O Serviço Nacional de Saúde tem sido, desde há muito, o alvo preferencial a abater por parte dos grupos económicos da área da saúde e dos partidos da política de direita que no plano político e institucional têm vindo a suportar esta ofensiva.
E se até à algum tempo atrás. o grande objectivo era transformar o SNS numa plataforma de transferência de dinheiros públicos para esses grupos, hoje, está claro que o objectivo é por fim ao SNS tal como foi concebido e que está plasmado na Lei do SNS de 15 de Setembro de 1979.
Hoje já não escondem que o verdadeiro objectivo passa pela criação de um sistema de saúde, com duas componentes: uma de serviço público, desvalorizado, com garantias mínimas de prestação de cuidados, direccionado para os pobres e, um outro, centrado nos seguros de saúde e na prestação privada de cuidados. Ou seja, pretendem retirar ao Estado a sua função de prestador de cuidados através de um Serviço Nacional de Saúde para todos os portugueses, atribuindo-lhe apenas as funções de regulador e financiador.
Como é amplamente conhecido, nos países em que tais soluções têm sido adoptadas, uma parte muito significativo da população ficou sem cobertura de qualquer sistema de saúde organizado.
Quase 40% da população portuguesa, para além de ser beneficiária do SNS, está coberta por um subsistema de saúde público, privado ou um seguro de saúde (individual ou de grupo), o que, atendendo a que este financiamento está tendencialmente direccionado para prestadores privados, sinaliza a relevância expressiva que o sector privado assume no quadro nacional da saúde. Sector privado que não pára de crescer e que detém, já hoje, mais de 50% das unidades de saúde em Portugal.
Aos grupos económicos da área da saúde, já não lhes chega os mais de 3 700 milhões de euros que o Orçamento de Estado de 2018, lhes destina. Querem mais, querem sempre mais.
Ofensiva contra o SNS que tem no subfinanciamento crónico, na desorganização estrutural, na ausência de planeamento e na restrição de recursos humanos e materiais, no aumento da promiscuidade entre o público e o privado e na desvalorização profissional e remuneratória dos seus profissionais, algumas das linhas de ataque ao serviço público.
As consequências mais visíveis são a baixa significativa da acessibilidade, o aumento dos custos com a doença, o agravamento das doenças crónicas com mais episódios de agudização não tratados, o mensurável aumento da doença mental e a provável degradação a curto e médio prazo dos macro indicadores de saúde, em particular das taxas de mortalidade geral específica das doenças crónicas.
O SNS cronicamente endividado, passa a ser um SNS na penúria. Os hospitais e centros de saúde já estão a viver o pesadelo da míngua de meios. Desde há muito que está diagnosticado que o subfinanciamento é a causa primeira das ineficiências e desperdícios, limitativa da prestação de cuidados oportunos e ajustáveis às necessidades e por isso de qualidade.
Esta disfunção económica provocada, tem sido usada para pôr em causa a sustentabilidade financeira dos serviços de saúde, mas não é mais do que o resultado de escolhas políticas para liquidar o SNS.
Simultaneamente intensifica-se o processo de privatização de serviços e a transferência de parte da prestação de cuidados para os hospitais e clínicas privadas, alvo de um processo de concentração que não para de agregar dezenas de pequenas e médias clínicas, sobretudo na área do diagnóstico e tratamento.
Camaradas
Já em 2006, no 4.º Encontro Nacional do PCP sobre a saúde em Portugal, foi inscrita a afirmação de que «A ofensiva privatizadora atingiu nos últimos anos uma dimensão nunca vista afectando gravemente o direito à saúde». E acrescentava «A ofensiva ideológica, política e social contra os trabalhadores da saúde é uma componente fundamental da estratégia da direita e do grande capital, que atingiu êxitos assinaláveis traduzidos na criação e aprofundamento de linhas de divisão destes entre si e com os restantes trabalhadores e o povo, com degradação da sua imagem pública e consequentemente perda de influência ideológica e política e de importantes direitos sociais e laborais.»
