As Parcerias Público-Privadas (PPP) têm-se revelado um verdadeiro sorvedouro de recursos públicos, transferindo verbas do Orçamento do Estado para benefício de grandes grupos económicos.
Segundo o último relatório anual de execução das PPP, produzido pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), só em 2018 as PPP rodoviárias custaram aos portugueses mais de 1.130 milhões de euros, dos quais 78 milhões de euros estão associados às chamadas “compensações” ou “reposição de equilíbrio financeiro”, valor claramente superior a todo o investimento público realizado pelo País em infraestruturas de transportes nesse ano.
A situação que o país enfrenta, ocasionada pelo surto pandémico de SARS-CoV-2, levou à adoção de medidas extraordinárias de dever de recolhimento e a um abrandamento da atividade económica, o que naturalmente se traduz em menor tráfego nas vias concessionadas em modelo de PPP rodoviária.
Os contratos assinados entre os sucessivos governos do PS e do PSD/CDS e as concessionárias em modelo de disponibilidade contêm cláusulas altamente favoráveis para as concessionárias, colocando todo o risco do lado do Estado que está contratualmente obrigado a compensar em caso de redução do tráfego esperado. Acontece que os próprios cálculos do tráfego esperado têm sido empolados, levando a que as compensações sejam verdadeiramente escandalosas. Concessões como a Douro Litoral (Brisa) poderão custar ao Estado mais de 200 milhões de euros, devido a cláusulas claramente lesivas do interesse público.
Independentemente de esta situação demonstrar, mais uma vez, que o que é necessário é pôr fim a este modelo ruinoso e acabar com as PPP, o PCP não pode deixar de colocar a necessidade de, perante a situação de exceção que o país vive em resultado do surto pandémico de SARS-CoV-2, não serem aplicadas as cláusulas contratuais ou outros mecanismos que permitiriam às concessionárias arrecadar milhões de euros que fazem falta ao investimento no SNS, à defesa das condições de vida das populações e ao relançamento da atividade económica, recusando-se assim a possibilidade de continuar a beneficiar os grandes grupos económicos, designadamente aqueles cujos lucros assentam em atividades rentistas.
Ao mesmo tempo que os trabalhadores portugueses e muitas micro, pequenas e médias empresas passam por dificuldades resultantes desta situação, as concessionárias das PPP rodoviárias não podem manter os seus lucros inalterados à custa do sacrifício de recursos públicos entregues pelo Estado a título de renda nestes contratos ruinosos.
Com o presente projeto de lei, o PCP propõe que não possam ser acionadas quaisquer cláusulas de compensação ou reposição de equilíbrio financeiro às PPP rodoviárias, bem como garantir que, nas PPP em modelo de pagamento por disponibilidade, a redução da receita do Estado em portagens se reflita numa redução, em igual percentagem, no pagamento às concessionárias.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece:
- um regime excecional e temporário de suspensão das cláusulas de compensação e reposição de equilíbrio financeiro às Parcerias Público-Privadas rodoviárias; e
- um mecanismo excecional e temporário de adaptação dos encargos do Estado com as Parcerias Público-Privadas rodoviárias em modelo de pagamento por disponibilidade, refletindo eventuais reduções da receita de portagens.
Artigo 2.º
Regime excecional e temporário de suspensão das cláusulas de compensação e reposição de equilíbrio financeiro às Parcerias Público-Privadas rodoviárias
Nos termos da partilha de riscos definida pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 111/2012, de 23 de maio, e do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março, que declara o estado de emergência, no período de vigência da presente lei são suspensas as cláusulas de compensação, de reposição de equilíbrio financeiro e outras estabelecidas em contratos de concessão e subconcessão de Parcerias Público-Privadas rodoviárias que se destinem a compensar as entidades concessionárias pela redução de tráfego rodoviário.
Artigo 3.º
Mecanismo excecional e temporário de adaptação dos encargos do Estado com as Parcerias Público-Privadas rodoviárias em modelo de pagamento por disponibilidade
- Nos termos da partilha de riscos definida pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 111/2012, de 23 de maio, e do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março, que declara o estado de emergência, no período de vigência da presente lei é aplicado um mecanismo excecional e temporário de redução de pagamentos associados a contratos de concessão e subconcessão de Parcerias Público-Privadas rodoviárias em modelo de pagamento por disponibilidade.
- Nas situações referidas no número anterior o montante dos pagamentos a realizar pelo Estado às concessionárias é reduzido na percentagem correspondente à percentagem de redução da receita das portagens verificada face ao valor homólogo do ano anterior.
- O mecanismo previsto nos números anteriores é regulamentado pelo Governo.
- A redução de receita das concessionárias decorrente da aplicação da presente lei não dá lugar a quaisquer compensações ou indemnizações.
Artigo 4.º
Entrada em vigor, vigência e produção de efeitos
- A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e vigora enquanto se mantiverem em vigor as medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2.
- O disposto na presente lei produz efeitos a partir de 13 de março.