencer a actual situação. Mas precisa também dos micro, pequenos e médios empresários, das suas empresas, para responder aos problemas do presente e preparar um futuro que começa já amanhã.
Este, como noutros momentos críticos da vida nacional, fica bem vincado o quanto Portugal precisa de uma outra política, e de um outro rumo, de uma política patriótica e de esquerda que, neste caso, não deixe nenhum MPME ficar para trás.