No processo de destruição do SNS em curso, a questão dos recursos humanos e da sua desvalorização, tem sido de há uns anos a esta parte, o instrumento mais eficaz na fragilização do SNS, promovendo a transferência de milhares de profissionais, particularmente médicos e enfermeiros, para os grupos privados e para a emigração.
Não é por acaso que o fazem Tal como nós, sabem que os recursos humanos na saúde são o património mais valioso do SNS e que têm sido esses profissionais, os que estão e os muitos que passaram pelo SNS ao longo dos 39 anos da sua existência e a sua luta por melhores condições de trabalho e de atendimento e dos utentes pelo direito à saúde, que mantiveram o SNS, apesar de todos os problemas que subsistem, como um dos melhores serviços públicos de saúde do mundo.
Camaradas
Na passada 4.ª Feira, o Partido apresentou o seu Projecto de Lei de Bases da Política de Saúde. Tal como tínhamos anunciado no passado mês de Abril, o PCP, apesar de considerar que a defesa e desenvolvimento do SNS, não passava nesta fase, por mexer na Lei de Bases, mas por uma alteração profunda da política de saúde do Governo minoritário do PS, tornou público que se algum partido desse início ao processo de revisão, não deixaria de intervir autonomamente com o seu próprio projecto.
O Projecto já entregue na Assembleia da República, é o resultado de um trabalho de muitos meses e que teve como ponto de partida um histórico de intervenção do PCP neste sector que lhe permite ter hoje um conhecimento da realidade nacional e um património de propostas invejável que nos permitiu apresentar um projecto robusto e de grande qualidade, que a ser adoptado, permitirá orientar a política de saúde nos próximos anos, no sentido da resolução dos principais problemas que afectam o SNS e reforçar a sua intervenção.
Um Projecto de Lei das Bases da Política de Saúde, que estabelece de forma inequívoca, o papel do Estado na garantia do acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde e o fim da promiscuidade entre o público e o privado, um dos cancros que mais têm vindo a afectar o SNS.
Tal como foi dito pela nossa camarada Carla Cruz na sessão de apresentação do PL, «A proposta do PCP obriga ao cumprimento do imperativo constitucional que coloca como incumbência do Estado garantir o cumprimento do direito à protecção da saúde, individual e colectiva, que assegura a robustez da força de trabalho, o desenvolvimento e o progresso económico e social e a coesão nacional e que a entende como instrumento de governação que contribui para a salvaguarda da soberania nacional e a autodeterminação popular.
É uma proposta centrada nas pessoas e no seu bem-estar ao longo de todo um percurso de vida de qualidade. Uma proposta progressista e que fortalece o Serviço Nacional de saúde e rompe com a política de direita para a saúde.
As principais vítimas da situação que se vive hoje no SNS – os utentes – vêem com angústia desaparecer a garantia de cuidados de saúde gerais, universais gratuitos que a Constituição da República Portuguesa lhes concedera; assistem ao desaparecimento de direitos e de unidades de cuidados de saúde; sofrem com escandalosas listas de espera para as consultas e tratamentos e, simultaneamente, são chamados a pagar do seu bolso os gastos em saúde. Os portugueses são os que mais pagam do seu bolso, 27% do total dos custos em saúde, no quadro da UE.
Mas camaradas, façamos a avaliação que fizermos ao SNS, e todos, uns mais que outros, já tivemos razões de queixa do serviço público, não encontramos alternativa à melhoria da prestação de cuidados e a garantia do acesso de todos aos cuidados de saúde, que não seja reforçar o SNS única forma de garantia da universalidade da prestação de cuidados. E já agora e ao contrário do que é dito pelos arautos da política de direita na saúde, quem faz melhor e mais barato é o público e não o privado.
A luta em defesa do SNS, é parte da luta por melhores condições de vida e de trabalho, não apenas porque é um um efectivo obstáculo à concretização dos projectos do grande capital, mas porque é indispensável à promoção da saúde e do desenvolvimento do País.